PSP já tem 16 sindicatos e 36 mil
dias de folga para os dirigentes
São os
próprios sindicatos a dizer que é "uma vergonha" o que se passa na
polícia. Três sindicatos têm mais dirigentes que sócios
Valentina Marcelino
Há um "Vertical", outro
"Independente", outro "Autónomo", outro "Livre" e
até um dos "Polícias do Porto". Já resta pouca imaginação para dar
nomes a tantos sindicatos na PSP, que atingem o número recorde, inigualável
noutro setor, de 16. O mais recente - Organização Sindical dos Polícias -
nasceu em fevereiro e conta com 459 dirigentes e delegados para 451 associados.
Uma nova lei para alterar o sistema está no Parlamento há um ano, mas PS e PSD
não se entendem e são precisos dois terços de deputados para a aprovar.
Segundo o regime em vigor, cada
dirigente tem direito a quatro folgas por mês para atividade sindical. Os
delegados têm 12 horas. Tudo somado, de acordo com os dados da Direção Nacional
da PSP, em 2017 o total de 3680 dirigentes e delegados tiveram mais de 36 mil
dias de folga. O impacto na gestão das patrulhas e na marcação das escalas é um
facto assumido por comandantes ouvidos pelo DN. "Numa altura em que a
falta de efetivos é uma realidade, um que se ausente causa sempre perturbações
nas equipas que estão formadas", explica um desses comandantes, da zona de
Lisboa.
O presidente do primeiro sindicato a
ser criado e o mais representativo, a Associação Sindical dos Profissionais de
Polícia (ASPP), lamenta o "impasse político" e lamenta "mais
ainda" que "os mais de 20 anos de luta para que a PSP tivesse sindicatos
sejam agora os próprios polícias a fazer que, ignorando totalmente o interesse
do coletivo, essa luta e essa credibilidade sejam destruídas". "É
pena que os dois maiores partidos não pensem nisto, já para não falar dos
problemas na gestão de recursos humanos que tudo isto causa. Só posso dizer que
é uma vergonha!", salienta Paulo Rodrigues.
Há cerca de um ano, a ex-ministra da
Administração Interna Constança Urbano de Sousa foi a primeira governante a
avançar com uma proposta de lei para alterar o regime sindical da PSP, cujo objetivo
era condicionar o número de dirigentes sindicais à representatividade da
estrutura, tal como acontece noutros setores. O problema foi que, sem dar
conhecimento aos partidos que formam a maioria de esquerda, aproveitou para criar
limitações à atividade sindical, proibindo que os dirigentes se pronunciassem
sobre várias questões relacionadas com as condições de trabalho.
A lei da rolha teve de imediato a
oposição, não só do PCP e do BE, mas também do CDS. O PSD, por sua vez,
aproveitou a "onda" para sugerir que aquelas novas regras fossem
estendidas aos sindicatos de outros setores e o diploma ficou na gaveta.
Quem ganha com esta proliferação de
sindicatos? "Já ninguém ganha. Todos perdem. Numa fase inicial, podíamos
compreender que o dividir para reinar seria conveniente, mas nesta altura
chegou-se a um limite que já ninguém reina e impede qualquer processo sério de
negociações", sublinha Paulo Rodrigues.
No próximo dia 21, a ASPP vai dedicar
a esta polémica a comemoração do dia histórico do sindicalismo policial - os
"Secos e Molhados" - e quer voltar a inscrever o tema na agenda.
No ano passado, os sindicatos
conseguiram limitar um pouco os créditos, diminuindo estas folgas em 1284 dias,
relativamente a 2016. A Direção da PSP vê aqui um sinal de uma "atitude
mais responsável" por parte de algumas estruturas "usando os créditos
apenas em efetiva atividade sindical que pudessem apresentar/mostrar".
Com um novo presidente no PSD, que
defende uma oposição "construtiva", a esperança de um acordo com o PS
reacendeu-se. Contatados pelo DN, porém, nem socialistas nem sociais-democratas
abriram o jogo. "O PS ficou de encontrar uma solução com o governo para
que a proposta ficasse em condições de ser votada. A nós compete-nos esperar e
insistir", diz Carlos Peixoto, vice-presidente da bancada socialdemocrata.
Do governo, o gabinete de Eduardo
Cabrita não respondeu ao DN. A deputada socialista Susana Amador, que tem esta
"pasta", revelou que o PS vai reunir-se com "o novo interlocutor
do PSD para a Segurança Interna, Matos Correia". Questionado sobre qual
seria a nova posição do PSD, Matos Correia não quis fazer declarações.
Factos e
números
O maior sindicato. A ASPP é o
sindicato com maior número de associados (7392) e que tem também a menor
percentagem de dirigentes (1,5%). Foi o primeiro a ser criado depois da lei
sindical ser sido aprovada, em 2002.
O mais pequeno. O
Sindicado dos Polícias do Porto é o que tem um número mais reduzido de
associados: apenas 24, sendo todos dirigentes e aos que se somam mais 12
delegados. No total, este sindicato tem mais dirigentes e delegados do que
sócios.
Mais dirigentes. O novo
sindicato, criado em fevereiro - Organização Sindical dos Polícias (OSP)- tem,
juntamente com o Sindicato Independente Livre da Polícia (SILP), a maior
percentagem de dirigentes, tendo em conta o número de sócios. Na OSP há 70% de
dirigentes, no SILP há 70,4%.
O que pode mudar. Se for
aprovada a proposta que o governo apresentou há um ano, só na parte que diz
respeito à limitação dos créditos sindicais, a redução dos dirigentes poderá
cair para quase 10% do que existe atualmente, pois passa a ser proporcional ao
número de associados (por exemplo, até 200 sócios só um dirigente). A
diminuição dos dirigentes terá impacto direto no volume de folgas sindicais, o
que poderá levar ao afastamento de muitos dirigentes dos sindicatos mais
pequenos.
Título, Imagem e Texto: Valentina Marcelino, Diário de Notícias, 4-4-2018
Título, Imagem e Texto: Valentina Marcelino, Diário de Notícias, 4-4-2018
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