quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Dilma: Afirmação ou Submissão

Não me importo de ganhar presente atrasado. Eu quero que o Brasil me dê de presente a Dilma presidente do Brasil”, conclamou Lula,  durante a campanha.
Ronald Santos Barata
Dois discursos proferidos pela presidente Dilma Rousseff nas festas da posse, devem ser analisados,  mas sem deixar de atentar para  a composição do seu ministério.
Creio que ninguém, mesmo os que nela não votaram, deseja o fracasso do  governo que se inicia. Ao contrário, deve-se  torcer para que tudo melhore e, em se tratando do governo de um partido que foi de esquerda, que retorne às suas origens.
Vê-se em algumas palavras da presidente, o desejo de  realizar um governo sem depender de nenhum tutor, com suas próprias características. “Um governo se alicerça no acúmulo de conquistas realizadas ao longo da história. Por isso, ao saudar os avanços extraordinários recentes, é justo lembrar que muitos, a seu tempo e a seu modo, deram muitas contribuições ao Brasil de hoje.” Correto. Palavras que confrontam os discursos do seu criador e do seu Partido, exclusivistas e arrogantes, que se intitulam os únicos protagonistas dos avanços sociais. Discurso, aliás, muito utilizado pelo PT e pela CUT no movimento sindical, como se a história tenha começado com eles.

