Deixei passar uma semana. Da
entrevista do Durão Barroso no Expresso/SIC discutiu-se apenas na comunicação
social o disparate (wishful thinking?) do apoio tripartido a um candidato
presidencial e o episódio Vítor Constâncio, esse discutido com disparates.
Chegou-se ao ponto de anunciar
em manchete que Constâncio “desmentia Durão”, quando aquele apenas se refugiava
cobardemente num “não me recordo de ter sido chamado expressamente para falar
do caso BPN”, o que é muito diferente de “desmentir”, e o próprio confirmou
aliás ter sido objecto de conversas o caso BPN, ainda que numa fase de
suspeitas ou rumores, o que só evidencia e comprova que os rumores e suspeitas
existiam na altura, ainda que não demonstradas, e que esses rumores e
suspeições eram do conhecimento do supervisor. Mas a comunicação social não
conseguiu ver estas evidências.
Como não viu ou não ligou ou
não quis ver ou não quis ligar à informação, que não é original mas devia estar
sempre presente na mente de todos os portugueses, de que, à época da
intervenção da troika, Portugal tinha em caixa cerca de 300 milhões de euros,
quando poucos dias depois teria de amortizar 4,5 mil milhões de euros de dívida,
numa altura em que ninguém nos emprestava dinheiro ou só o fazia a juros
superiores a 10%. E, claro, de pagar as suas continhas do dia-a-dia, salários e
pensões, fornecedores e outros, ainda que muita coisa fosse na altura varrida
para debaixo do tapete.
A mesma altura em que Trichet,
em pânico, se queixava de em Portugal haver um “primeiro-ministro que ninguém
parecia capaz de chamar à razão” (in RESGATADOS, de David Dinis e Hugo Filipe
Carvalho, onde se podem confirmar os números do parágrafo anterior).
Essa nota (repito, não era
novidade nem informação mas nem toda a gente sabe e deve estar sempre presente
na nossa mente) passou despercebida à comunicação social. Parece que Sócrates
(ou alguém a seu mando) veio dizer que não eram só 300 milhões mas sim 800, sem
perceber o ridículo da precisão (se disso se tratava). 300 ou 800 milhões, para
as necessidades do Estado dias depois, é a mesma coisa: bancarrota.
As desculpas ou justificações
de Sócrates e de Constâncio às respectivas referências, cada qual com a sua
gravidade, apenas evidenciam a realidade dos factos e a culpabilidade dos
autores mas isso a comunicação social não quis ver. E se no caso de Constâncio
ainda tentou lavar e branquear, no de Sócrates nem quis discutir.
Está bem que o país se queira
de brandos costumes, que seja um país pequeno onde todos se conhecem, que seja
bonito perdoar, mas não nos devemos esquecer que houve um doido varrido que
levou o país à bancarrota, que deixou esgotarem-se todas as reservas, que
espatifou qualquer mínimo de confiança nos mercados que nos pudesse apoiar, que
deixou nos cofres do Estado teias de aranha e dívidas para pagar, a juros
elevadíssimos, e uma crise gravíssima que estamos a sofrer e a pagar. O mesmo
tipo que se passeia em executiva entre Paris e os estúdios da RTP a lançar
bitaites para o ar com a real serenidade dos tolos, como tolos são os que ainda
o ouvem. Sobre este realíssimo e alternadíssimo tolo, que aqui nos conduziu,
que a Europa via como doido incapaz de ser trazido à razão, de quem Portugal
sente na pele a miserável gestão, a comunicação social não quis discutir. A
comunicação social é muito amiga.
Título e Texto: Vasco
Lobo Xavier, Corta-fitas,
07-04-2014
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