quinta-feira, 21 de março de 2013

Venezuela com a corda socialista no pescoço

Governo venezuelano, na iminência de um colapso econômico, inventa outra maxidesvalorização disfarçada da moeda.  
Francisco Vianna
O que está acontecendo com a Venezuela deve servir de aviso aos demais países da América do Sul e ao Brasil, inclusive.
O governo da Venezuela, reagindo ao risco de que o controle do câmbio estrito estivesse levando o país ao colapso econômico, disse ontem, terça-feira (19 de fevereiro) que vai leiloar dólares ‘para um seleto grupo de empresas’ para tentar contornar a severa escassez de produtos e o desabastecimento de alimentos e outros artigos de primeira necessidade que afeta diretamente a população. Todavia, dizem os analistas, a medida – que em si constitui uma desvalorização disfarçada – poderá revelar-se insuficiente.


O anúncio foi feito no momento em que uma sufocante seca de divisas levou o dólar no mercado negro a um preço quatro vezes maior do que a taxa de câmbio oficial de 6,30 bolívares por dólar, ou seja, algo em torno de 25 bolívares por dólar. Isso também ocorre há apenas cinco semanas depois que o governo de Caracas anunciou uma maxidesvalorização de 46,5% da moeda nacional frente ao dólar.
Economistas disseram que a nova proposta resultaria em uma desvalorização significativa em vista da imensa demanda reprimida por dólares, embora a proporção exata seja desconhecida, pois o governo venezuelano não anunciou o montante de dólares a ser ‘leiloado’.
"O que realmente tem sido feito nestes dois dias é apenas aumentar a incerteza, ao invés de esclarecer a mudança de imagem", disse Ricardo Villasmil, um professor da Universidade Católica Andrés Bello (UCAB) e do Instituto de Estudos de Gestão Avançada (IESA). "Não está claro como o sistema irá funcionar tanto em quantidades como em preços. Não se sabe quantos leilões serão feitos. Por isso, é difícil estimar qual seria o preço das moedas no novo esquema", disse ele.
O Ministro de Planejamento e Finanças, Jorge Giordani, anunciou que o governo vai iniciar o leilão de dólares a partir da próxima semana num mecanismo a ser posto em prática em paralelo com as vendas de moeda selecionadas feitas pela Comissão Estatal de Administração do Câmbio Externo, operando com uma taxa de câmbio ‘oficial’ de 6,30 bolívares por dólar.
Mas tais leilões não estarão abertos a todos. Só poderão participar as empresas registradas no Registro de Membros do Sistema de Gestão de Câmbio (RUSAD), programa acessível apenas aos membros das indústrias consideradas como “prioridades”.
Os leilões serão realizados pela administração superior do corpo da Moeda e do Banco Central da Venezuela, utilizando o mecanismo concebido pelo economista laureado com o Nobel, William Vickrey, que secretamente introduzirá ofertas concorrentes e o vencedor não paga o valor que ofereceu, mas o segundo maior lance vencido. A licitação será realizada com uma taxa mínima de 6,30 bolívares por dólar. O que está claro é que os dólares serão leiloados e vendidos a um preço muito mais elevado do que esse piso estabelecido.
"Haverá uma oferta limitada de divisas, que é um problema subjacente. Acontece que o dinheiro do petróleo não vai todo para os cofres públicos e grande parte é desviada ‘para outros usos’ e a PDVSA [a estatal petrolífera da Venezuela] recolhe poucas divisas ao Banco Central", disse Orlando Ochoa, professor de Economia. "Assim, com o fornecimento limitado, o que resulta adiante é uma fonte de grande acúmulo de moeda forte na mão de ‘terceiros’, fazendo com que o preço total da mercadoria atinja valores elevados. E isso pode ser interpretado como uma desvalorização secundária às importações", acrescentou Ochoa.
Disse ainda que parte da razão pela qual o leilão é aberto apenas a empresas registradas em RUSAD, é o de limitar as vendas a empresas estabelecidas para evitar exatamente que elas entrem no mercado de compra e venda dólares.
Trata-se de uma tentativa de combater o superfaturamento, mas parece ser um esforço tem poucas probabilidades de êxito, a vez que são precisamente as distorções criadas pelas restrições impostas pelo controle estatal do câmbio que geram os incentivos para que os dólares vendidos a baixo preço pelo governo terminem sendo revendidos a preços mais altos nos ‘mercados paralelos’. “Todo sistema de faturamento de controle do câmbio que vende algo a um preço muito menor do valor que vige em outro mercado encontrará os caminhos para vender esse algo a intermediários que os revenderão pelo preço que as pessoas se dispuserem a pagar”, disse Ochoa. “Estão lutando contra a corrente”, explicou.
O mecanismo de leilão de dólares substitui um sistema anterior em que ‘empresas autorizadas’ e ‘importadores’ obtinham a moeda oficial por meio da compra de títulos do governo feita em moeda estrangeira. O sistema de eliminação, que serviu cerca de 20 por cento das necessidades do mercado de câmbio, foi acompanhado por uma forte desvalorização da taxa de câmbio evoluindo de 4,30 para 6,30 por dólar, isso quando as pessoas já se mostram dispostas a pagar quatro vezes mais pela moeda americana.
Após a eliminação, muitas empresas começaram a enfrentar problemas de obtenção de moeda oficial e rendas e dólares que entram com a importação e matérias-primas, o que agravou ainda mais a falta de alguns artigos essenciais, como medicamentos, peças para máquinas e veículos, e alimentos.
Na Venezuela, o setor privado – que é tratado pela ‘Revolução Bolivariana’ como um inimigo hostil a ser subjugado – sofreu uma grave deterioração de sua produção ao longo dos últimos 14 anos e é hoje altamente dependente de importações para atender à demanda nacionais de muitos produtos, principalmente remédios e alimentos.
Quem tinha algum capital tratou de depositá-lo em segurança em outros países, principalmente na Colômbia, no Chile e no Brasil. Houve também uma saída em massa de profissionais qualificados e de mão-de-obra especializada. A PDVSA é a que mais se ressente disso, estando suas instalações em péssimas condições de manutenção por falta de pessoal qualificado para fazê-la. É o ‘socialismo del siglo XXI’ em plena ação. 
Nos últimos quatro meses, caiu bastante a entrada de dólares nos cofres do governo e com isso as divisas oficiais que os bancos de investimentos têm para aplicar no país ficou drasticamente reduzida, com os analistas atribuindo o fato à queda da arrecadação em dólares do governo e ao atraso na definição de novas políticas cambiais.
A escassez de dólares elevou muito a taxa de câmbio no ‘mercado negro’ – com a mídia proibida de sequer tocar nesse assunto – atingindo valores de mais de 24 bolívares por dólar, a mais alta da década, em meados do ano passado.
Título e Texto: Francisco Vianna, 20-03-2013

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