A calamidade nacional
tornou-se numa espécie de verdade bíblica e quem tente transmitir uma versão
menos fatalista da realidade é imediatamente colado às forças infernais da
propaganda. Tudo o que não seja idêntico ao que dizem os acrobatas da opinião
será, na melhor das hipóteses, ignorado. A comunicação social habituou-se aos
tons sombrios, pelo que uma boa notícia vem geralmente na sua versão negativa
ou na mais confusa possível.
E, no entanto, é provável que
no próximo ano se verifique ligeiro crescimento económico, provavelmente até
criação de emprego. A economia deixou de cair na segunda metade de 2013 e a
maior incerteza estará no ritmo da recuperação. O programa de ajustamento
termina em Junho e o FMI sairá das nossas vidas (sem deixar saudades), mas tudo
aponta para a negociação de um programa cautelar suportado pelos europeus,
envolvendo um empréstimo de 16 mil milhões de euros durante um ano, dinheiro
que pode ou não ser utilizado.
Julgo que 2014 será lembrado como o ano em que a crise acabou.
Isso significa que Portugal
regressará aos mercados, com parte das reformas estruturais feitas e a economia
mais competitiva. Os fundos europeus darão impulso adicional à recuperação.
Depois do mito da espiral recessiva, começa a diluir-se também o mito da
necessidade de reestruturar a dívida, pelo menos em conflito com os credores.
Assim, as maiores incógnitas serão políticas: até que ponto haverá novos
chumbos do Tribunal Constitucional e até que ponto sobreviverá um governo que
revela sinais de grande fragilidade e que perdeu o alento reformista?
Nestes três anos tão difíceis,
os sacrifícios dos portugueses foram mal distribuídos, mas o facto é que
começamos a sair da crise, embora ainda de forma vacilante. Em 2014, o País
entrará numa nova fase, sem programa de ajustamento, mas forçado pelas
circunstâncias (e pelos tratados europeus) a cumprir regras de rigor
orçamental. Os futuros governos terão a obrigação de equilibrar as contas
públicas, o que significa que será sempre nítido o dilema entre contenção na
despesa ou impostos elevados.
Título e Texto: Luís Naves, O Fragmentário,
27-12-2013
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