quinta-feira, 3 de abril de 2014

A debacle da esquerda europeia

Leiamos o que escreveu o sociólogo brasileiro de esquerda, Emir Sader, no portal de esquerda, Carta Maior:

A maior derrota da esquerda é a inexistência de grandes mobilizações contra a política de austeridade, aplicada tanto pela direita, como pela social-democracia.

A França era, nas palavras de Engels, o “laboratório de experiências políticas”, berço de 1879, 1848, da Comuna de Paris de 1871, no século passado da Frente Popular, das barricadas de 68.

A maior virada política e ideológica operada na Europa foi exatamente na França, que passou de núcleo mais progressista a bastião mais conservador do continente.

Perry Anderson analisou de maneira magistral essa triste virada no seu artigo “O pensamento insosso” (La pensée tiède, na versão francesa, Ed. Seuil; Degringolade et Union sucreé, na versão original, London Review of Books, 2 e 23/9/2004).

As últimas eleições francesas confirmam aquilo a que fomos tristemente nos acostumando: os trabalhadores franceses têm na Frente Nacional seu partido majoritário. Um partido que prega não apenas a saída do euro – posição defensável para a esquerda também -, mas a proibição de entrada de imigrantes, a pena de morte, entre outras de suas posições de extrema-direita.

Antes a classe operária francesa era ou socialista ou comunista, invariavelmente. Agora, instrumentalizada pelo chovinismo contra os imigrantes, se passou para a extrema-direita. Na virada à direita de todo o continente europeu e no enfraquecimento geral da esquerda, este é o seu aspecto mais dramático.

Desde que a crise econômica mais prolongada e profunda do capitalismo desde 1929 eclodiu, tendo a Europa como epicentro, durando já mais de 7 anos, a maior derrota da esquerda é a inexistência de grandes mobilizações populares contra a politica generalizada de austeridade – aplicada tanto pela direita, como pela social-democracia – e, como corolário, o fortalecimento ainda maior da extrema-direita na crise e não da esquerda.

Alguns fatores foram determinantes nesses retrocessos, entre eles o fim da URSS e o enfraquecimento dos partidos comunistas, assim como a adesão da social-democracia ao neoliberalismo. Mas na crise atual surgiram movimentos de jovens na Espanha, na Inglaterra, que, porém, não tiveram nem continuidade, nem repercussão na massa trabalhadora dos seus países.

A derrota de governos social-democratas – como nos casos da Espanha, de Portugal – arrasta consigo também a extrema-esquerda, que se recupera lentamente depois, mas sem capacidade de se tornar força hegemônica. A substituição de governos conservadores – como no caso desses dois países ou da Inglaterra ou da Alemanha – fica dependendo do que ocorra com os partidos social-democratas e sua aliança ou não com setores mais à sua esquerda.

A esquerda europeia, berço da esquerda do século XX, ja não existe como tal. Nem os PCs, nem os partidos socialistas, tampouco a extrema-esquerda – trotskistas ou outras variantes – têm demonstrado força para recompor a esquerda europeia. A construção da União Europeia, por sua vez, ao se centrar na unificação monetária, constituiu-se numa armadilha, de que a esquerda não sabe como sair e que a extrema-direita explora, como única corrente que prega contra o euro.

As eleições europeias de maio deste ano devem confirmar o fortalecimento da extrema-direita, um altíssimo nível de abstenção e o enfraquecimento das outras correntes políticas.
Título e Texto: Emir Sader, Carta Maior, 03-04-2014

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