Aparecido Raimundo de Souza
É uma dor que não se
cura com analgésicos, que não se explica com palavras simples. Ela exige
escuta, tempo, acolhimento. Às vezes, tudo o que a alma precisa é de um olhar
que compreenda, de um abraço que não julgue, de um silêncio que respeite. Mas
há também beleza nesse sofrimento. Porque é nele que a alma se revela, se
transforma, se fortalece. É na travessia da dor que descobrimos quem somos, o
que importa, o que nos move. A alma sofre, mas também aprende, cresce e
renasce.
Que possamos cuidar da
nossa alma com a mesma atenção que damos ao corpo. Que possamos igualmente
reconhecer nossas dores, sem vergonha, sem medo, sem atropelos. Porque toda
alma que sofre carrega em si a semente da cura. O sofrimento da alma é uma
espécie de campo vasto e pode ser explorado sob diferentes perspectivas. Aqui
estão em rápidas pinceladas, algumas reflexões que podem enriquecer o presente
texto:
A alma sofre em
silêncio? Sim. Sofre. Não por falta de voz, mas porque a sua dor é sutil,
invisível, muitas vezes incompreendida. É o tipo de sofrimento que não se
explica com palavras, pois nasce de sentimentos profundos: saudade, culpa,
vazio, angústia. É como uma tempestade interna que não molha a pele, mas afoga
o espírito. Literalmente.
Segundo o filósofo
Nilo Deyson Monteiro Pessanha, “o sofrimento pode ser um espelho que nos obriga
a encarar o ego, a refletir sobre nossas escolhas, crenças e valores”. Nesse
tom, ele propõe que a dor seja vista como um convite à crítica e ao autoconhecimento,
e não como uma espécie de punição.
Para muitos pensadores espirituais, o sofrimento é um portal. Ele rasga o véu das ilusões e nos empurra para dentro, para uma jornada de despertar. É no colapso, ou seja, na perda, na doença, na ruptura que a alma se rende e começa a buscar o verdadeiro sentido. Essa busca pode levar ao reencontro com o Sagrado, com o propósito, e também, com a essência.
Na doutrina espírita,
por exemplo, o sofrimento é visto como uma oportunidade de evolução. Muitas
dores são reflexos de escolhas passadas, e outras são instrumentos de
aprendizado. A dor moral, pode ser terapêutica. Ela nos tira da zona de
conforto e nos obriga a mudar, a reparar, a perdoar.
A alma que sofre
também pode iluminar. Quando a dor é acolhida, compreendida e “ressignificada”
(guardem bem essa palavra), ela se transforma em força, em compaixão, em
sabedoria. O sofrimento não precisa ser fim. Pode ser começo. Pode ser, e de
fato é, o solo fértil onde brota a cura, onde predomina a arte, e sobretudo,
onde se vivifica grandemente a FÉ.
Darei “uma palhinha”
rápida sobre Fernando Pessoa e Clarice Lispector. Dois gigantes da literatura
que mergulharam fundo na alma humana, cada um à sua maneira, com estilos
distintos, mas igualmente intensos. Suas reflexões atravessaram temas como
identidade, solidão, sentido da existência e o mistério do ser.
Fernando Pessoa, no
dizer de Luiz Fernando Veríssimo, “não era apenas um poeta, era muitos”. Criou
heterônimos como Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis, cada um com
uma visão de mundo própria. Sua obra é marcada por “Fragmentação do eu” “Tenho
em mim todos os sonhos do mundo”, diz ele em “o Livro do Desassossego”,
revelando um sujeito dividido, múltiplo, em busca de sentido.
“O Livro do
Desassossego” é uma obra de introspecção radical, onde o autor assevera que “A
heteronímia é como uma resposta à complexidade. Pois bem. Fernando Pessoa não
se contentava com uma só voz, pelo contrário, ele se “outrava”, ou dito de
forma mais simples, criava personagens que pensavam diferente dele.