Ao passar a faixa, Lula chamou os adversários de inimigos. Dilma declarou o desejo de ser presidente de todos e ofereceu a mão aos oposicionistas. Será que está abjurando o sectarismo? Todavia, torço também para que entre esses “todos”, não se inclua as tradicionais oligarquias que Lula tratou com afagos, benesses e solidariedade.
A expectativa é de como agirá Dilma. Será ela própria ou apenas uma aparência? Se aceitar que seu governo seja um mandato-tampão para a volta do “ex”,  como dito na campanha, será o caos não só para seu governo, mas para a democracia. Ela tem personalidade para imprimir sua marca e não  ser apenas uma sombra. Todos os brasileiros de boa fé, desejam que Dilma  se imponha, imprima o seu estilo, cumpra as promessas da campanha, o que só poderá ocorrer se, em curto prazo, reformular o seu ministério e administrar com firmeza com o consórcio de partidos fisiológicos que a apoiam.
Já no primeiro dia do governo, houve desentendimento entre declarações da presidente e as do general Elito Siqueira, chefe do Gabinete de Segurança Institucional. Avizinham-se grandes divergências em relação ao reajuste do salário mínimo. Se não se puser ordem na casa, o governo ficará sem rumo. O mais preocupante porém, foram as declarações da presidente de que há necessidade de desonerar a folha salarial. E o silêncio sobre a informalidade.
O OUTRO LADO DA MOEDA
Eu troquei meu nome e coloquei Dilma na cédula”,  disse Lula num comício. É como dizer: será meu terceiro mandato.
Dilma, nos mesmos discursos com aspectos positivos, referiu-se a Lula com uma inflação de adjetivos que poderiam ser apenas demonstração de gratidão, mas que, na verdade, ecoam o PT quando apregoa o culto à personalidade. “Lula estará conosco! – Seu nome está gravado no coração do povo. - ... um homem de tamanha grandeza e generosidade.” – E teve até aspecto religioso: “Sob sua liderança o povo brasileiro fez a travessia para a outra margem da história”. Temos aí o novo Moisés na travessia do Mar Vermelho. Ou Julio Cesar redivivo atravessando o Rubicão. Para quem sabe ler...
A frase de Lula, colocada no início deste trabalho, (“Não me importo de ganhar presente atrasado...”), não foi um gesto fortuito, espontâneo. É a campanha para consagrar um novo caudilho. Tanto é assim, que a consigna da campanha do PT era: “Dê a vitória de Dilma de presente ao presidente Lula”
Um partido que foi de esquerda e  trata a Presidência da República como uma prenda pessoal, abjura seu passado.
Dilma aceitou as imposições de Lula ao nomear para o chamado “núcleo duro” do governo,  comissários a serviço do ex-presidente.  Um deles, Gilberto Carvalho, ministro da Secretaria Geral do Governo, declarou  recentemente: “Morro por Lula”. Antonio Palocci, Casa Civil, apelou para que os colegas o considerem como um do grupo e não um espião de Lula.  A senadora Marta Suplicy, declarou no dia da posse: “Há uma parceria entre Dilma e Lula que ninguém quebra”. Recados muito claros.
O ex-presidente, com seu grande capital político, adquirido à custa de massacrante marketing, aparelhamento do Estado e sua facilidade de comunicação, declarou que tem dificuldade para assimilar sua saída de cena. Ele vai juntar-se a outros quatro ex-presidentes que nunca deixaram de fazer política. Mas deve encontrar um papel político no cenário nacional e internacional, condizente com seu prestígio e sua liderança, mas longe do círculo governamental. Para o bem do governo Dilma.
E AS ESQUERDAS, O QUE FAZER?
A principal força das esquerdas, o PT, antes da metamorfose, conclamava e trabalhava para organização da classe trabalhadora.  Agora,  com o aparelhamento da máquina governamental e a abundancia de recursos financeiros concedidos pelos “doadores espontâneos”, transforma-se em  um partido que utiliza os movimentos sociais para evitar a politização, a organização e mobilização dos trabalhadores e do povo em geral e pretende que um  ex líder da esquerda, aos 65 anos de idade, seja  um aprendiz de Rasputin, místico e ambicioso. Através da CUT, que se filiou à AFL-CIO, central sindical norte-americana,  afastou os trabalhadores dos confrontos com o capital e passou para lutas pontuais contra organismos estatais. Para o PT, ao contrario dos partidos de esquerda,  acabou a luta de classes.
O PT, renunciando à luta de classes, passou a valorizar o lulismo, um mal definido ideário e que tem componentes de esquerda e de direita. O lulismo é mais que um partido e mais que um governo. É um pacto que não descarta mudanças, mas que sejam implantadas não através de mobilizações ou de lutas no Parlamento; que venham de cima para baixo; que não incomode os banqueiros nem o grande capital. Que sejam feitas sem conflitos políticos. Tudo dentro da ordem.
Aliás, quem profetizou corretamente  foi o general Golbery do Couto e Silva, o guru da ditadura militar que acreditava que Lula era o “homem que destruirá a esquerda no Brasil”. O que vemos hoje, é o principal partido de esquerda transformado num amontoado de trânsfugas aboletados num deprimente aparelhão, que pretende continuar a mandar no país. 
Restaram, defendendo com coerência a esquerda tradicional, a parcela que mantém os princípios socialistas, trabalhistas e comunistas, alguns partidos pequenos e Movimentos que estão grandemente fragilizados. Tanto é que os quatro partidos de esquerda que disputaram a última eleição presidencial, não alcançaram sequer um por cento do eleitorado. As exceções no movimento sindical, os que procuram lutar em defesa dos interesses dos trabalhadores, encontram a forte resistência das grandes centrais sindicais e dos sindicatos cooptados. Da mesma forma, no Parlamento a hegemonia é do aglomerado fisiológico que conseguiu eleger 311 deputados, podendo fazer reformas constitucionais sem negociar, além de obter maioria no Senado.
Portanto, é indispensável que os grupos que mantêm seus princípios, passem a conversar e construam uma plataforma de bandeiras e lutas que os unifique, preservando independência dos patrões e dos governos. Há que considerar que a crise capitalista não se encerrou e recrudescerá e que o Brasil continua dependente dos capitais internacionais. Impedir que haja leilão de lençóis petrolíferos, especialmente no pré-sal; exigir a reforma agrária e a reforma tributária. Luta pela redução da jornada de trabalho e defesa da Previdência Pública e dos direitos trabalhistas. Ressureição da Convenção 158 da OIT e uma Reforma Política que impeça que as eleições continuem nas mãos de marqueteiros e dos financiadores de campanhas.
Em janeiro de 2011
Ronald Santos Barata
Coordenação do Movimento de Resistência Leonel Brizola

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