Os novos protagonistas do partido de Joe
Biden são ativistas radicais que pregam a introdução do socialismo nos EUA. A
guinada à esquerda preocupa eleitores fiéis
Ana Paula Henkel
Quando Margaret Thatcher
chegou ao poder, em 1979, muitos no Ocidente acreditavam que a Guerra Fria não
poderia ser vencida. Quando ela deixou o cargo, o Muro de Berlim havia caído e
a Europa Oriental, libertada. Um ano depois, a União Soviética desmoronou no
lixo da história.
A democracia e a liberdade
estavam avançando. As contribuições da primeira-ministra para essa vitória
foram profundas. Juntamente com a firme visão e o esforço de seu amigo próximo,
o presidente Ronald Reagan, a inspiração e o trabalho do papa João Paulo II e a
determinação dos povos oprimidos do Leste Europeu e da Rússia, sua coragem e
liderança foram fundamentais para a derrota do comunismo pela democracia.
Em novembro de 2019, o mundo
celebrou o 30º aniversário da queda do Muro, um evento que confirmou o colapso
do comunismo na Europa Oriental e anunciou o final da Guerra Fria. Quando o
Muro caiu, os comunistas já tinham perdido o controle da Polônia e da Hungria
e, antes do fim de 1989, o regime soviético também havia se rendido na Alemanha
Oriental, na então Checoslováquia, na Romênia e na Bulgária. Nos anos
seguintes, a Iugoslávia e a própria União Soviética derrubariam seus líderes
comunistas e a Cortina de Ferro acabaria ruindo, produzindo mais de uma dúzia
de novos Estados soberanos no leste e no sul da Europa sob o pilar da
liberdade, contra as premissas coletivistas socialistas.
Antes de Ronald Reagan, que
compôs o trio que impôs brilhante resiliência e estratégia na derrota do regime
soviético, John F. Kennedy chegou à Casa Branca com a visão de usar a
diplomacia para resolver os conflitos da Guerra Fria e impedir o avanço do
comunismo. No entanto, a atitude agressiva dos soviéticos, bem como outros
eventos externos, dificultava a tarefa de encontrar soluções diplomáticas.
JFK defendeu cortes
tributários, queria mais dinheiro no bolso dos norte-americanos — inclusive os
ricos —, e era a favor do porte de armas
Kennedy foi um dos presidentes
mais populares da história, não apenas por sua elegância, seu carisma e por ter
sido um herói de guerra, mas por suas convicções e decisões políticas que
mudaram, para melhor, a vida de muitos norte-americanos. JFK era um propulsor
ardente de cortes tributários e acreditava que mais dinheiro nas mãos de todos
os norte-americanos, inclusive os mais ricos, estimularia o crescimento da
economia e a geração de empregos pelo setor privado.
O presidente democrata tinhas
posições polêmicas, mas firmes. Na política internacional, prezava pela firmeza
nos limites estabelecidos, as red lines (alô, Obama!), e acreditava na
paz por meio do vigor e da força. Em seu discurso de posse, em 1961, ele
ressaltou a importância de um exército forte e robusto. Sobre armas, JFK não
era apenas fiel defensor da Segunda Emenda à Constituição, que protege o
direito do cidadão norte-americano de possuir armas, mas foi também um dos oito
presidentes membros da NRA, a Associação Nacional de Armas.
O Partido Democrata de JFK,
que já foi considerado moderado em políticas econômicas e no campo ideológico,
por defender um dos pilares mais fortes dos Estados Unidos — a Primeira Emenda
e a liberdade de expressão —, hoje celebra quando vozes dissonantes e opostas
são silenciadas em redes sociais e plataformas digitais. Seus agentes
protagonistas no cenário político são ativistas radicais que pregam a
introdução do socialismo na América. A clara e bizarra guinada do partido à
esquerda é preocupante até para seus eleitores mais fiéis. E é exatamente essa
ala radical do partido que hoje comanda o caminho dos democratas.
A torcida é para que
o radicalismo exibido largamente seja apenas jogo de cena
Liderados por Bernie Sanders,
Alexandria Ocasio-Cortez e outros parlamentares igualmente extremistas como
Ilhan Omar, Ayanna Pressley e Rashida Tlaib, os democratas têm defendido
políticas de fazer JFK revirar-se no túmulo. Propõem medidas como o aumento de
impostos em até 70% para os mais ricos, políticas
de fronteiras mais abertas, assistência médica com recursos federais para
imigrantes ilegais, legalização do aborto em qualquer fase da gestação. E mais:
os democratas querem um caricato “Green New Deal”. Entre outras políticas
estapafúrdias e inatingíveis sob a falsa bandeira de proteção ao meio ambiente,
o “acordo verde” visa à eliminação de praticamente toda a produção de
eletricidade oriunda de combustíveis fósseis em dez anos. Economistas e
críticos do “superplano” afirmam que a descabida ideia destruiria pelo menos quatro
milhões de empregos nas indústrias de petróleo, gás natural e carvão e
dispararia a dívida pública norte-americana.
