sábado, 13 de julho de 2019

Também quero quotas “raciais” para gente como eu

Cristina Miranda

Desde que me conheço que luto arduamente para ter alguma coisa na vida. E quando digo arduamente é mesmo isso. Nada me foi facilitado. Se quis “independência” cedo, tive de me agarrar ainda com 16 anos a um trabalho nas férias da escola numa fábrica. Se quis seguir estudos, tive de concluir o secundário à noite enquanto de dia “comia pó” a carregar camiões. Se quis depois entrar para o superior tive de estudar como o caraças para ter boa média. Se quis depois concluir o curso, tive de trabalhar até às 17h/18h e seguir direto de Ponte de Lima até ao Porto para assistir às aulas que podia, ficar muitos fins de semana fechada em casa a “marrar”  para as frequências e mesmo assim aguentar com as frustrações de não passar a inglês (apesar do meu 16 no secundário) só porque era uma cadeira que não podia frequentar por chegar sempre tarde. Mesmo assim, não desisti e com mais um ano em cima pelas dificuldades criadas por certos professores, lá concluí o curso.

Mas a saga não acabou aqui. Se quis dar aulas tive de ter boa média para ficar bem colocada. Se quis mudar para gestão de empresas tive de sobreviver a um mundo maioritariamente de homens que por ser novinha (com 25 anos) e mulher, punham em causa as minhas capacidades dificultando todos os meus passos, obrigando a uma maior afirmação que qualquer outro mortal para conseguir objetivos. Se quis depois empreender tive de ir buscar coragem ao diabo para fazer frente a todos os lobbys que se atravessaram no meu caminho para me atirar borda fora daquele ramo de atividade. Se quis recomeçar tudo de novo e renascer das cinzas,  depois de uma luta desigual contra interesses instalados, tive de vestir uma bata para limpar casas, passar a ferro para fora, guardar crianças e idosos porque aos 40 somos velhos demais  para trabalhar e ninguém nos quer.

Porque ser branco, mulher/homem, de meia idade, de estrato social baixo, sem grandes apelidos, sem conhecidos em lugares importantes, heterossexual, com carro de baixa cilindrada com cerca de 20 anos,  não dá quotas de borla e impede que consigamos sequer um lugar na política – onde prospera gente sem competências nem conhecimentos do  país real apenas dotados de currículos académicos extensos e pomposos – cujo o status quo é mais importante do que qualquer experiência  profissional comprovada no terreno.

Se é para estabelecer quotas raciais por que motivo nós os remediados deste país que contam tostões ao fim do mês por não ter “amigos” influentes, sem cor na pele nem tendências sexuais da moda, não podemos também ter o privilégio de deixar de ter de lutar como mouros  por aquilo que desejamos?

Diz o artigo 13 da nossa Constituição:
Artigo 13.º – (Princípio da igualdade)
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação econômica ou condição social.

Como podem estes pseudopolíticos atropelar os direitos previstos na nossa Constituição sobre igualdade? Quando impomos quotas estamos claramente a colocar grupos em situação privilegiada em detrimento de outros sem qualquer respeito pelo mérito. E isto é racismo.

Não há lei nenhuma neste país que impeça que qualquer indivíduo alcance o que quer que seja pela sua condição.  Por isso cabe a cada um lutar por conseguir o que deseja na vida. Se não for bem sucedido não é por causa cor da pele porque se assim fosse, António Costa não era ministro de Portugal; Van Dunem não era ministra da Justiça; Mamadou Ba não se sentava no Parlamento a viver do erário público; Narana Coissoró não tinha sido deputado; a candidata negra do LIVRE não se tinha formado na universidade; não haveria pessoas de todas raças e etnias a estudar no superior;  Hirondina Costa, uma  habitante do Jamaica que tenho a honra de conhecer, não seria uma profissional de sucesso completamente integrada na sociedade com dois estabelecimentos comerciais. Algum destes precisou de quotas para chegar mais longe do que muitos de nós? Não. O que impede realmente alguém de subir na vida é sua determinação, sua vontade e para voos mais altos, seu estrato social (infelizmente). Mais nada.

Anda-se a inventar um país racista que nunca o foi só para legitimar a ação de associações pouco transparentes e com legalidade dúbia, agremiações de antifas (antifascistas) perigosos debaixo de uma capa partidária que faz perseguição criminosa por divergência de opinião. Eles alimentam-se destas agendas e não perdem uma oportunidade para as intensificar. Porque é disso que vivem. (Veja aqui neste vídeo o próprio Mamadou a afirmá-lo.) 

Foi o caso do artigo de opinião Fátima Bonifácio. Por que razão a primeira não pode ter liberdade de expressão e tem de ser crucificada na praça e  em relação à instigação ao ódio   e violência – clara e inequívoca –  de Mamadou e as Mortáguas contra os bófias, os tugas, os nazis imaginários e pedido de  morte ao Bolsonaro, já pode ao abrigo da liberdade de… expressão? Mas voltamos ao fascismo, é isso?

Sobre liberdade de expressão diz nossa Constituição:
Artigo 37.º – (Liberdade de expressão e informação)
1. Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de se informar, sem impedimentos nem discriminações.
2. O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.
3. As infracções cometidas no exercício destes direitos ficarão submetidas ao regime de punição da lei geral, sendo a sua apreciação da competência dos tribunais judiciais.
4. A todas as pessoas, singulares ou coletivas, é assegurado, em condições de igualdade e eficácia, o direito de resposta.

Quando tentamos silenciar opositores e não olhamos a meios para o conseguir, não restam quaisquer dúvidas que não se trata de um Estado de Direito, mas sim o princípio claro de instauração de uma ditadura.  Com as quotas raciais o princípio é exatamente o mesmo.
Título e Texto: Cristina Miranda, Blasfémias, 12-07-2019

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