Estudo produzido por advogado e pesquisador descreve as principais táticas utilizadas por Moraes para perseguir adversários
David Agape
Por meio de investigações
sigilosas, como o Inquérito das Fake News, que em breve completará seis anos,
Moraes tem atuado simultaneamente como investigador, acusador e juiz,
desfigurando princípios fundamentais do devido processo legal. Essas
investigações — sem prazo definido e sem delimitação clara de alvos —
tornaram-se instrumentos de controle político, permitindo que críticos do
governo e opositores ideológicos sejam monitorados, censurados e até presos sem
o devido amparo legal.
Dessa forma, o nome de
Alexandre de Moraes tornou-se sinônimo de autoritarismo, perseguição judicial e
censura. No entanto, a sua atuação poderia ser definida por um conceito mais
preciso: lawfare — o uso do direito como arma política para
deslegitimar, perseguir ou aniquilar adversários políticos.
Essa é a conclusão do advogado
e pesquisador Enio Viterbo, mestre em história pela Universidade Salgado de
Oliveira, doutor em História pela Universidade de Lisboa e especialista em
direito constitucional e político. Em um estudo publicado
recentemente na Revista Brasileira de Estudos Políticos, da UFMG,
intitulado Moraes Damages (em português “Danos Moraes"),
Viterbo detalha como o ministro instrumentalizou o uso do direito como
ferramenta de coerção, expandindo suas prerrogativas para atingir opositores
políticos e ideológicos, transformando inquéritos sigilosos e sem controle
externo em instrumentos de repressão.
O termo lawfare ganhou destaque no Brasil especialmente durante os processos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Seus advogados, incluindo Cristiano Zanin, atual ministro do STF, difundira a tese de que as acusações contra Lula na Operação Lava Jato representavam um caso de lawfare, em que o sistema legal era manipulado para fins políticos. Na época, o então juiz Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, foram acusados de colaborar de maneira inadequada para condenar Lula, com o objetivo de impedir sua candidatura nas eleições de 2018.
Essas alegações foram
reforçadas por vazamentos de mensagens privadas, conhecidos como Vaza Jato, que
sugeriram uma possível parcialidade nos processos judiciais. O conteúdo dessas
mensagens foi utilizado para fundamentar decisões do STF que anularam as condenações
de Lula, sob a justificativa de que Moro agiu com suspeição eparcialidade. No entanto, as decisões não o inocentaram das acusações, mas sim anularam os processos, permitindo que
ele recuperasse seus direitos políticos e concorresse à presidência em 2022.
No livro "Lawfare: Waging War Through Law" (Nova Iorque, Routledge, 2021, 110 p.),
coatutorado por Zanin, é argumentado que o lawfare vai além da
aplicação seletiva do direito, e envolve um conjunto de táticas organizadas
para consolidar um aparato persecutório sob a justificativa de proteção
institucional. Segundo Viterbo, embora o debate sobre lawfare tenha
perdido força após a anulação dos processos contra Lula, sua aplicação segue
evidente — agora, com novos alvos.
A pesquisa identifica seis
estratégias recorrentes na atuação de Moraes:
1.
Indústria das multas impagáveis;
2.
Assistentes de acusação ilegais;
3.
Ataques aos advogados;
4.
Falta de transparência;
5.
Competência universal;
6.
Censura.
1. Indústria das multas
impagáveis
Segundo Viterbo, uma das
principais ferramentas de coerção utilizadas por Moraes é a aplicação de multas
desproporcionais e, na prática, irrecorríveis. Os valores elevados inviabilizam
a contestação judicial e funcionam como um instrumento de intimidação.
A revista Crusoé foi uma das
primeiras vítimas dessa estratégia. No início do Inquérito das Fake News, foi multada em R$ 100 mil mesmo após cumprir a ordem judicial que
determinava a remoção de uma matéria sobre o ministro Dias Toffoli.
Posteriormente, as multas passaram a atingir grandes plataformas de tecnologia.
O Telegram foi punido em R$ 1,2 milhão por não remover conteúdos do deputado Nikolas
Ferreira. Já o X (antigo Twitter) pagou quase R$ 30 milhões em multas para conseguir o desbloqueio da rede
social no Brasil.
