John Wolf
Esta história dos ajustes
directos, das contratações de artistas no panorama cultural nacional, faz parte
da mesma patologia de prevaricação e promiscuidade que minou o sector da banca
e a política. Deixemo-nos de ilusões. O tráfico de influências, os favores
prestados enquanto divisa para futuras transacções, faz tanto parte da política
como das artes e letras. A novela do Tordo deve servir para abrir a caixa de Pandora.
Uma vez que o país está
obrigado a pôr tudo em pratos limpos, uma auditoria total e irredutível é o que
cidadão português deve exigir. O contribuinte que anos a fio contribuiu para as
extravagâncias decididas por autarcas, presidentes de institutos e ministros da
cultura merece saber toda a verdade. O dinheiro dos contribuintes foi gerido de
um modo equilibrado ou não? Houve favorecimentos? E foram prestadas contas? Os
mesmos doutos e iluminados que agora se queixam do atraso cultural do país,
acabam por morder a sua própria cauda. Ao declararem o seu estatuto de alegada
elite confirmam que foram incapazes de servir a massa amorfa e inculta. Foram
incompetentes na sua missão de partilha de cultura. Ou seja, o círculo
iluminado de intelectuais é a cidade e o resto é paisagem.
Que se avance com uma
auditoria das contas da cultura nos últimos quarenta anos. Seria simpático
saber que critérios intelectuais ou culturais foram usados. Que artistas
beneficiaram do encosto de ombros ideológicos ou partidários. Parece pairar em
Portugal um certa noção que os criadores artísticos devem ser poupadas porque é
tudo tão subjectivo, é tudo tão volátil e relativo. Como se fossem intocáveis.
Passemos então de Tordos a Represas, de Instituto Camões a Planos Nacionais de
Leitura, de fundações disto e aquilo, de grémios a teatros,
de criadores a marionetas, e, em nome da transparência, que afinal uma
Democracia exige, façamos as contas dos dinheiros gastos e tiremos as devidas
ilações.
Não vejo razão para que o sector das artes e
letras beneficie de um estatuto de imunidade ou impunidade. Já se sente no ar
algum desconforto dos principais agentes culturais deste país. Começam a
ripostar, a se tornar hostis à luz de um conceito de averiguação que lentamente
começa a emergir e a implicá-los. Se é tudo tão límpido quanto aparentam, então
que se apresentem sem medo - quem não deve não teme. Não é assim?
Título, Imagem e Texto: John Wolf, “Estado-Sentido”,
01-02-2014
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