Humberto Pinho da Silva
"Ter cultura não é
saber de tudo um pouco; também não é saber muito de um só assunto. É conhecer a
fundo alguns grandes espíritos, alimentar-se deles, assimilá-los." André
Maurois, Carta Aberta a um Jovem, Pórtico Editor.
Para muitos,
principalmente para os que pensam pela cabeça alheia, culto é quem cursou a
Faculdade e é senhor de profundos conhecimentos gerais. Mas, será isso cultura?
Cultura é o que permanece
de leitura realizada durante décadas a fio. Em outras palavras, é o que fica
depois de tudo se ter esquecido.
A memória é, como alguém
disse, a faculdade de esquecer. O subconsciente retém apenas resquícios do que
se aprendeu; tudo, pouco a pouco, se volatiliza.
É vulgar confundir cultura
com erudição. Esta resulta do conhecimento adquirido, geralmente pela leitura,
que permite citar o que os outros pensaram sobre determinada matéria.
Em regra, o erudito
recorre à memória de papel, guardando no livrinho de apontamentos ou
conservando em fichas o que leu, em livros ou nos meios de comunicação.
Será realmente possível recordar o que se esqueceu? E se varreu da memória?
É possível. Permanece no
subconsciente a essência, que permite pensar, raciocinar com ponderação. Isso é
cultura.
Ser culto, não é,
portanto, muito saber, muito menos recordar o que se aprendeu; mas saber
utilizar os conhecimentos adquiridos, sem se saber, muito bem como, quando, e
onde foram obtidos.
A cultura não é só obtida
pelo estudo ou pela leitura, provém, igualmente, de tudo que se observou ao
longo da vida.
Ferreira de Castro,
notável escritor, que escreveu parte da sua obra no Brasil, não possuía
qualquer formação académica, para além da escola primária.
Diz Jaime Brasil:
"Que cultura, que experiência tinha Ferreira de Castro quando foi para o
Brasil? Somente a dos pobres livros escolares."
"Quando fez o seu
exame de primeiras letras, deram-lhe, como prêmio, um livro de Eduardo Noronha,
Do Algarve ao Minho em Automóvel. É muito pouco, como cultura, mas o
bastante para alicerçar uma"
E chegado ao Brasil, no sertão, apenas lia o "Almanaque de Lembranças Luso-Brasileiro", emprestado por amigos. Isso não impediu que mais tarde escrevesse os "Emigrantes", curioso romance que é sempre atual.
Concluindo: cultura é o
que fica após tudo se ter esquecido.
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva, março de 2025
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