“Somos nosso passado. Somos
este quimérico museu de formas inconstantes; este amontoado de espelhos
partidos.”
Jorge Luís Borges
Maria Lucia Victor Barbosa
Para entender a América Latina
é preciso voltar no tempo como fiz em um dos meus livros, “América Latina – em
busca do paraíso”. Constatar, tomando emprestada a expressão do genial pensador
espanhol, José Ortega y Gasset, nossa “embriogenia defeituosa”. E, apesar das
diferenças entre a colônia portuguesa e as colônias espanholas entender que
origens coloniais fizeram igualmente de nós sociedades invertebradas.
Afinal não tivemos como na
“Espanha invertebrada” de Gasset “a comunidade de propósitos” que faz com que
grupos integrantes “convivam não por estar juntos, mas sim por fazer algo
juntos”. Ao mesmo tempo, nossas sociedades desiguais, o isolamento entre as
camadas sociais, a falta de “minorias seletas” que comandassem o processo
emancipatório, a inexistência do espírito associativo substituído pela vivência
do pequeno mundo familiar ou clânico gerarão o desequilíbrio estrutural cujas
manifestações mais graves até hoje sentidas são: o atraso econômico, a
mentalidade do atraso, o autoritarismo, o paternalismo, o clientelismo, o
nepotismo, o patrimonialismo e a corrupção endêmica.
No nosso subdesenvolvimento
político e econômico somos envolvidos por um sentimento estranho, a um tempo de
altivez e de inferioridade, sendo que preferimos descarregar nossa frustração
em possíveis culpados utilizando, inclusive, a equivocada fórmula que diz que
uns são pobres porque outros são ricos. Assim, culpamos especialmente os
Estados Unidos por nossas mazelas e fraquezas. Só nos esquecemos de perguntar o
que fizemos a nós mesmos.
Fatos recentes ocorridos em
nosso país e na América Latina demonstram que as características acima
apontadas permanecem, pois fazem parte de uma cultura plasmada ao longo dos
séculos. E aqui me refiro à cultura no sentido do complexo de valores, atitudes
e comportamentos.
Um desses fatos foi a visita
da corajosa dissidente cubana, Yoani Sanchez, que enfrenta a tirania dos irmãos
Castro pedindo liberdade e democracia para seu país. Isto tem um preço na Cuba
totalitária e Yoani o tem pagado com prisão e tortura. Entretanto, suas armas
não são as armas assassinas de Fidel Castro, mas palavras postadas no seu blog.
Pois bem, a mando do
embaixador de Cuba, Carlos Zamora Rodriguez, que contou com o apoio do governo
brasileiro, calunias e difamações foram divulgadas contra a moça pela REDEPT13.
Note-se que hipocritamente petistas costumam falar em direitos humanos e
democracia. Ao mesmo tempo, Yoani foi perseguida por grupelhos agressivos de
perfeitos idiotas brasileiros. Eles foram uma espécie de milícia fascista à
moda Mussolini e Chávez, e exerceram feroz intimidação que associa truculência,
ignorância, fanatismo.
Os jovens que ajudaram fazer
do Brasil um satélite de Cuba são portadores da mesma idiotice analisada por
Plinio Apuleyo de Mendoza, Carlos Alberto Montaner e Álvaro Vargas Llosa no
“Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano”. Essa “doença”, segundo Mario
Vargas Llosa, que fez a apresentação do livro, não é a congênita, mas tem outra
índole: “É postiça, deliberada e eleita, se adota conscientemente por preguiça
intelectual, modorra ética e oportunismo civil”. “É ideológica e política, mas
acima de tudo, frívola, pois revela a abdicação da faculdade de pensar por
conta própria”.
Outro fato marcante na América
Latina foi a morte de Hugo Chávez, típico tiranete populista latino-americano
que levou algum benefício aos pobres através de caridades oficiais, mas
destruiu a economia venezuelana. Chávez, ao se perpetuar no poder foi uma
fraude democrática. Ele subjugou o Legislativo, o Judiciário e o Exército,
impôs a censura dos meios de comunicação, perseguiu seus opositores de maneira
implacável. Até sua morte, que não se sabe quando ocorreu realmente foi
envolvida numa rocambolesca e misteriosa farsa a cargo do sucessor por Chávez
ungido para dar continuidade ao governo, Nicolás Maduro. Este mentiu o que
pode, inventou lorotas, falou em mumificação do chefe e ocupou o cargo de
presidente inconstitucionalmente. Agora está em campanha e certamente vai se
eleger para que Chávez continue a governar do além.
O PT deve ter uma ponta de
inveja do companheiro Chávez porque não conseguiu alcançar a radicalização
venezuelana. Porém, está a caminho. Dilma, a sucessora ungida por Lula é
presidente e candidata. Portanto, ela tem a caneta e os recursos materiais das
bondades, além do tempo que desejar na mídia. Um poder que os demais candidatos
não dispõem o que dificulta enfrentá-la.
Ah, sim, e pela primeira vez
foi eleito um Papa latino-americano. Dilma disse que ele é normal (?), e que
Deus é brasileiro. Desconfio que seja argentino, pois elegeu um Papa da
Argentina. Talvez, o diabo seja brasileiro, pois a presidente em campanha jurou
que vai fazer o diabo.
E assim vamos nós, sociedades
em busca de si mesmas, tão parecidas entre si por serem os fragmentos de um
espelho partido.
Título e Texto: Maria Lucia Victor Barbosa, Socióloga, 24-03-2013
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