José António Rodrigues Carmo
Há dias, no carro de pessoas
de esquerda, dando indicações sobre o itinerário, fui fazendo algumas ironias e
piadas sobre o "virar à direita". Gosto do sentido de humor e aprecio
pequenas provocações sobre futebol, ideologia etc.
Mas sei, por experiência
própria, que o sentido de humor anda pelas ruas da amargura. As pessoas
irritam-se e carregam o semblante, parece que agora tudo é sagrado.
Nesta nova era da correção
política, há temas que não admitem brincadeiras, é como se de repente o mundo
estivesse pejado de beatas. As pequenas brincadeiras discursivas são encaradas
como blasfêmias e os seus autores tratados como pecadores impenitentes e
malévolos.
Com o clima, com o Trump, com
os gêneros, com "as minorias", etc etc., não se brinca.
Há dias, no único debate que
calhei a ver, entre Rui Rio e André Silva, do PAN, o Rio ia sorrindo, mas o
André, com o olhar fuzilante e expressão carrancuda, tudo encarava como se
fosse o apóstolo de uma qualquer religião, o pregador da Grande Verdade.
Curiosamente é a mesma atitude
da Catarina Martins, do Jerónimo, e de todos os evangelistas que acreditam que
possuem a "Verdade" e que os ímpios que com elas brincam, merecem, no
mínimo a flagelação e a lapidação, além de arderem no Inferno, claro.
Esta gente anda sempre séria,
de cara carregada, de emergência em emergência, numa incessante pregação de
virtude e intolerância ao pecado.
São exatamente como as típicas
beatas de aldeia, que bufam, se benzem e se indignam quando alguém diz ou faz
algo que brinca com a sua ortodoxia.
Hoje as pessoas zangam-se por
tudo e por nada, porque tudo lhes parece imensamente sério, definitivo, preto
ou branco, sem cambiantes.
Quando tinha 17 anos, acho que
também era assim, seguro das minhas certezas ignorantes, pelo que acredito que
estes novos tempos são o reflexo de uma maior densidade da ignorância.
Temos tanta informação ao
alcance dos dedos que tendemos a aplicar-lhe os filtros que só trazem até nós
aquilo em que já acreditamos.
Estes tempos de intolerância
levam-nos à divisão, à fúria, à raiva.
Um bocadinho de sentido de
humor ajudaria muito a arrefecer as fúrias, mas os donos da "Verdade"
não estão para aí virados.
Título e Texto: José
António Rodrigues Carmo, Facebook,
14-9-2019
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