João Marques de Almeida
Os trabalhistas, tal como os
socialistas em Portugal, são vítimas da sua propaganda. A maioria dos
britânicos sabe que os últimos anos foram duros, mas que nenhum país pode
gastar mais do que produz.
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A vitória do Partido
Conservador e a derrota dos Trabalhistas foram extraordinárias. Desde 1900,
nenhum partido tinha aumentado a sua votação após uma legislatura completa. A
última maioria absoluta dos Conservadores tinha sido em 1992. E os Trabalhistas,
desde 1983 que não tinham um número tão reduzido de deputados. Assistiu-se ao
fim da era de domínio dos Trabalhistas na política britânica, iniciado em 1997.
Foram necessárias duas eleições para acabar com a hegemonia construída pelo
“New Labour”.
O sucesso da política
económica do primeiro governo de Cameron é a primeira – e mais importante –
explicação para a vitória dos Conservadores. Apesar do que diz o líder do PS,
no Reino Unido também houve “austeridade” – aliás a campanha dos Trabalhistas
foi precisamente contra a “austeridade que está a destruir o sistema nacional
de saúde”. Os trabalhistas, tal como os socialistas em Portugal, são vítimas da
sua própria propaganda. A maioria dos britânicos sabe que os últimos anos foram
difíceis, mas sabe que nenhum país pode gastar mais do que produz. Por isso,
sabe que a “austeridade” era inevitável, e não o resultado de uma escolha
política ou ideológica. E também sabe que o último governo trabalhista foi o
responsável pela necessidade de uma política de “austeridade”. Os britânicos
pensaram de uma forma muito simples. O governo fez o que tinha que ser feito, a
economia está a recuperar, e por isso decidiram não colocar em causa os
sacrifícios dos últimos cinco anos. Obviamente, o crescimento de 2.5% da
economia e a diminuição do desemprego ajudaram e muito. Ou seja, os
Conservadores não ganharam apesar da “austeridade”; venceram por causa da
“austeridade”.
Em segundo lugar, o líder dos
Conservadores, David Cameron, foi sempre visto como um líder mais competente do
que o líder Trabalhista, Ed Miliband. Em todos os estudos de opinião, apareceu
sempre 10 pontos à frente de Miliband como o “líder mais competente”. De certo
modo, mais do que a competência de Cameron, a falta de credibilidade de
Miliband foi um fator fundamental. Houve um momento decisivo no último debate
em Leeds quando Miliband disse que o anterior governo Trabalhista não tinha
sido despesista. Os britânicos perceberam que Miliband não podia ser
primeiro-ministro. Há limites para a negação do passado e para a rejeição das
responsabilidades.
Cameron mereceu igualmente
vencer pela campanha que fez. Foi criticado por muitos, inclusivamente no seu
partido, mas acreditou até ao fim que ganharia. As sondagens deram
invariavelmente um empate técnico entre Conservadores e Trabalhistas. Mas
Cameron não mudou de estratégia. Os Conservadores sabiam desde o inicio que
Cameron tinha mais credibilidade que Miliband e que os Britânicos confiavam
mais neles para governar o país do que nos Trabalhistas. O objectivo crucial
seria convencer dois tipos de eleitorado a votar nos Conservadores. Os
eleitores de classe média que em 2010 tinham votado nos Trabalhistas e nos
Liberais e que entretanto perceberam que o governo liderado pelos Conservadores
tinha feito que era necessário. E aqueles que votaram nos Conservadores em 2010
mas estavam zangados com o partido. Cameron acreditou que se conquistasse estes
votos ganharia as eleições com uma margem folgada em relação aos Trabalhistas.
Como disse até ao último dia, “o que interessa é o voto não são as sondagens.”
Mas é necessário determinação, coragem e disciplina para manter a estratégia
eleitoral, quando há dúvidas no interior do partido e quando as sondagens dão
constantemente um empate. E aqui o mérito foi inteiramente de Cameron.
Por fim, a viragem à esquerda
dos Trabalhistas também ajuda a explicar a vitória dos Conservadores. A
oposição à austeridade radicalizou os Trabalhistas. Como resultado, perderam o
eleitorado da classe média que decide os resultados das eleições. A partir do
momento em que a classe média entendeu que a austeridade foi necessária e que a
situação começou a melhorar, percebeu igualmente que não se pode desperdiçar os
sacrifícios feitos. Mas também perdeu confiança nos Trabalhistas para formarem
governo. Receia que voltem a cometer os mesmos erros. E a classe média aprendeu
uma lição dura com a crise. Quando a despesa se torna incontrolável, é ela
paga, mais tarde ou mais cedo.
Com a eleição de Ed Miliband
como líder, o Partido Trabalhista renunciou à herança de Blair, perdendo assim
o eleitorado da classe média que deu três maiorias absolutas ao “New Labour”.
A verdade é que muitos Trabalhistas preferem estar “certos” na sua
ortodoxia e perderem eleições, do que mudar e serem eleitos. O eleitorado
britânico, obviamente, fez-lhes a vontade.
Título e Texto: João Marques de Almeida, Observador,
11-5-2015
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