O jovem poeta ucraniano
Taras Malkovich fala das manifestações contra Yanukovych, as verdadeiras
relações de força que operam no seu país e o papel fundamental atualmente
desempenhado por Vitali Klitschko.
Hans-Peter Kunisch
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Durante uma manifestação em Lviv, no oeste da Ucrânia, a 1 de dezembro,
foto: AFP
A propósito, já lhe contei a verdadeira origem dos episódios de violência que se deram nos protestos contra Yanukovych? Não? É importante que fique bem esclarecido. Porque tudo, hoje, tem a ver com isso. Queremos derrubar o chefe de Estado, mas somos pacíficos.” Nascido em 1988, em Kiev, onde mora, Taras Malkovich é um jovem poeta ucraniano, atualmente bolseiro da [associação cultural internacional] Villa Decius, em Cracóvia. Em breve, vai para Nova Iorque, com o pai, Ivan, também ele poeta, um dos mais importantes da Ucrânia.
Mas o que preocupa
principalmente Tara Malkovich, hoje, é o destino do seu país. Há poucos dias,
houve um encontro de escritores, integrado numa manifestação na Praça da Independência, em Kiev. Perante 50 mil espetadores, Taras Malkovich
apresentou o seu mais recente poema. É sobre a história de uma família de
carrascos, que oficia há várias gerações. Mas eis que o mais novinho se desvia
da linha familiar. O filho do carrasco não brinca sequer às lutas com os filhos
do vizinho e não suporta ver sangue. O pai tenta, por todos os meios possíveis,
puxá-lo para o bom caminho.
Língua supérflua
O que a Rússia representa
para nós: a permanência do status quo
“Estava extremamente nervoso,
por me encontrar diante de tantas pessoas. Mas quando disse, a concluir, que
não devíamos esquecer que não estávamos num convívio social, mas numa
‘revolução’, a multidão exultou. Até pessoas pouco politizadas percebem,
finalmente, o que a Rússia representa para nós: a permanência do status
quo, simples alternância de períodos de opressão e de submissão da Ucrânia
sob diversas formas. Muitos aperceberam-se disso em 21 de novembro, no dia da primeira vaga sangrenta de repressão das
manifestações. Mas já era evidente há muito tempo. O campo pró-russo não o
esconde, sequer.”
Culturalmente, basta ver a
atitude de Dimitri Tabachnik, o ministro da Educação e Ensino. “Durante a sua
volta à Ucrânia, neste verão, deu uma entrevista em que explicou textualmente
que o ucraniano é ‘uma língua supérflua’. E é isto um ministro da Educação da
Ucrânia?”
No entanto, para Taras
Malkovich, o verdadeiro perigo vem de outro lado: o empresário Viktor
Medvetchuk, que há décadas influencia a política ucraniana, apesar de se manter
nos bastidores há alguns anos. Quando Vladimir Putin visitou a Ucrânia, neste
verão, esteve apenas um quarto de hora com Yanukovych e muito mais com
Medvetchuk, a quem por aqui chamam o Cardeal ou o Padrinho. Aliás, Putin é
padrinho da sua filha, são compadres.
“Medvetchuk já era conhecido
do mundo literário antes do meu nascimento”, explica Taras Malkovich. Em 1980,
jovem advogado, Medvetchuk foi nomeado defensor do poeta ucraniano,
politicamente empenhado, Vasil Stus (nascido em 1938), num processo que lhe
moveram. Quarenta anos depois de Varlam Chalamov, Stus seria enviado para
um gulag siberiano perto de Magadan, onde morreu na sequência
de uma greve de fome, em 1985. “Ele fez tudo para Stus ser condenado à morte.”
Viktor Medvetchuk, que não
seria melhor do que Yanukovych no poder, tem uma esposa que condiz com o seu
caráter. É a apresentadora de televisão Oksana Marchenko, de 30 anos, que anima
programas como a versão ucraniana de “Dança com as estrelas”. “Durante a
dispersão de manifestações pacíficas, homens da berkut – as
forças especiais do regime, conhecidas pela sua brutalidade – saíram de uma
carrinha com o logótipo do programa. É difícil acreditar em simples ironia do
destino”, conta Taras Malkovich.
Símbolo de união
É durante períodos de
instabilidade política, marcados pela manipulação da informação, que o
princípio de independência da literatura se manifesta em toda a sua
importância. O conceito de “literatura comprometida”, que há muito é desdenhado
no Ocidente, assume aqui pleno significado. Desde que chegou às ruas tranquilas
de Cracóvia, Taras Malkovich, que já traduziu uma antologia de poesia
irlandesa, bem como poemas alemães de Heine, Goethe e Brecht, só pensa numa
coisa: regressar a Kiev para apoiar os amigos.
“Um deles telefonou-me às
quatro da manhã da catedral de São Miguel, onde se refugiou com outros feridos.
Mas talvez eu possa atuar daqui e garantir que o resto do mundo não seja
inundado com mentiras. Durante a semana de 30 de novembro a 3 de dezembro, o
Procurador-Geral da Ucrânia recebeu 53 queixas contra manifestantes pacíficos,
alguns dos quais estavam hospitalizados por terem atacado os vândalos
recrutados para provocar a berkut e desaparecer. Não muito
longe desses arruaceiros pagos, havia muitas vezes uma câmara de televisão
russa, para exibir a brutalidade dos manifestantes.”
Para Taras Malkovich, não se
pode subestimar a importância fulcral de Vitali Klitschko para a Ucrânia.
“Ainda não chegámos ao ponto em que podemos escolher qualquer um para nosso
líder. O que mais causa impressão é ver Klitschko pegar num ‘hooligan’ pelo
colarinho, durante uma manifestação, e pedir explicações. Um democrata convicto
é o melhor símbolo de união de que dispomos.”
Hans-Peter Kunisch, PressEurope, 06-12-2013
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