Durante o bloqueio do X, entre
agosto e outubro de 2024, houve uma decisão ainda mais drástica com a proibição
do uso de VPNs para acessar a plataforma, atingindo diretamente cidadãos
comuns. Moraes determinou uma multa de R$ 50 mil por dia para qualquer usuário que fosse flagrado
utilizando VPN para burlar o bloqueio e acessar o X. Além de impor uma multa
diária 30 vezes maior que o salário mínimo mensal do brasileiro, a medida
ilegal e desproporcional criminalizou uma ferramenta amplamente utilizada para
proteção da privacidade na internet.
O Partido Liberal (PL) também
foi alvo dessa estratégia. Durante as eleições de 2022, o partido apresentou um
relatório técnico apontando irregularidades nas urnas eletrônicas. A resposta
de Moraes foi uma multa de R$ 22,9 milhões, acompanhada do bloqueio do Fundo Partidário,
impossibilitando o funcionamento financeiro da sigla. O pedido de parcelamento
foi negado, com a justificativa de que a punição deveria ter um "efeito
pedagógico".
De acordo Viterbo, as multas
são aplicadas de forma generalizada e sem critérios claros, atingindo desde
grandes empresas de tecnologia até cidadãos comuns, como jornalistas e
profissionais liberais. A lógica da punição excessiva gera um efeito direto: a
autocensura e o medo de contestar decisões judiciais, criando um ambiente de
repressão institucional onde a liberdade de expressão e a defesa de direitos
fundamentais são constantemente ameaçadas.
2. Utilização de
assistentes de acusação ilegais
Outro elemento essencial desse
modelo de lawfare é a aceitação de petições de terceiros sem
legitimidade processual para atuar nos inquéritos. Quando a Procuradoria-Geral
da República (PGR) se recusava a acatar certas demandas, o ministro permitia
que figuras políticas, como o senador Randolfe Rodrigues (ex-PSOL, agora PT),
assumissem informalmente o papel de acusadores.
Em um dos casos mais
emblemáticos, Randolfe peticionou para que a Presidência da República prestasse
esclarecimentos sobre a atuação de Carlos Bolsonaro em uma viagem oficial.
Mesmo sem qualquer relação formal com o inquérito, Moraes acolheu o pedido e determinou providências, abrindo um precedente jurídico
contestável. Essa tática permite que atores políticos utilizem o STF como
ferramenta de perseguição a adversários, ignorando os ritos processuais
tradicionais e ampliando a influência de agentes externos nos inquéritos.
Um outro caso semelhante que
noticiamos em A Investigação é o da jornalista e linguista
Letícia Sallorenzo, conhecida como "A Bruxa", que atuou informalmente nos trabalhos conduzidos por Moraes. Apesar de não
possuir qualquer cargo oficial no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ela se
apresentava como "colaboradora informal" do órgão e mantinha
interação direta com assessores do ministro.
Mensagens reveladas por Glenn
Greenwald e Fábio Serapião na Folha de S.Paulo, mostram que Letícia
exercia influência sobre decisões relacionadas à censura e remoção de conteúdos
críticos ao STF e ao TSE. Fontes internas do tribunal afirmam que ela
encaminhava dossiês sobre críticos de Alexandre de Moraes e pressionava
diretamente a equipe do ministro para que determinados perfis e postagens
fossem derrubados das redes sociais.
Letícia é a responsável por
espalhar no brasil a tese de firehosing (estratégia de
inundação informacional) que serviu de base para toda a narrativa do golpe de Estado construída pela
Polícia Federal. O conceito foi criado pela RAND Corporation, um think
tank americano financiado por agências governamentais dos Estados
Unidos, incluindo o Departamento de Defesa.
3. Ataques à advocacia e
restrição de prerrogativas
Para Viterbo, o exercício da
advocacia tornou-se um desafio sem precedentes em inquéritos sob a relatoria de
Alexandre de Moraes. Relatos de advogados barrados no acesso a processos,
impedidos de visitar clientes presos e até mesmo multados por exercerem sua
função tornaram-se cada vez mais recorrentes. Entre os casos mais emblemáticos está o do advogado Paulo Faria, defensor do
ex-deputado Daniel Silveira.
Faria foi multado duas vezes, em R$ 10 mil e R$ 2 mil, simplesmente por
recorrer de decisões judiciais, um direito básico da defesa. Posteriormente, ao
solicitar acesso aos autos e conversão de processos físicos para digitais,
recebeu novas ameaças de sanção por "litigância de má-fé". Segundo
Faria, Moraes “age nos bastidores para intimidar, coagir e ameaçar partes e
advogados”.
