Está cada vez mais claro que o
ex-presidente só está mesmo interessado em evitar a cadeia, posando de
perseguido político
O Estado de S. Paulo
Faltou povo no ato que
pretendia defender Lula da Silva, na quinta-feira, em São Paulo e em outras
capitais. Apenas os militantes pagos - e mesmo assim nem tantos, já que o
dinheiro anda escasso no PT - cumpriram o dever de gritar palavras de ordem
contra o juiz Sérgio Moro, contra o presidente Michel Temer, contra a imprensa,
enfim, contra “eles”, o pronome que representa, para a tigrada, todos os
“inimigos do povo”.
À primeira vista, parece
estranho que o “maior líder popular da história do Brasil”, como Lula é
classificado pelos petistas, não tenha conseguido mobilizar mais do que algumas
centenas de simpatizantes na Avenida Paulista, além de outros gatos-pingados em
meia dúzia de cidades. Afinal, justamente no momento em que esse grande
brasileiro se diz perseguido e injustiçado pelas “elites”, as massas que
alegadamente o apoiam deveriam tomar as ruas do País para demonstrar sua força
e constranger seus algozes, especialmente no Judiciário.
A verdade é que o fiasco da
manifestação na Avenida Paulista resume os limites da empulhação lulopetista. A
tentativa de vincular o destino de Lula ao da democracia no País, como se o
chefão petista fosse a encarnação da própria liberdade, não enganou senão os
incautos de sempre - e mesmo esses, aparentemente, preferiram trabalhar ou
ficar em casa a emprestar solidariedade a seu líder.
Está cada vez mais claro - e
talvez até mesmo os eleitores de Lula já estejam desconfiados disso - que o
ex-presidente só está mesmo interessado em evitar a cadeia, posando de perseguido
político. A sentença do juiz Sérgio Moro contra o petista, condenando-o a nove
anos de prisão, mais o pagamento de uma multa de R$ 16 milhões, finalmente
materializou ao menos uma parte da responsabilidade do ex-presidente no
escândalo de corrupção protagonizado por seu governo e por seu partido. Já não
são mais suspeitas genéricas a pesar contra Lula, e sim crimes bem
qualificados. Nas 238 páginas da sentença, abundam expressões como “corrupção”,
“propina”, “fraude”, “lavagem de dinheiro” e “esquema criminoso”, tudo
minuciosamente relatado pelo magistrado. Não surpreende, portanto, que o povo,
a quem Lula julga encarnar, tenha se ausentado da presepada na Avenida
Paulista.
O fracasso é ainda mais notável quando se observa que o próprio Lula, em pessoa, esteve na manifestação. Em outros tempos, a presença do demiurgo petista com certeza atrairia uma multidão de seguidores, enfeitiçados pelo seu palavrório. Mas Lula já não é o mesmo. Não que lhe falte a caradura que o notabilizou desde que venceu a eleição de 2002 e que o mantém em campanha permanente. Mas seu carisma já não parece suficiente para mobilizar apoiadores além do círculo de bajuladores.
Resta a Lula, com a ajuda de
seus sabujos, empenhar-se em manter a imagem de vítima. Quando o juiz Sérgio Moro
determinou o bloqueio de R$ 600 mil e de bens de Lula para o pagamento da
multa, a defesa do ex-presidente disse que a decisão ameaçava a subsistência
dele e de sua família. Houve até quem dissesse que a intenção do magistrado era
“matar Lula de fome”. Alguns petistas iniciaram uma “vaquinha” para ajudar Lula
a repor o dinheiro bloqueado - e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, durante o
ato na Paulista, disse que “essa é a diferença entre nós e a direita: nós temos
uns aos outros”.
Um dia depois, contudo, o País
ficou sabendo que Lula dispõe de cerca de R$ 9 milhões em aplicações, porque
esses fundos foram igualmente bloqueados por ordem de Sérgio Moro. A principal
aplicação, de R$ 7,2 milhões, está em nome da empresa por meio da qual Lula
recebe cachês por palestras, aquelas que ninguém sabe se ele efetivamente
proferiu, mas pelas quais foi regiamente pago por empreiteiras camaradas.
Tais valores não condizem com
a imagem franciscana que Lula cultiva com tanto zelo, em sua estratégia de se
fazer de coitado. Felizmente, cada vez menos gente acredita nisso.
Título e Texto: Editorial, O Estado de S. Paulo, 23-7-2017
Título e Texto: Editorial, O Estado de S. Paulo, 23-7-2017
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