sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

À mesa da mente, “Lírios sem delírios”

Carlos Lúcio Gontijo
Na mesma medida em que se dá a não introdução de autores regionais e locais nas salas de aula do ensino brasileiro, somos sempre surpreendidos por adolescentes e jovens que se espantam quando nos conhecem pessoalmente, uma vez que têm no pensamento a ideia preconcebida de que os poemas e romances publicados são obras de autores mortos. Ou seja, tanto pela distância existente entre os autores e os leitores quanto pelo vício de se trabalhar quase que apenas com escritores e poetas de tempos remotos, os estudantes são levados a imaginar que habitamos uma sociedade de autores mortos, como se não houvesse ninguém mais escrevendo alguma obra de real valor literário nos dias de hoje.
Talvez por nossa condição de poeta e escritor independente, sinônimo de quem produz o seu trabalho literário à própria custa, somos levados a ter preferência e gosto pela leitura de livros desprovidos da chancela de selo editorial ou escritos por autores pouco conhecidos, mas ainda assim não menos importantes e criativos que os grandes figurões, que sozinhos não conseguem preencher todos os espaços do ambiente literário, principalmente em um país como o Brasil, no qual constatamos a existência de muitas cidades sem uma biblioteca sequer.
Ao contrário do que muitos imaginam, podemos encontrar uma literatura bastante rica, bem ilustrada e editada com leveza (e arte gráfica) em grande parte das obras independentes, que mesmo em pequenas tiragens e prejudicadas pela mídia devotada à propagação do chocante, ou de conteúdo demolidor de normas e conceitos relevantes à harmônica convivência social, alcança sucesso cada vez mais solidificado, ainda que desassociado dos padrões de alto índice de venda e fama, fenômenos que têm pouco a ver com o contentamento de sermos bem-sucedidos naquilo que nos dispusemos a realizar.
Nesse exato sentido, a escritora e poetisa Clevane Pessoa pode dar-se por satisfeita, uma vez que sua obra literária, que sempre caminhou sobre a linha de horizonte de luz, se nos apresenta filosófica e poeticamente ensolarada, como se estivesse a nos derramar o seu desejo de materializar a construção de uma sociedade mais democrática e, portanto, menos injusta. 
Cantando idealisticamente o seu contracanto em relação ao atual estado de coisas, a poetisa Clevane Pessoa derrama-nos seus “Lírios sem delírios”, no poema “O sol”: Viciada em beleza,/ esqueço enxurradas,/ a esgarçada faixa de gaze em Gaza/ onde o sangue mancha/ a pureza das crianças e dos inocentes,/ a fome dos que sentem sede,/ a sede dos que esperam alimento,/ os bombardeiros, / quando o sol, ave gigantesca de ouro,/ estende as asas na manhã de janeiro/ e pulveriza-me para que eu retome/ as esperanças/ no ano que se inicia...
Clevane Pessoa é mais que escritora, mais que poetisa, pois tem o ânimo de ativista cultural, podendo ser vista em muitos grupos e movimentos do âmbito literário, com desprendimento e disposição em apoiar os autores que a procuram, num procedimento determinante ao granjeio de um punhado de bons amigos, conforme ela bem diz em seu “Poemeto da amizade”: amigos são rapadura,/ dizem coisas cor de mel/ transmitem sua ternura/ por vírus bons de papel.../ Muito embora virtualmente,/ sentimos o seu carinho: batem teclas para a gente/ Com bico de passarinho...”
Para os que têm apreço pela leitura, livros como “Lírios sem delírios”, de Clevane Pessoa, se transformam em exponencial fonte de alimento, permanecendo por tempo indefinido à mesa de nossa mente.
Título e Texto: Carlos Lúcio Gontijo, Poeta, escritor e jornalista, Secretário de Cultura de Santo Antônio do Monte/MG

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