Clarice Lispector
escrevia como quem escava a alma. Ia fundo. Seus textos são densos, líricos, e
muitas vezes desconcertantes. Ela nos convida a sentir antes de entender a
busca do eu. Em “A Paixão Segundo G.H”, a protagonista vive uma epifania ao
encarar uma barata, um mergulho profundo e quase sem volta no abismo do ser.
Voltando a Fernando
Pessoa, segundo estudos comparativos, ambos problematizavam a identidade e o
“eu” moderno. Nessa senda, Fernando Pessoa fragmentou o sujeito em múltiplas
vozes, ao passo que Clarice dissolveu a criatura em sensações e silêncios.
Ambos, no geral, revelaram que “o ser humano é um mistério e que a literatura é
uma forma de tocá-lo”.
Entre tapas e beijos,
pescoções e pernadas, juntando Fernando Pessoa e Clarice Lispector, aprendemos
que o sofrimento da alma é aquele como já disse acima, no início desse texto,
“é aquele que nasce da perda, da ausência, da solidão, da incompreensão. É o
vazio que se instala quando os sonhos se desfazem, quando o amor não encontra
abrigo, quando a esperança parece ter se perdido no caminho”.
Resumindo, é uma dor
que não se cura com analgésicos, que não se explica com palavras simples. Ela
exige escuta, tempo, acolhimento. Às vezes, tudo o que a alma precisa é de um
olhar que compreenda, de um abraço que não julgue, de um silêncio que respeite.
Mas há também beleza nesse sofrimento. Porque é nele que a alma se revela, se
transforma, se fortalece. É na travessia da dor que descobrimos quem somos, o
que nos importa, o que nos move.
A alma sofre? Sim, e
muito. Mas percebam, também aprendemos, crescemos, renascemos. Que possamos
cuidar da nossa alma com a mesma atenção que damos ao corpo. Que possamos
reconhecer nossas dores, sem vergonha, sem medo. Toda alma que sofre ou que
padece, carrega em si a semente da cura. A alma sofre porque PENSA demais, como
diria Fernando Pessoa.
A alma sofre porque
SENTE demais, como diria Clarice Lispector. E entre o PENSAR e o SENTIR, ela se
desfaz, e se refaz. O sofrimento não é fim, é travessia. É o lugar onde o “eu”
se encontra com o mistério. E ali, no fundo da dor em sua melhor forma de expressão,
nasce a poesia.
Para mim, em
particular, a alma que sofre sobrevive. Sempre. E mais: ela não apenas
sobrevive, ela se transforma. O sofrimento da alma é como o vento forte que
dobra a árvore, mas não a quebra. Ele testa as raízes, desafia a estrutura, mas
como um todo também ensina como passar por tudo com perseverança e
paciência.
A alma que sofre
aprende a escutar o silêncio, a valorizar o instante, a reconhecer a beleza
escondida nas pequenas coisas. Ela se torna mais sensível, mais profunda, mais
verdadeira. É como o barro que, ao ser moldado pela dor, vira arte. A dor não é
o fim. É o processo. E a alma, mesmo ferida, como diz Mia Couto, “ela carrega
dentro de si uma força ancestral que a empurra para frente.
“A alma não tem
cicatrizes. Tem memórias que brilham.”
Eu, como mero
“escrevinhador”, me acho, como uma espécie de Mia Couto dos tempos de hoje. A
minha alma não sofre. O sofrimento da minha alma é a base, o alicerce, a
estrutura do meu amanhã que ainda nem chegou, todavia, acreditem, ele, o meu
porvir, ainda está por chegar. E chegará. Respondendo à pergunta embutida no
título: Será que ele, o Sofrimento, é eterno?
Não, meus caros, o sofrimento é PASSAGEIRO.
Título e Texto:
Aparecido Raimundo de Souza, de Linhares, no Espírito Santo, 3-10-2025
Não deu certo com ele, porque ela procura um pito que nunca viu canhoto
[Aparecido rasga o verbo – Extra] As diversas fases da Língua
O turista extraviado
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