O novo perfil do partido de
JFK também prega discursos extremistas aliados ao apoio a grupos marxistas como
o Black Lives Matter (informação da própria página oficial do grupo), diz que
vai acabar com a “antiga política” (sem dar maiores detalhes da tarefa), que
está lutando contra o “fascismo” da atual administração (a palavra também é
usada aqui nos EUA como quem troca de roupa), e que o socialismo é a solução
para a América. A enorme exposição midiática desses grupos e agentes políticos,
embalados nessa nova retórica democrata que prega velhas ideias empoeiradas e
fracassadas, vem preocupando muitos eleitores.
A poucos meses da eleição
presidencial de novembro, a pergunta do momento é: será que esse grotesco
radicalismo do Partido Democrata, exibido diariamente na TV, não está restrito
a apenas algumas vozes barulhentas e sem importância no cenário político
norte-americano? É o que os milhões de eleitores democratas e republicanos
andam desejando. As ramificações e consequências desses atos, ideias e
declarações andam tirando o sono do norte-americano médio, preocupado com a
economia, com a segurança e a utilização do dinheiro de seus impostos. Não é mais
novidade — e os chefões do partido não fazem mais questão de esconder — que a
guinada radical democrata já consumiu todo o oxigênio da antiga agremiação.
Uma questão
importante: a qual partido JFK se filiaria hoje?
Em 2019, enquanto muitos
celebravam o aniversário da queda do Muro de Berlim, que significou exatamente
o descarte de ideias radicais no monte de poeira da história, uma pesquisa da
Universidade Quinnipiac já mostrava a inquietação e o desconforto dos
norte-americanos com a nova roupagem dos democratas. Questionados se o Partido
Democrata havia se movido muito para a esquerda, alarmantes 47% dos
entrevistados — quase a metade — disseram que sim. As origens dessa mudança são
diversas e vêm acontecendo há anos. Parte disso é uma reação emotiva a Trump.
Parte vem da guerra nas primárias democratas em 2016 entre Sanders e Clinton.
E, finalmente, há ainda uma parte resultante das políticas progressistas
implementadas nos oito anos em que Obama esteve na Casa Branca. Obama, com sua
retórica macia e carismática, implementou progressivamente no país medidas que
não condizem com as digitais da nação.
Quando JFK foi eleito
presidente pelo Partido Democrata, em 1960, suas políticas eram consideradas
comuns e populares. Hoje, enquanto o nome John Kennedy continua reverenciado
pelos democratas, o mesmo não ocorre com suas ideias. Se Kennedy estivesse
vivo, a qual partido ele pertenceria no espectro político de hoje? Ronald
Reagan, que foi democrata durante a maior parte de sua vida e se elegeu por
dois mandatos pelo Partido Republicano, disse em várias ocasiões: “Não deixei o
Partido Democrata. O Partido Democrata me deixou”. Hoje, eleitores de ambos os
partidos estão apreensivos não apenas com a guinada dos democratas, mas com o
silêncio de seus integrantes mais antigos. Eles não falam sobre essas questões,
nem a respeito da candidatura de Joe Biden alicerçada em pilares do
progressismo extremo e em propostas que não deram certo em absolutamente lugar
algum no mundo.
Margaret Thatcher, a Dama de
Ferro, disse certa vez que os Estados Unidos conseguiram construir um aparato
institucional forte o suficiente que protegeria a nação de radicalismos e
ideias socialistas. Reagan, em seu histórico discurso no Portão de Brandemburgo
em 1987, quando proferiu a famosa frase “Mr. Gorbachev, tear down this wall!”
(“Sr. Gorbachev, derrube esse muro!”), foi aconselhado por assessores a retirar
a frase do discurso por ser incisiva demais e pelo potencial de causar tensões.
O presidente norte-americano disse que era preciso coragem para dizer o que
precisava ser dito, especialmente quando a liberdade está contra a parede.
Não devemos nos esquecer
jamais da promessa feita a milhões pelo colapso de uma das estruturas mais
hediondas já criadas por mãos humanas. O Muro de Berlim não caiu como um
celeiro velho, desgastado com o tempo. Ele foi derrubado. Seus ideais foram
derrubados. Suas ideias foram derrubadas, porque não funcionaram e porque
amordaçam o indivíduo e o progresso. Certamente, as consequências da liberdade
são desfrutadas hoje por mais europeus e mais pessoas em todo o mundo do que
nunca.
Muito está em jogo na próxima
eleição presidencial norte-americana. Muito mais do que apenas o caminhão de
mudança para a Casa Branca e o posto de homem mais poderoso do planeta. O que
vemos hoje no Partido Democrata — que parece favorável aos mesmos ideais
coletivistas que deram ao Muro de Berlim sua razão de ser — nos alerta para o
fato de que a liberdade ainda não venceu a batalha do crepúsculo. E nunca
vencerá se perdermos de vista a verdadeira natureza de seu adversário, um
demônio agora travestido de “justiça social”.
Título, Imagem e Texto: Ana
Paula Henkel, revista Oeste, 24-7-2020, 8h06
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