sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Rio: nem Foucault, nem Capitão Nascimento, mas Aristóteles

Capa do jornal " Povo", Rio de Janeiro, 26-11-2010


Se você é do tipo que se propõe problemas um tanto complexos pouco antes de dormir, então, leitor, é um candidato à insônia. Para conciliar o sono, achamos, muitas vezes, uma solução eficaz, definitiva mesmo. Acordamos no outro dia, tudo tende a estar como era antes, mas não porque não tenhamos encontrado a resposta, certo? O mundo é que obtuso demais e não percebe aquele óbvio que percebemos, ali, no entorpecimento. A vida só é suportável por isto: acreditamos que a solução exista, ainda que poucos a reconheçam… É a loucura cotidiana de cada um de nós.

Como resolver o problema da violência no Rio ou em qualquer outro lugar em que a bandidagem tenha roubado nacos do estado de direito? Papinho ongueiro com bandido ou porrete? Ensinando moleque a bater lata e a viver comunitariamente, apelando às virtudes de nossa ancestralidade, como ato de resistência à dita violência do Estado? Militarizando os morros e a periferia? Vamos de Foucault ou de Capitão Nascimento (o do primeiro filme; o do segundo pensa ser Foucault…)? A resposta sensata: e a se a gente fosse de Aristóteles? Isto: o meu delírio pré-sono é começar a preparar agora um exército armado de livros para estudar lógica. Daqui, sei lá, a 15 anos, eles se espalhariam Brasil afora. Mas parece que Fernando Haddad vai continuar na educação… Vale dizer: continuaremos com as duas mãos, a exemplo dos pés, bem plantadas no chão.
Nem Foucault nem Nascimento! Aristóteles! Por que faço essa observação?
Os “especialistas” das universidades e estudiosos da violência já foram convocados pela imprensa para opinar sobre as ações da polícia no Rio — e não, eles não estudaram lógica; a gente nota que não. Não é pelo formato do crânio que se percebe; é pelas coisas que dizem. Engabelam os ouvintes, leitores e telespectadores com inferências que ou são burras ou são malandras.
Assim:
“Se as incursões nas favelas, o enfrentamento e a prisão de traficantes não resolvem definitivamente o problema, então elas não podem ser feitas”.
Pode-se ser ainda mais afirmativo:
“Como as incursões nas favelas, o enfrentamento e a prisão de traficantes não resolvem definitivamente o problema, é preciso suspender essas ações”.
O problema dessas inferências está na falsidade das asserções iniciais. Uma ação repressiva —  qualquer uma — não busca “resolver” o problema, mas responder à desordem com a lembrança da ordem, mesmo que não seja “a” solução. A Polícia não prende o  homicida a Rua X para pôr um fim a todos os homicídios.
Mas também se pode acertar na asserção inicial e chegar a uma conclusão não menos estúpida:
“Já que a resposta à violência requer educação, saúde e infra-estrutura de mais qualidade, então as ações repressivas são inúteis”.
Essa é a mais perversa das ilações porque ignora que as conseqüências das causas que não tiveram a seu tempo resposta adequada serão causas de outra conseqüências deletérias. Porque existe, sem dúvida, lógica nessas inferências, fica parecendo que são corretas, sem que se atente para a falsidade das asserções. E chegamos aonde chegamos.
Reinaldo Azevedo
Jornal "Povo", 24-11-2010

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