Os ataques à advocacia também
se manifestaram na imposição de restrições ao contato entre presos e seus
defensores. No caso de Roberto Jefferson, o ministro Alexandre de Moraes
determinou, inicialmente, limitações severas às visitas na prisão, exigindo autorização
prévia até mesmo para advogados, o que gerou fortes críticas. A restrição foi
interpretada como uma violação direta ao Estatuto da Advocacia e à Constituição
Federal, que proíbe a incomunicabilidade de presos, mesmo em situações
excepcionais como o estado de defesa. Diante da repercussão negativa, Moraes
reviu sua decisão.
Além das restrições no contato com clientes, advogados enfrentam obstáculos no acesso aos autos dos
inquéritos. Moraes determinou que processos específicos tramitassem
fisicamente, dificultando que defensores de fora de Brasília pudessem
acompanhar os casos. Mesmo quando a habilitação era concedida, havia atrasos
injustificados para permitir a consulta aos documentos, tornando praticamente
impossível a defesa técnica adequada. Em alguns casos, advogados só tiveram
acesso aos autos meses depois de solicitá-los, violando o princípio do devido
processo legal.
As investigações conduzidas
pelo STF também demonstram uma violação flagrante do sigilo profissional. No
inquérito sobre supostos ataques à família do ministro em Roma, o delegado da
Polícia Federal Hiroshi de Araújo Sakaki anexou ao processo transcrições de
conversas privadas entre advogados e seus clientes, um expediente que atenta
contra a confidencialidade garantida pela lei. Além disso, há casos de
advogados impedidos de realizar sustentações orais no STF ou com tempo de fala
reduzido de forma arbitrária, prejudicando diretamente seus clientes.
Embora não haja, até o
momento, registro de qualquer providência significativa tomada pela Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB), mostrando que a Ordem se mantém omissa diante das
arbitrariedades do STF, a entidade tem recebido diversas denúncias sobre a atuação
de Moraes. Paulo Faria formalizou quatro denúncias na OAB contra a conduta do
ministro.
Em agosto de 2024, o advogado
Ezequiel Sousa Silveira registrou uma denúncia na Ouvidoria-Geral do Conselho Federal da OAB apontando
uso abusivo e ilegal do aparato estatal pelo ministro Alexandre de Moraes e
seus auxiliares no STF e no TSE para perseguir adversários políticos. A
denúncia cita violações da Lei de Abuso de Autoridade (Lei nº 13.869/2019) e
crimes de responsabilidade previstos na Lei 1079/50, requerendo intervenção do
Ministério Público, do Senado Federal e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
para a abertura de procedimentos contra Moraes e seus juízes auxiliares. Segundo
Silveira, até hoje não houve retorno da OAB.
Os abusos contra a advocacia e
a interferência do Judiciário na defesa são características comuns em regimes
autoritários, onde o Estado usa seu aparato para inviabilizar o contraditório.
A postura de Moraes, ao mesmo tempo em que fragiliza garantias processuais,
contribui para consolidar um ambiente de medo entre advogados, jornalistas e
cidadãos que ousam questionar suas decisões.
4. Falta de transparência
Outro mecanismo utilizado pelo
ministro Alexandre de Moraes para restringir o direito à defesa é a dificuldade
de acesso aos autos dos inquéritos, criando um ambiente de total falta de
transparência processual. O Inquérito das Fake News (4781/DF), por exemplo,
tramita fisicamente, uma escolha incomum e sem justificativa técnica, que impõe
um ônus excessivo aos advogados, especialmente àqueles que não residem em
Brasília. Sem acesso digital, defensores precisam viajar constantemente até a
capital para consultar os autos, tornando o trabalho da defesa mais caro,
burocrático e ineficiente.
Além disso, mesmo para aqueles
que conseguem estar fisicamente no STF, o acesso não é garantido. Moraes exige
que os advogados passem por um procedimento de "habilitação", que
consiste na análise prévia e subjetiva sobre quem pode ou não acessar os autos.
Esse processo, em um inquérito que já ultrapassa seis anos e soma milhares de
páginas, é demorado e serve como barreira quase intransponível à defesa. Na
prática, advogados são impedidos de atuar enquanto aguardam a liberação,
ficando à mercê de decisões monocráticas do ministro.
