Em 26 de março postei “Mais uma da imprensa portuguesa” sobre mais uma desonesta (e habitual) manchete
dessa imprensa, sempre muito atenta a conspurcar o atual governo. E, como não é
raro, eis que encontro um artigo de Alberto Gonçalves que escreve muito melhor
sobre “o esforço de certo jornalismo (que)concentra-se nos títulos susceptíveis
de conspurcar a imagem pública do Governo”:
Espiões e populistas
Alberto Gonçalves
O país, ou o pedacinho dele
que ainda liga a estas coisas, estremeceu com a notícia de que o Governo criou
um posto de trabalho na Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de
Ministros para o ex-espião Jorge Silva Carvalho. Dito assim, fica a ideia de que o primeiro-ministro decidiu pessoalmente recrutar um arguido num processo de abuso de poder e violação de segredo de
Estado e colocá-lo num cargo de responsabilidade e confiança. Para cúmulo, os
media partiram de imediato a ouvir as abalizadas opiniões do PCP e do BE acerca
do assunto. As opiniões não foram simpáticas. Pelos comunistas, António Filipe
considerou o sucedido "insólito". E a menina que alegadamente manda
no Bloco jurou que iria pedir explicações ao dr. Passos Coelho sobre um "caso
muito grave para a democracia".
Sem dúvida, não fora a
circunstância de uma lei de 2007 determinar a integração no cargo em questão de
todos os antigos agentes das "secretas" que tenham cumprido seis anos
de serviço ininterrupto. Conforme aconteceu com o mencionado Jorge Silva
Carvalho, que aliás processara o Estado a propósito. Todos os alvoroçados
perante a notícia se esqueceram de referir que a culpa (se a palavra se aplica)
da nomeação é de uma lei esquisita publicada há dois executivos atrás, pormenor
que daria à história outro rigor embora lhe retirasse o conveniente impacto.
Hoje, o esforço de certo
jornalismo concentra-se nos títulos susceptíveis de conspurcar a imagem pública
do Governo. É uma actividade cheia de potencial. Sempre que o carro oficial do
dr. Passos Coelho passar veloz ao lado de um cemitério, é possível uma manchete
rezar: "Primeiro-ministro indiferente a portugueses que morrem."
Por sorte, não faltam possibilidades para criticar indevidamente o Governo. Por azar, também não faltam razões para criticá-lo devidamente, sobretudo quando há ano e meio desperdiça uma oportunidade ímpar para aproveitar o embalo da crise e, ao menos por desfastio, reformar dois ou três pedacinhos do país - seja na Justiça ou no ensino, no trabalho ou na administração pública. No dia em que a poeira se dissipar, verificaremos que os transtornos do inevitável empobrecimento não serviram para curar uma só maleita pátria: serviram a preservação desesperada do Estado socialista, vulgo social. Mas esse é justamente o aspecto que não convém à inclinação populista dos media condenar: para o populismo, a única virtude do Governo é o seu fatal defeito.
Texto: Alberto Gonçalves, Diário de Notícias, 26-03-2013
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