Humberto Pinho da Silva
Conheci-o na antiga Escola
Académica [foto], no Porto, onde fui parar após ter sido o melhor aluno da
turma no “Alexandre”.
O Manel era um adolescente,
franzino, elegante, de estatura meã. Tinha rosto moreno, e na boca permanente
sorriso gaiato e camarada.
Certa manhã, manhã doirada,
marchetada a tons rosáceos, estava a caminhar no gracioso jardim, fronteiro ao
edifício da escola, quando vi o Manel, a conversar, animadamente, com colegas.
Falavam do Porto e de figuras portuenses.
Pé ante pé, avizinhei-me, e
intervi na acalorada conversa.
Olharam-me surpreendidos; mas
ele, escutou-me com muito atento e interesse, mormente, quando comecei, a
determinado passo, a citar o Conde d’Aurora.
Em breve seríamos
inseparáveis. Raro era o dia, que não trocássemos confidências. Contava-me, com
graça - era excelente conversador, - as aventuras do pai, que adorava; e as “
diabruras” da irmã - menina encantadora e meiga, segundo dizia.
Uma tarde, por sinal chuvosa,
mostrou-me sebenta escolar, onde esboçara, a lápis, complicada mecânica, de
carro movido a água. Tinha sido a sua última invenção…
Debatemos o funcionamento da
engenhoca, recorrendo aos parcos conhecimentos de física e química que
tínhamos.
Nos longos passeios que
dávamos falava-me de mundo, que não conhecia: de Bento de Amorim, e seu famoso
automóvel; do Conde de Campo Belo; de Sousa Guedes; de Alberto Pinheiro Torres;
Condes de Alpendurada; Magalhães Bastos…; e de amigos e amigas do high-life.
Havia duas meninas, que não
saíam dos seus olhos: uma, vivia na Avenida Rodrigues de Freitas; outra, perto
do antigo liceu “Carolina”. Mas, os olhos brilhavam de júbilo ao referir-se à
última. Seria namorada? Não sei… Certamente era…
Semanalmente, realizávamos
curiosas e instrutivas excursões pelas velhas e típicas ruas e ruelas do velho
Porto. Nessa recuada época, alguns bairros estavam infectados de fartum
enjoativo, bafiento, que nos obrigava a estugar o passo.
Juntos, calcorreávamos locais
pitorescos da cidade. Não havia monumento, museu ou jardim, que não fosse
visitado e apreciado, por todos os ângulos…
A vida militar separou-nos.
Ainda recebi correspondência da Guiné; mas, por motivos que desconheço,
cessaram os aerogramas…
Os anos passaram… Passou,
também, a juventude…
Encontrei-o, mais tarde, já
casado. Era o mesmo Manel, alegre e folgazão; mas, os olhos, brilhavam, agora,
de tristeza e desânimo.
Ainda demos um passeio pela
baixa gaiense. Visitamos a igreja de Santa Marinha [foto], e armazéns de vinhos; e
recordamos, com terna e profunda saudade, os felizes tempos, do passado, já
longínquo…
Na despedida ficou de me
telefonar…
Soube, pouco depois, que
falecera. Desaparecera, assim, o meu melhor amigo da juventude… Nunca mais tive
amizade como a dele…
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva
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