sábado, 17 de março de 2018

Os criminosos são outros

Maka Angola

O procurador-geral da República, general Hélder Pitta Grós, queixou-se da falta de quadros qualificados no Ministério Público para investigar Isabel dos Santos na Sonangol e Filomeno dos Santos no Fundo Soberano. Contudo, não se pode queixar da falta de especialistas em literatura de cordel e escrita criativa, de tal modo têm sido abundantes as invenções forjadas pelo Ministério Público.


A última, ou penúltima, dado que são tantas, diz respeito aos operários da construção civil que teriam tentado assassinar o vice-presidente Bornito de Sousa [foto acima], numa casa que não é a aquela onde este reside habitualmente, sendo que, na altura do suposto golpe, o vice-presidente se encontrava em Portugal. Talvez este seja um bom exemplo para os manuais académicos de uma tentativa impossível.

A história desta farsa já foi bem contada no Maka Angola. Agora o que importa é perceber que, em termos de justiça e Estado de direito, continua tudo do avesso.

Os inocentes são acusados e os criminosos ficam impunes.

Quem torturou, quem inventou, quem falsificou foram, mais uma vez, agentes do SIC e forças da lei e da ordem, com a conivência das chefias. Quem legalizou a detenção dos inocentes torturados foi o procurador José Rodrigues Cambuta.

Foi o mesmo magistrado José Rodrigues Cambuta quem, a 14 de março, data da publicação da investigação produzida pelo Maka Angola, ordenou a libertação condicional dos cinco detidos.

Para remendar a insustentável acusação de tentativa de assassinato de Bornito de Sousa, o procurador José Rodrigues Cambuta apresentou uma nova justificação no mandado de soltura: indiciou por crime de posse ilegal de arma os pedreiros Pedro Afonso Miguel “Bebé” (34 anos), Domingos João Caputo (39 anos) e Nelito Cambari Tunguno, bem como o contabilista Baião Conceição Mendonça (55 anos) e o eletricista Morais Joaquim Muxibi (52 anos).

Porém, conforme o Maka Angola relatou, os detidos foram revistados no momento da sua captura, assim como a viatura em que seguiam, tendo as autoridades apenas encontrado uma bateria de automóvel de reserva, sacos de plástico e uma tesoura.

Como descreveu Pedro Miguel, já passava das 22h00 quando os seus algozes regressaram e retiraram os detidos da cela, passando a nova sessão de tortura. “Vinham com uma arma Kalashnikov enferrujada, sem carregador, e começaram a torturar-nos outra vez no sistema do ‘avião’ e com surra de catana nas costas e nas nádegas.”

Os torturadores da Polícia Nacional e do SIC fotografaram Baião Mendonça com essa arma. “Como a tortura era demais, o mais velho aceitou pegar na arma para que o fotografassem assim. O mais velho, por questionar, continuou a ser torturado”, segundo denuncia Pedro Miguel “Bebé”.

Como pode a Procuradoria-Geral da República, representada por José Rodrigues Cambuta, continuar com a farsa e sujeitar as vítimas da tortura a pesadas medidas de coação? Estas têm agora de apresentar-se quinzenalmente no Comando de Divisão do Talatona, junto dos torturadores do SIC que instruíram o processo.

Os factos deste caso levantam três questões de grande gravidade, que tornam o vice-presidente, o ministro do Interior e o diretor do SIC cúmplices de tortura e denegação de justiça.

Em primeiro lugar, o papel de Bornito de Sousa. Estranhamente, na altura dos factos Bornito de Sousa encontrava-se em Portugal, país com quem Angola se diz aborrecido.

Cabe ao vice-presidente exigir que, num caso que lhe diz respeito, sejam estritamente cumpridos os mais altos ditames do Estado de Direito. Tem de estar atento e criar parâmetros de elevado cumprimento da lei. Não o fazendo, torna-se cúmplice político da barbaridade.

Em segundo lugar, temos o ministro do Interior, Ângelo Barros da Veiga Tavares, que está a mais num governo que se diz reformista, e o diretor do SIC, comissário Eugénio Pedro Alexandre. Têm sido inúmeras as denúncias da brutalidade e do comportamento fora-da-lei por parte do SIC. Basta lembrar o relatório sobre as execuções extrajudiciais escrito pelo diretor do Maka Angola. No entanto, nada se faz. As práticas abusivas da dignidade dos cidadãos, a tortura, a coação e a desumanização continuam, perante a imobilidade do ministro e do seu diretor do SIC.

Obviamente, devido à sua inação, estes dirigentes passam a ser cúmplices destas práticas, e responsáveis políticos e legais pela tortura e invenção de confissões. No fundo, o ministro do Interior e o seu diretor são obstáculos ao regular funcionamento da justiça.

Já deveriam ter sido demitidos.

Finalmente, e em terceiro lugar, torturadores conhecidos, como o superintendente Fernando Receado, chefe do Gabinete Central de Operações do SIC a nível nacional, e Ngola Kina, diretor-adjunto de operações em Luanda, e respectivos subordinados, continuam a praticar as suas taras sádicas sem qualquer reprimenda, inquérito ou admoestação. Mais uma falha da hierarquia e dos responsáveis.

A justiça tem de vingar em Angola, caso contrário, João Lourenço caminhará para uma presidência falhada.
Título, Imagem e Texto: Maka Angola, 16-3-2018

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