A Procuradoria-Geral da
República (PGR) também já denunciou a falta de transparência no inquérito das
Fake News, argumentando que o modelo adotado por Moraes viola o devido processo
legal. O inquérito foi instaurado de ofício pelo STF, sem provocação do Ministério
Público, e conduzido sem a participação efetiva da PGR, o que compromete a
imparcialidade das investigações. Essa concentração de poderes em um único
magistrado vai contra os princípios constitucionais do juiz natural e cria um
sistema no qual Moraes atua simultaneamente como investigador, acusador e
julgador.
A falta de sorteio para a
relatoria dos inquéritos também foi criticada por especialistas, já que permite
que Moraes se autodesigne para conduzir processos de alto impacto político sem
qualquer critério objetivo. Isso contraria normas processuais que garantem a
imparcialidade do julgador e ampliam o risco de perseguições jurídicas
seletivas.
Mesmo frente a reiteradas
queixas de advogados, Moraes tem ignorado a Súmula Vinculante nº 14 do STF, que
garante acesso irrestrito aos autos para advogados habilitados. A recusa de
acesso aos processos impossibilita a elaboração de estratégias de defesa e
deixa investigados em um limbo jurídico indefensável.
A manutenção dessas barreiras
processuais reforça o caráter arbitrário e autoritário dos inquéritos
conduzidos por Moraes. A ausência de transparência, o impedimento do exercício
da advocacia e a centralização de poder consolidam um modelo de repressão institucional,
onde a justiça se torna instrumento de perseguição política.
5. Competência universal
A ampliação da jurisdição do
Supremo Tribunal Federal sob a relatoria de Alexandre de Moraes gerou o que
especialistas passaram a chamar de "competência universal". O
ministro, que deveria atuar dentro dos limites estabelecidos pela Constituição,
passou a conduzir investigações que extrapolam o escopo tradicional da Corte,
incluindo cidadãos sem foro privilegiado, empresários, militares, parlamentares
e até figuras internacionais, como Elon Musk. A justificativa para essa
expansão sempre recai sobre uma suposta "conexão" entre diferentes
inquéritos, permitindo que qualquer indivíduo ou entidade se torne alvo das
investigações conduzidas pelo ministro.
Essa prática tem consequências
diretas no sistema jurídico brasileiro, uma vez que o STF, como instância
máxima do Judiciário, não deveria ser a primeira a julgar pessoas comuns. No
entanto, ao atrair processos que normalmente estariam na primeira instância,
Moraes inviabiliza a possibilidade de recursos e de um devido processo legal
equilibrado, já que suas decisões se tornam definitivas sem possibilidade de
revisão por tribunais inferiores.
Um outro exemplo dos impactos
dessa ampliação de competência é o caso de presos do 8 de Janeiro que tiveram
habeas corpus negado sob a justificativa de que não cabe esse tipo de
questionamento contra decisões individuais de ministros do STF. O próprio Supremo
firmou um entendimento, baseado na Súmula nº 606, de que não cabe habeas corpus
contra atos de seus ministros, tornando qualquer contestação praticamente
impossível. Na prática, isso significa que um cidadão comum pode ser
investigado, processado e ter sua liberdade restringida diretamente pelo STF
sem acesso a recursos em instâncias inferiores.
Mesmo dentro do próprio STF,
recorrer dessas decisões é quase impossível. O ministro que decide sozinho um
caso também tem o poder de barrar qualquer tentativa de recurso, impedindo que
o assunto seja analisado pelos demais ministros. O único caminho seria recorrer
ao próprio Alexandre de Moraes, que dificilmente mudaria a própria decisão. Com
isso, cria-se um sistema onde um único magistrado pode decretar prisões e
restrições sem que haja qualquer possibilidade real de contestação.
Essa dinâmica transforma o
STF, e especificamente o gabinete de Moraes, na instância única de julgamentos,
eliminando salvaguardas fundamentais do devido processo legal. A ausência de
critérios objetivos para a conexão entre os inquéritos permite que o ministro
decida, sem qualquer controle externo, quais casos irá absorver para sua
relatoria. Esse modelo, além de comprometer a imparcialidade da Justiça,
estabelece um precedente perigoso para o uso do Poder Judiciário como
ferramenta de controle político e social.
