A crise de qualidade das
universidades da América Latina
Francisco Vianna
Enquanto a mídia canalizava a
atenção de toda a América Latina para as eleições na Venezuela, na semana passada,
poucos repararam numa notícia que deveria ter produzido impacto na região e ser
manchete de primeira página na mídia latino-americana: um novo ranque das
melhores universidades do mundo revelou uma ausência quase total de
instituições da América latina.
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Campus da USP em São Paulo
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No último dia 3 de outubro, em
Londres, o jornal britânico ‘The TIMES’ publicou o seu já tradicional ranque
das melhores universidades de educação e ensino superior do mundo (Higher
Education World University Ranking), que assinala as 400 melhores universidades
do planeta, revelando que — apesar do fato de o Brasil “ser a sexta economia do
mundo”, e o México a décima quarta — não há uma única universidade
latinoamericana sequer entre as 100 melhores do mundo, e apenas quatro delas
estão entre as 400 melhores da Terra. A USP (Universidade de São Paulo), do
Brasil, é a universidade latino-americana que ocupa a melhor posição e ocupa o
158º lugar no ranque publicado. A UNESC (Universidade Estadual de Campinas),
também no Brasil, está no grupo genérico onde se amontoam as universidades que
vão do 251º ao 275º lugares, ao passo que a Universidade Los Andes, da
Colômbia, e a Universidade Nacional Autônoma, de México (UNAM), estão no grupo
situado entre o 351º e o 400º lugar.
Por incrível que pareça, não
há qualquer universidade argentina, chilena, peruana, nem venezuelana entre as
400 melhores do mundo neste ranque. Em compensação, há 22 universidades
asiáticas entre as 200 melhores e 56 instituições asiáticas de ensino superior
entre as 400 melhores do mundo.
O ranque segue, em escala
mundial, sendo encabeçado por universidades dos Estados Unidos da América (para
o desespero dos americanófobos) — o Instituto de Tecnologia da Califórnia é a
1ª do mundo, e sete das primeiras 10 são universidades estadunidenses —, mas as
instituições asiáticas estão ascendendo com rapidez. Várias instituições
chinesas, japonesas e sul-coreanas estão subindo no ranque, ao passo que 51
universidades estadunidenses perderam terreno quando se comparam as posições
que ocupavam no ano passado.
Outros dois respeitados
ranques internacionais publicados este ano revelam resultados igualmente
deprimentes para as universidades latinoamericanas. Nem o QS World University
Ranking, de Londres, nem a relação publicada pela Universidade Jiao Tong de Xangai,
na China, incluem qualquer universidade latino-americana entre as primeiras 100
melhores do mundo, onde também predominam as universidades estadunidenses.
Phil Baty, editor do ranque de
Ensino Superior do jornal londrino Times, disse numa entrevista telefônica que
o motivo pelo qual há essa escassez de universidades latino-americanas nos
ranques é, entre outras coisas, porque os países latino-americanos oferecem
pouco apoio econômico às suas universidades, os professores são muito mal
remunerados, as pesquisas científicas de âmbito universitário são praticamente
inexistentes e o corpo discente delas está eivado de “alunos profissionais” que
são remunerados por partidos, invariavelmente de esquerda, para transformar as
universidades em foros políticos e ideológicos onde o menos importante é a
qualidade do ensino e da preparação profissional do aluno.
Com poucas exceções, como a
ajuda financeira que o Estado de São Paulo oferece às suas universidades, quase
todas as instituições de ensino técnico e superior da América latina recebem
escassos fundos governamentais, tanto locais, como estaduais e nacionais. Ao
passo que os EUA e a Coreia do Sul investem 2,6 por cento de seus PBIs no
ensino superior, o Chile investe 2,5 por cento, e o México e a Argentina 1,4 por
cento respectivamente, mas é preciso ter em conta o que isso representa, ou
seja, 2,6 por cento de um PIB de 17 trilhões de dólares é consideravelmente
muito mais recursos do que, por exemplo, os 2,5 por cento que o Chile investe
de seu PIB de apenas 181 bilhões de dólares, disse Baty. No ensino superior, o
Brasil investe apenas 0,8% do PIB, sendo o 4º país que menos gasta nesse nível
de ensino. Já com pesquisa e desenvolvimento o Brasil apresenta o menor gasto
entre os 36 países avaliados pela OCDE (Organização para a Cooperação do
Desenvolvimento Econômico): apenas 0,04% dos investimentos em universidades vão
para o setor de pesquisas avançadas. As universidades paulistas mais bem
situadas recebem auxílio financeiro do governo do estado e não de Brasília.
“Os países asiáticos estão investindo muito
nas suas universidades e as universidades de primeira linha custam dinheiro. Na
América latina, vemos una concentração de recursos nas universidades que têm um
enorme número de estudantes e que exigem, por isso, um gasto muito maior em
infraestrutura, o que lhes torna difícil investir em pesquisas avançadas”,
completou.
Muitos governos latino-americanos
não aceitam estes ranques, alegando que a dezena de indicadores que empregam
nos seus cálculos — incluindo enquetes com professores universitários de todo o
mundo e publicações acadêmicas reconhecidas — tende a ‘favorecer os países de
língua inglesa’.
“Vários países latinoamericanos estão
trabalhando num projeto apoiado pela UNESCO com o propósito de poder produzir
um novo ranque que só inclua universidades latinoamericanas (?!). Mas, segundo
Baty, “a enquete mundial que serve como um dos 13 indicadores do ranque do
Times está geograficamente equilibrada e inclui muitos acadêmicos
latinoamericanos e espanhóis. Além disso, o idioma não é desculpa para se
deixar de publicar trabalhos científicos nas melhores revistas acadêmicas do
mundo. As universidades asiáticas publicam muito em inglês, porque querem que
suas pesquisas tenham um público maior e um impacto maior”, diz Baty. “Na
América latina isso não ocorre, porque normalmente não há mesmo trabalhos de
pesquisa avançada que mereçam a atenção, em qualquer língua, das melhores
revistas científicas do mundo”.
A verdade é que a tendência de
muitos governos latinoamericanos é a de subestimar os principais ranques
mundiais de universidades, e o projeto de produzir um ranque regional “feito
sob medida para as universidades latinoamericanas”, é de uma cretinice absurda
e tais projetos são receitas para a autocomplacência, a paralisia e o atraso.
A inveja é o sentimento por
trás de projetos como esse que, se levados a efeito, terão como consequência
apenas o isolamento científico da região do resto do mundo. Com governos que,
em sua maioria, desconsideram a excelência do ensino e da formação
profissional, não é de se estranhar que reajam dessa forma, decadente e
invejosa.
Alegar, como têm feito vários
ministros de educação de esquerda, na região, que “as universidades
latinoamericanas têm metas diferentes” — tais como de dar ensino gratuito aos
pobres — não é desculpa para não competir em escala mundial de excelência. É
como se decidissem participar de um campeonato regional de futebol ao invés de
jogar uma Copa do Mundo, apenas usando o futebol como meio de comparação tão em
voga entre os políticos populistas de esquerda.
Ao invés de serem subestimados
ou ignorados, os ranques das melhores universidades do mundo deveriam ocupar as
primeiras páginas da mídia latino-americana (e também dos Estados Unidos), muito
embora eles não sejam mais úteis do que nos lembrar que os países asiáticos
estão escalando posições rapidamente na economia do conhecimento, enquanto
muitos de nossos países, da América latina, estão ficando cada vez mais para
trás.
Título, Imagens e Texto: Francisco
Vianna (com base na mídia internacional), 09-10-2012
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