Aparecido Raimundo de Souza
GOSTAR DE ALGUÉM NÃO É MORAR
EM SÃO PAULO, Rio de Janeiro, Brasília, Portugal, Canadá, ou qualquer outra
cidade importante do planeta, mas morar com ela, de preferência dentro de seu
coração. Gostar de alguém é lhe dar as mãos estendidas de carinho, depois de
lhe ofertar a vida com esperanças de um porvir melhor.
Gostar de alguém é participar
ativamente do seu dia a dia, ouvir e entender sem fazer sombras por menores que
sejam em suas ideias. Gostar de alguém é apoiar todos os seus planos sejam eles
quais forem, mesmo os mais loucos e desconexos, incentivá-la lhe dando o apoio
moral necessário, perseverando juntos, como se fossem uma só pessoa e,
sobretudo, não abandonar, jamais, a própria personalidade.
Gostar de alguém é chegar de
mansinho, acompanhar, ver e sentir, compreender e não fazer perguntas
desnecessárias, nem meter o nariz onde não foi chamado. Gostar de alguém é
confiar plenamente nela e envolvê-la com doçura, com muita ternura. Fazê-la se
sentir cativa da sua presença, prisioneira dos seus desejos, porém, sem querer
saber se existe o lado contrário, a parte escura, o esconderijo secreto, porque
amando e, consequentemente gostando de verdade, com a alma, nunca, durante esse
tempo, será tão imensa a contrariedade.
Gostar de alguém é uma coisa
muito sublime, e, por demais complexa. Algo que às vezes está longe e acima do
alcance das nossas vontades e entendimentos. Gostar de alguém é como buscar a
Deus sem intermediários, sem meios termos. Gostar de alguém é dar e doar a alma
e não esperar calculadamente pelo espírito. Gostar de alguém é passar a noite
sonhando com ela, imaginando-a nos braços, gozar esses instantes como se fossem
eternos e não se preocupar se, dia seguinte, o sol quente ou o vento forte
vierem interromper suas fantasias batendo forte nas vidraças da janela.
Gostar de alguém é tentar ser
sempre o prometido, o príncipe encantado dos contos de fada, aquele cavalheiro
solitário que chegará de um momento para outro montado num lindo cavalo alazão
e depositará cheio de reverência, um beijo em meio a sua testa, como o Romeu
eterno buscando a sua Julieta perfeita. Gostar de alguém é fazer o impossível
dentro do possível para não quebrar o encanto e nunca - nunca cobrar as
promessas que não vingaram.
Gostar de alguém é ter
silêncio no instante exato, respostas firmes na hora precisa, no minuto
derradeiro e, ainda, ter o sopro da vida em abundância, para tentar suprir o
vazio, a lacuna deixada por alguém que o destino levou para longe, numa viagem
por entre estrelas de primeira grandeza, mas que se sabe, não terá volta.
Gostar de alguém é gritar, pular e fazer sorrir a companheira de todas as
horas. É transformar o feio numa flor
perfumada e de rara beleza. É esculpir a amada num quadro indescritível, mesmo
quando pintar em seu rosto o mau humor motivado pelas incoerências, ou pelas
horas tristes de angustias e aflições. Gostar de alguém é ser como um anjo no
momento que os dissabores insistirem em marcar presença constante ao seu lado.
Gostar de alguém é entender sempre e não querer ser o eterno entendido. É
acompanhar a ilusão, passo a passo, enquanto ela existir, procurar vivê-la sem
cogitações, e, como a uma fogueira, alimentá-la e intensificá-la sempre, “ad
aeternum”.
Gostar de alguém é saber a
hora, o instante exato de se afastar antes do tédio e da monotonia baterem à
porta, do copo transbordar todas as mágoas guardadas, e, ainda, das lágrimas
brotarem por pequenas coisas fúteis que não foram ditas. Gostar de alguém é
passar por cima dos problemas que ficaram sem solução. É saber como chegar ao
minuto fatal de dizer adeus sem constrangimentos, e, ao fazê-lo, manter a
cabeça erguida, sem a expectativa da volta ou de uma nova reconciliação.
Gostar de alguém é se render
de corpo inteiro, sofrer por amor até a exaustão, mergulhar de cabeça, às
cegas, num alçar desconhecido, como Ícaro em busca do voo perfeito, dentro do
imperfeito, na ânsia do muito longe, ou como o andarilho sem teto, cujo
paradeiro ignora o desfecho que lhe aguarda no final da estrada cheia de curvas
sinuosas. Gostar de alguém é dizer coisas lindas, é sussurrar juras de afeições
profundas. É sentir as entranhas queimando, o corpo ardendo em febre de
quarenta graus. É sentir a alma leve e solta, solta e leve, a vida fluindo,
como se fosse uma pluma na imensidão. É ter o coração batendo acelerado,
descompassado, como se quisesse, de repente, saltar peito afora, criar pernas e
sair à cata de lugares nunca imaginados.
Gostar de alguém é
efetivamente nunca se arrepender, amanhã, depois, ou algum dia (sempre há algum
dia), por ter se entregue tanto, por ter anulado sonhos, ou deixado de fazer
isso ou aquilo. Gostar de alguém é perder o rumo, o prumo, o pulso, a visão do
que é certo ou errado, a ponto, inclusive, de não saber o caminho da volta, o
porto amigo para tentar reconstruir a si mesmo dentro do vazio enorme e escuro
que ficará martelando, pungente, como uma ferida aberta que se negou
efetivamente a cicatrizar.
Gostar de alguém é por
derradeiro, ter coragem suficiente para correr atrás dela no instante exato em
que ela tomar a decisão de sair porta afora, com as roupas do corpo, deixando,
no ar, um vazio grande demais, uma inquietude intransigente, pesada, obesa, que
logo se transformará em esquálida e intransponível solidão.
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PANFLETADO E DISTRIBUÍDO NAS SINALEIRAS, ALÉM DE INCLUÍ-LO EM MEU PRÓXIMO LIVRO
“LINHAS MALDITAS” VOLUME 3.
Título e texto: Aparecido Raimundo de Souza, jornalista. Do
Sítio ”Shangri-La” – Um lugar perdido no meio do nada. 10-3-2017
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