quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Os grandes eventos no Rio são armadilhas para as eleições seguintes

Cesar Maia       
1. Há uma ilusão por parte dos políticos de que grandes eventos internacionais – exclusivos – no Rio, que mobilizam a imprensa e parcela da opinião pública, geram uma enorme vantagem eleitoral na eleição seguinte. Essa é uma ilusão. Não que quem governa obrigatoriamente tenha que perder as eleições, mas a realização desses grandes eventos é um complicador e não um facilitador para a vitória eleitoral.
       
2. São dois os grandes vetores explicativos destas dificuldades. O primeiro é que a máquina pública desvia atenção e recursos para esse tipo de evento. A qualidade – e quantidade – dos serviços públicos de rotina decaem. A reorientação dos recursos para o evento gera centralização das aplicações, reduzindo obras e intervenções em vários bairros, que têm a sensação de abandono.
       
3. O noticiário termina exponenciando os problemas que ocorrem na conservação da cidade, nas escolas, na área de saúde, na falta de investimentos capilares, etc. A concentração de recursos nesses eventos amplia o descontentamento dos servidores que, no caso do Rio, alcançam quase duzentos mil, incluindo aposentados e pensionistas, além de suas famílias.
       
4. O segundo é que apenas uma parte da população está mobilizada para esses eventos. A maior parte mantém seu cotidiano. Esse cotidiano é afetado pelas restrições ao tráfego – engarrafamento, proibição de acesso em certos horários – pelas restrições à mobilidade, pelo deslocamento de segurança para as áreas do evento, pelas férias determinadas para esse período, afetando a rotina dos pais, por exemplo… Da mesma forma, os preços sobem no comércio, nos restaurantes e serviços diversos.
       
5. A resultante é dupla. A primeira é dos que não estão mobilizados, têm pouco interesse... que se sentem prejudicados. A segunda é dos que estão mobilizados, mas apontam os problemas todos que afetaram os seus cotidianos e responsabilizam os eventos. O próprio acompanhamento do noticiário, prévio e posterior aos eventos, focaliza o excesso de gastos, os desperdícios e os desvios – sempre destacados. E depois afirmam que os legados ficaram aquém do que se esperava e que pelo dinheiro aplicado não valeu a pena o evento.

6. No Rio de Janeiro, desde 1992, tivemos dois grandes eventos desse tipo. A ECO-92 e o PAN-2007. A Eco-92 ocorreu no próprio ano eleitoral. Criou uma enorme expectativa de que o Rio – como capital do mundo, recebendo quase duzentos chefes de Estado e de Governo – teria como desdobramento um passeio eleitoral. Essa perspectiva afetou até a disputa interna partidária, de quem seria o candidato para essa eleição tão fácil. A candidata do prefeito e do governador, favorita, não foi ao segundo turno.
        
7. No PAN-2007 da mesma maneira. A prefeitura concentrou recursos no evento afetando a conservação da cidade e a capilaridade das obras e intervenções. A associação do evento a esses fatos cobrou responsabilidade política ao prefeito. Se não bastasse, no início de 2008, quando a prefeitura normalizava e retomava a sua ação, veio uma epidemia de dengue que o boca a boca das pessoas relacionou ao evento e ao prefeito. A candidata do prefeito ficou longe do segundo lugar. O fato dos JJOO-2016 serem o grande legado do PAN-2007 só foi destacado nos documentos.
       
8. Os Jogos Olímpicos de 2016 ocorrerão – como em 1992 – no mesmo ano da eleição. Os problemas que afetam o dia a dia da população serão multiplicados pelo porte e duração do evento. A concentração de recursos já afeta os serviços públicos e até a data-base de reajuste salarial foi atrasada em 2 meses. Os benefícios para a cidade não terão tempo de decantar. Os problemas sim. Até uma lei limitando a mobilidade das pessoas e horários especiais, férias, etc., durante o evento foi aprovada. Outra vez os desafios para formar opinião pública serão muito maiores do que se imagina.
       
9. Curiosamente, nos três casos, os prefeitos não puderam ser candidatos e tiveram que apoiar outros nomes. 
Título e Texto: Cesar Maia, 2-9-2015

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