6. Censura judicial
O uso da censura como
ferramenta de repressão ficou evidente desde os primeiros atos do inquérito das
Fake News. Sob a justificativa de combater a "desinformação",
decisões judiciais passaram a remover conteúdos de forma arbitrária, muitas
vezes sem que os alvos sequer soubessem das acusações ou tivessem direito a
defesa.
O primeiro caso de grande
repercussão envolveu a revista Crusoé, que publicou uma reportagem sobre um
suposto desvio de conduta do ministro Dias Toffoli. Após um telefonema do
próprio Toffoli, Moraes ordenou a remoção imediata da matéria, sob o argumento
de que se tratava de "fake news". Quando a revista provou que o
documento era real, já havia sido multada em milhares de reais. Esse episódio
gerou críticas internacionais, mas foi apenas o início do uso sistemático da
censura pelo STF.
Desde então, essa prática se
intensificou. Durante as eleições de 2022, Alexandre de Moraes, então
presidente do TSE, determinou a remoção sigilosa de conteúdos e o bloqueio de
perfis de jornalistas e influenciadores. A lista de censurados incluía nomes como Luciano Hang, Jovem Pan, Gazeta do
Povo, Brasil Paralelo e até o economista Marcos Cintra, opositor de Bolsonaro.
Em muitos casos, as contas eram suspensas sem qualquer notificação, impedindo
que os atingidos recorressem. No caso de Hang, por exemplo, seu perfil
permaneceu bloqueado por dois anos, sem que houvesse prova concreta de crime.
A politização da censura ficou
ainda mais evidente quando a imprensa revelou mensagens de assessores do TSE e
STF discutindo estratégias para justificar medidas contra a Revista Oeste. Em
uma das conversas, chegou a ser sugerido que “usassem a criatividade” para
encontrar algo que pudesse embasar uma punição contra o veículo. Esse modelo de
censura sob demanda se repetiu diversas vezes. No caso da Rádio Jovem Pan, por
exemplo, o TSE proibiu que qualquer comentarista mencionasse a “descondenação”
de Lula, sob pena de multa de R$ 25 mil por dia.
O Twitter Files Brasil expôs documentos internos do X (antigo Twitter) revelando
que o TSE e o STF não apenas determinavam remoções, mas exigiam dados pessoais
de usuários sem ordem judicial. Em um caso específico, foi solicitado ao
Twitter que revelasse os IPs e identidades de usuários que usaram determinadas
hashtags. O próprio departamento jurídico da plataforma alertou que tais
exigências violavam o Marco Civil da Internet, mas mesmo assim as ordens foram
cumpridas.
Outro episódio significativo
foi a censura prévia imposta ao documentário Quem Mandou Matar Jair Bolsonaro?,
produzido pela Brasil Paralelo. O TSE determinou sua remoção de todas as
plataformas antes mesmo de sua estreia, sob a justificativa de que poderia
influenciar as eleições. Esse modelo de censura preventiva também foi aplicado
ao O Antagonista, que foi proibido de mencionar investigações sobre ligações
entre facções criminosas e o PT.
A censura também se estendeu a
figuras independentes. O youtuber Monark, por exemplo, foi alvo de bloqueios
sistemáticos e, após sucessivas sanções, deixou o Brasil. No caso do
ex-deputado Homero Marchese, sua conta foi bloqueada simplesmente por compartilhar
informações públicas sobre a agenda de ministros do STF. Quando seus advogados
tentaram recorrer, só descobriram a decisão 17 dias depois, ao ligarem para o
gabinete de Moraes.
A censura, antes restrita a
medidas excepcionais, se tornou um mecanismo contínuo de controle da narrativa
pública, consolidando um ambiente onde a crítica política pode ser silenciada a
qualquer momento.
O STF como ferramenta
política
Durante audiência pública sobre as
implicações das decisões tomadas no âmbito do Inquérito nº 4.781, o Inquérito
das Fake News, convocada pela deputada federal Júlia Zanatta (PL-SC), realizada
em dezembro de 2024 na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos
Deputados, Viterbo apresentou sua pesquisa e detalhou sobre a
institucionalização, por parte de Alexandre de Moraes, do uso lawfare,
aplicando-o de maneira sistemática em seus inquéritos. O uso da lei como
ferramenta de repressão política tem se mostrado ineficaz para conter o
extremismo e, paradoxalmente, tem contribuído para a radicalização do ambiente
político e social.
