segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Zagalo

Rui A.

Confesso ter uma enorme repugnância pessoal pela figura pública de Pacheco Pereira [foto]. A privada não conheço, nem me interessa conhecer. Mas o homem público realça todos os defeitos de uma certa elite letrada portuguesa, presumida, arrogante e venal quando convém, que gira uma vida inteira em torno das sinecuras do poder, e que Eça de Queiroz muito bem caracterizou nos seus romances de costumes lisboetas, em especial no célebre O Conde de Abranhos.

Se em torno dos muitos Alípios Severos Abranhos que por aí andam há sempre um Z. Zagalo disponível para exaltar as qualidades de S. Ex.ª, Pacheco teve o seu momento de maior importância política quando foi o Zagalo de Cavaco Silva, nos tempos antigos de glória do velho chefe. Por essa altura, Pacheco exaltava o mérito e as qualidades infinitas de Aníbal, de quem poderia ter dito, como o seu antecessor ficcional dissera de Alípio, «que todos conhecem o grande homem, eu conheço o homem». Tamanha dedicação valeu a Pacheco uns lugares políticos de importância mediana e, sobretudo, uma enorme expressão na comunicação social, com a qual ele se antevia a eterna inteligência da direita indígena.

Mas as coisas não correram conforme os planos de Pacheco e, saído Cavaco da liderança do PSD, logo as coisas lhe começaram a correr mal. Primeiro, com um pontapé para cima, mais propriamente para o Parlamento Europeu, que lhe foi dado por Durão Barroso, com quem Pacheco nunca se meteu por puro receio. Depois, com uma sucessão de líderes que não lhe deram a importância que ele se julga ter. Mais tarde, com o desgosto de Manuela Ferreira Leite. E por fim, com Passos Coelho, a quem ele vota um ódio visceral, que, verdadeiramente, nada tem a ver com as políticas que este seguiu como chefe de governo, mas por lhe parecer inconcebível que um tipo que ele considera estar imensamente abaixo de si o possa ter ultrapassado e não lhe dar importância nenhuma.

O que repele na figura pública de Pacheco Pereira não é, então, o que ele diz ou possa dizer sobre a política nacional e os seus protagonistas. Muito menos sobre o PSD e Passos Coelho. Pacheco sempre foi um tipo de esquerda muito radical, que apenas temporariamente reprimiu as suas tendências naturais à autoridade do chefe Cavaco, por razões de pura conveniência pessoal que nada tinham de ideológico. Não é pois de estranhar que se encoste agora ao PS e ao Bloco e se arvore em estratega da esquerda contra a «direita da austeridade» (o seu artigo de ontem, no Público, «Brincar com o fogo», é, a esse respeito, uma peça interessante). O que incomoda neste homem é não ter categoria para retirar consequências daquilo que diz e que pensa. O que anda ele a fazer por um partido que, de um modo ou de outro, estará sempre à sua direita e com o qual ele nunca teve outra afinidade que não fosse de interesse pessoal? Por que não assume, definitivamente, a sua condição natural de homem de esquerda, do PS ou do Bloco, como outros outrora bem mais à direita do que ele, Freitas e Basílio, por exemplo, fizeram? Porque, presume-se, Pacheco não ganharia nada com isso (um simples lugar na administração de Serralves não lhe preenche o ego) e, por outro lado, o seu excessivo fanatismo anti-PSD e anti-Passos tornou-o desinteressante para o PS.

A grande ambição política de Pacheco, com a qual ele ainda ambiciona relançar a sua vida política, resume-se assim, a ser expulso do PSD. Aí, sim, Pacheco poderia servir para ser agitado como uma bandeira do PS e da esquerda. Mas esse favor não lho fazem, e isso azeda-lhe a vida, turva-lhe o espírito e aguça-lhe o ódio à humanidade. É isso que faz deste homem inteligente um homem menor. 
Título, Imagem e Texto: Rui A., Blasfémias, 7-2-2016

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