J. R. Guzzo
Todas as vezes que um
ministro, ou alguma outra figura de destaque sai do governo, a mídia publica as
suas relações de “quem perdeu” e de “quem ganhou”. É coisa garantida: um leitor
brasileiro padrão, numa estimativa não científica, mas razoavelmente realista,
lê em média uns 500 artigos como esse ao longo de sua vida útil. Fazer o que?
Como as crianças, que gostam de ouvir sempre a mesma história, jornalistas
gostam de escrever sempre a mesma matéria. Não há sinais de que possa ser
descoberta alguma vacina eficaz contra essa doença. Muito mais do que da
malícia, que sempre pode ser tratada com sermões em favor da moral, ela é fruto
da preguiça – e para isso, como se sabe, não existe cura. Resumo da ópera: até
prova em contrário, os nossos comunicadores continuarão a servir por tempo
indeterminado essa conversa do “perde-ganha” ao público pagante.
É uma perfeita inutilidade,
pois quem sempre perde, em toda a trovoada que acontece nos governos deste
país, é a população brasileira. É como índio em filme americano de faroeste –
não ganha uma. Acaba de acontecer de novo, com a demissão do empresário Salim
Mattar [foto] das funções que exercia como coordenador central do programa de
desestatização do governo. Salim, após um ano e meio de tentativas, chegou à
conclusão de que não vinha mais ao caso continuar tentando privatizar alguma
coisa – a imensa maioria dos que dão ordens na máquina pública, em qualquer
nível de qualquer dos Três Poderes, não quer desestatizar nada. Seja feita,
então, a sua vontade. Se pudessem, criariam mais estatais ainda; se não der,
vão continuar impedindo a venda ou eliminação de qualquer uma das que existem.
Por que os donos do Brasil
fariam algo diferente? A única razão pela qual as estatais existem é para
servir aos seus interesses, e aos interesses dos seus clientes; não vão largar
esse osso. Ao mesmo tempo, não é preciso ler nenhum jornal ou assistir ao
noticiário do horário nobre para saber quem quebra a cara nessa história: o
cidadão que está pagando cada centavo gasto para sustentar uma Eletrobras, por
exemplo, ou para repor o dinheiro que foi roubado dos fundos de pensão das
estatais durante os governos de Lula e de Dilma Rousseff.
Na próxima vez que você entrar
num posto de gasolina, ligar o celular ou pagar sua conta de luz lembre-se para
onde está indo o dinheiro do imposto que lhe arrancam em cada uma dessas
despesas. Querendo caprichar um pouco mais, pense que além das Eletrobras da
vida você paga todos os dias para manter viva a empresa do “Trem Bala” – isso
mesmo, do “Trem Bala”. Jamais ouve trem bala nenhum, nem haverá, mas a empresa
criada para cuidar dele continua existindo até hoje. Então: quem é mesmo que
está perdendo com a saída de Salim Mattar do governo?
Título e Texto: J. R. Guzzo,
publicado na Gazeta do Povo em 13-8-2020, via revista Oeste, 14-8-2020
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