Viterbo destaca também a
atuação política do STF e de Moraes. A atuação política do STF e do TSE nas
eleições de 2022 foi explícita e incontestável. Sob o pretexto de combater a
desinformação, o TSE implementou uma série de medidas que resultaram na remoção
de conteúdos, no bloqueio de perfis e na desmonetização de canais de
comunicação, afetando desproporcionalmente um dos lados da disputa.
Para Viterbo, a parcialidade,
no entanto, tornou-se ainda mais evidente após a eleição, quando ministros do
STF e do TSE participaram da celebração para comemorar a vitória de Lula na
eleição, organizada pela futura primeira-dama, Janja, na residência do advogado
Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay. O evento, que reuniu figuras
proeminentes do Judiciário, como Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e
Dias Toffoli, também contou com a presença de políticos influentes alinhados ao
novo governo.
Enquanto este texto era editado, li a notícia abaixo sobre um novo jantar que irá reunir ministros do STF e o presidente Lula. No X, o influenciador Ivanildo Terceiro fez o seguinte comentário ironizando a situação: “Os juízes que vão julgar o principal opositor do Lula o convidaram para um jantar. Devem discutir futebol e o clima, certamente.”
Além da presença em eventos
festivos, declarações públicas dos próprios ministros escancararam o
engajamento político da Suprema Corte. Durante a diplomação do presidente
eleito, o ministro do TSE Benedito Gonçalves foi flagrado cochichando a
Alexandre de Moraes: "Missão dada é missão cumprida". Gilmar Mendes,
em outra ocasião, declarou que "Lula só foi eleito por causa de uma
decisão do STF". Em um evento da União Nacional dos Estudantes, Luís
Roberto Barroso foi além ao afirmar: "Nós vencemos o bolsonarismo",
confessando que a Corte não se via apenas como mediadora, mas como parte ativa
da disputa.
Além de decisões judiciais que
impactam diretamente o cenário eleitoral, ministros participam de eventos
públicos, como inaugurações de obras e reuniões políticas, e frequentemente dão
declarações à imprensa sobre temas diversos, muitas vezes antecipando
entendimentos sobre casos que ainda não foram julgados. Essa expansão de poder
também se manifesta na ingerência sobre o Legislativo. Sob a justificativa de
inação parlamentar, o STF avança sobre atribuições do Congresso, propondo
diretrizes para regulamentações e, quando não são aprovadas, impondo-as por
meio de decisões judiciais. O caso do PL das Fake News ilustra esse fenômeno:
após a proposta enfrentar resistência no Congresso, Moraes passou a determinar
restrições e sanções diretamente.
Segundo Viterbo, em vez de
pacificar o país, a perseguição seletiva e a censura estatal alimentam a
desconfiança nas instituições e ampliam as tensões entre grupos políticos. Para
ele, as práticas adotadas por Alexandre de Moraes alteraram profundamente o
equilíbrio entre os Três Poderes. O STF, que deveria atuar como guardião da
Constituição, tem sido utilizado como um tribunal de exceção, onde opositores
políticos são alvos de investigações intermináveis, submetidos a censura e
punidos com multas abusivas.
A instrumentalização do
Judiciário para fins políticos tornou-se um elemento central na estrutura de
repressão estatal, comprometendo o princípio da imparcialidade e da segurança
jurídica. A manutenção desse estado de exceção jurídico representa um dos maiores
desafios para a democracia brasileira, exigindo um debate amplo sobre os
limites do poder do STF.
Título e Texto: David Agape,
A Investigação, 18-2-2025
18-2-2025: Oeste sem filtro – Defesa de Filipe Martins denuncia à Justiça dos EUA possível fraude + PF pede mais tempo para investigar vazamento de conversas entre assessores de Moraes + Jantar de Lula com ministros do STF é adiado + Grupo Prerrogativas rebate crítica de Kakay a Lula
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New York Times distorce a fala de Vance
O maior problema dos comuno-globalistas
Petição a favor da anistia ultrapassa 150 mil assinaturas
Eu não sou amigo do Bolsonaro e nunca falei com ele.
ResponderExcluirEu não sou bolsonarista, votaria fácil em alguém que eu ache que é melhor candidato e não ligo se ele for preso caso tenha cometido crimes.
Dito isso, irei até o fim para defendê-lo das injustiças que estão sendo feitas.