João César das Neves
Celebrando os 40 anos do 25 de
Abril, é momento de avaliações a vários níveis. Questão interessante é
determinar a figura mais notável deste já longo período democrático.
Evidentemente ninguém foi imprescindível sozinho. Tão longa e complexa
construção deve-se a multidões de nomes. Mas alguns destacam-se sem
dificuldade. Essa escolha pode ser feita com diferentes pontos de vista, todos
informativos sobre a natureza do sistema.
Considerando a influência
nacional, a distinção cai em Aníbal
Cavaco Silva. Muitos não gostarão, mas a escolha é óbvia. Não só é a
personalidade que mais tempo esteve no topo do Estado, quase metade das quatro
décadas, mas foi de longe o primeiro-ministro com mandato mais longo, aliás no
período decisivo da adesão à Europa. O juízo histórico destes primeiros 40 anos
certamente o escolherá como a figura mais marcante na orientação da vida
nacional.Claro que não é preciso usar esse critério.
Tomando como norma a
longevidade, a escolha é Alberto João
Jardim, presidente do Governo Regional da Madeira ininterruptamente desde
17 de Março de 1978. Como numa democracia, o povo é soberano, as suas
sucessivas vitórias eleitorais fazem dele indiscutivelmente o mais bem-sucedido
de todos os políticos.
A este nível só duas
personalidades se comparam. A primeira é Marcelo
Rebelo de Sousa, sucessivamente eleito pelas audiências de jornais e
televisões como o analista mais influente do regime desde 1980.
A segunda é Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente
do Futebol Clube de Porto desde 5 de Agosto de 1982; o período é inferior, mas muita gente considera o FCP mais relevante
do que a Madeira.
Se considerarmos como
decisivos os anos da Revolução, quando se tomaram as opções cruciais para a
implantação do regime, então nenhum destes nomes é de considerar. Aí os
escolhidos têm de ser os dois homens que salvaram Portugal da guerra civil: Álvaro Cunhal e Costa Gomes. Parece evidente que eram eles quem detinha o poder nos
momentos centrais de 1975 e que, para proteger essa sua posição, a única forma
seria deflagrar um conflito.
Preferiram perder o poder a
perder o País, e por isso merecem uma referência e a nossa profunda gratidão.
Se por político mais notável
quisermos significar a figura mais paradoxal, a escolha cai sobre Mário Soares. Foi ele quem mais fez
para Portugal ser democrático, nos primeiros anos após a Revolução, e quem mais
fez para Portugal ser europeu nos anos seguintes. Mas também foi ele quem
depois, enquanto presidente da República, mais fez para prejudicar a adesão à
CEE, sabotando o Governo da época; nestes últimos anos, enquanto comentador,
mais tem feito para minar a democracia, apelando à revolta subversiva. Os dois
contributos iniciais garantiram-lhe um lugar na história e a suprema gratidão
nacional; os comportamentos posteriores opostos marcaram-no para sempre como um
mistério insondável.
No entanto, nenhum destes
nomes será o estadista superior, se o critério for o feito político mais
espantoso. Aí o vencedor incontestado é Francisco
Louçã, que conseguiu por duas vezes resultados absolutamente impossíveis. O
seu primeiro sucesso foi a unidade na turbulenta extrema-esquerda, criando o
Bloco de Esquerda em 1999 e liderando-o até 2012. Assim que saiu, o agrupamento
regressou à fragmentação original, revelando como admirável a coesão
intermédia, e como ela se devia ao seu génio de liderança. Mais formidável
ainda é o que ele tem conseguido desde que abandonou a política activa,
determinando de fora a dinâmica e a confusão dentro da oposição. As suas
iniciativas de contestação, agora como simples cidadão e professor, marcam a
única agenda dos combalidos socialistas e bloquistas.
Este caso revela também a
principal fragilidade da democracia após 40 anos: a inexistência de verdadeira
oposição. Quaisquer que sejam os partidos que a compõem, a oposição nunca se
preocupa com o País, mas apenas consigo mesma. A finalidade é regressar ao
poder, não ser realmente útil e patriótica. Mas sem oposição não há democracia.
Título e Texto: João
César das Neves, Diário de Notícias, 07-04-2014
Grifos: JP
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