Helena Matos
Portugal não está a viver um PREC mas sim a
destruição do centro. O PREC esse vive-o o PS dentro das suas fronteiras e por
isso deixa cair os seus próximos como Carlos Costa e Teodora Cardoso.
Não é o país que está a viver
um PREC. Quem está a viver um PREC é o PS. Sei que parece que estamos a voltar
a 1975: o tempo político como que acelera, banaliza-se o que ontem era
impossível – por onde andará o regular funcionamento das instituições?! –
lincham-se uns alvos na praça pública.
O que está a acontecer com
Carlos Costa e Teodora Cardoso é dos manuais do leninismo e dos processos
revolucionários: de repente, afastar os que foram definidos como inimigos é uma
urgência. Se, como acontece no caso, estes não se afastam cortam-se-lhes os
poderes e largam-se-lhe criaturas como o deputado Miguel Tiago e Eurico
Brilhante Dias. Depois sobe-se a parada mesmo que isso implique perder aliados
e tomar más decisões para o país: quase a fechar a semana o Governo recusou o
nome de Teresa Ter-Minassian para o Conselho das Finanças Públicas, uma escolha que Teodora Cardoso considerava ser a melhor que a História recomendava: Teresa Ter-Minassian foi a chefe de missão do
FMI que negociou o programa de ajustamento português nos anos 80.
Conseguir controlar
instituições como o BdP e o Conselho de Finanças Públicas tornou-se vital para
o Governo e seus parceiros o que confirma que chegou a hora de rever os
compromissos com a Europa e muito particularmente aquilo que o país diz à
Europa. Tudo isso mais o ar destravado do ministro das Finanças a lembrar Vasco
Gonçalves em Almada, pode remeter para o PREC mas aquilo que Portugal está a
viver não é um PREC mas sim a destruição do centro. O PREC esse vive-o o PS
dentro das suas fronteiras e vive-o com uma violência tal que é sobre pessoas
tidas como próximas do PS, como são os casos de Carlos Costa e Teodora Cardoso
(e de certo modo a própria Teresa Ter-Minassian, com quem o PS de Soares se
vangloriava de ter excelentes relações) que se abate a artilharia governamental
e, com a conivência dela, também a alarvidade do BE e do PCP.
A crença de que estamos a
reviver um PREC no país é uma daquelas narrativas reconfortantes que nos
permitiria acreditar que um dia haveria um novo comício na Alameda, passado o
qual o país perceberia à evidência a loucura que o tomara e reentraria
rapidamente na normalidade. Não só agora não vai ser assim como nem sequer foi
bem assim em 1975. Em primeiro lugar o comício da Alameda, ou se quisermos o
momento em que a classe média lisboeta veio para rua dizer que estava farta de
revoluções, só aconteceu depois de a norte do Tejo o povo ter atacado,
destruído, saqueado e incendiado as sedes do PCP, MES, LUAR, PRP e UDP. (A
maior revolta popular do PREC em Portugal não foi de esquerda foi sim contra a
esquerda e só o horror a ter de admitir que o povo de facto não estava com
aqueles que o invocavam a cada segundo leva a que partidos como o PCP, tão
dados ao culto dos seus mártires, não deem a dimensão devida à violência de que
aquele partido foi objeto em localidades como Alcobaça, de onde Álvaro Cunhal
teve de ser retirado.) E em segundo e mais importante lugar: o PS agora está do
outro lado da barricada. A Alameda em 1975 construiu um centro em torno do PS.
O Pacto PS-BE-PCP em 2015 destruiu esse centro.
Não estou a dizer que em 2017
teremos de viver momentos de violência como em 1975, mas estou a dizer que a
ideia de um momento-epifania, como hoje se acredita ter sido o comício da
Alameda é manifestamente insuficiente e simplista para desfazer o nó em que
estamos metidos.
Que PS resultará deste seu
PREC? Não sei. Mas sei que o país cujo PS se expôs a um processo interno desta
natureza – implodindo o centro – é um país mais difícil, mais duro, mais
ridículo e mais pobre. E sobretudo, terminado o PREC em 1975 tínhamos a Europa
à nossa espera e agora a Europa tem muito mais que fazer e com que se
preocupar. O nosso processo é mais de decadência do que de revolução.
Das perturbações mentais às
perturbações quiçá digestivas. Nos últimos anos a Europa produziu uma
doença mental única: pessoas cujas perturbações mentais se traduziam por
agredir geralmente com machados os seus concidadãos enquanto gritavam vivas a
Alá. Alguns destes doentes tinham até vindo de longe, o que nos devia fazer refletir
sobre a relação entre o ar das nossas cidades e o despoletar dessa bizarra
patologia pois não havendo notícia destas almas alguma vez terem atacado quem
quer que fosse nos seus países de origem, uma vez chegados à Alemanha ou França
passaram a sofrer da tal machadite europeiensis. Perante esta
psiquiatrização do que outrora se chamava terrorismo resta saber que domínio da
medicina será chamado a explicar o que está a acontecer nas relações entre a
Turquia e a Holanda. Nomeadamente os avisos de Erdogan de que a Holanda “vai
pagar” por ter expulsado uma ministra turca, a par da contabilidade veiculada
pela imprensa turca sobre o número de soldados existentes na Holanda – 48 mil –
versus os 400 mil turcos existentes naquele país. Quero acreditar que ainda
vamos falar deste problema nas páginas dedicadas aos problemas de estômago.
Tipo azia muçulmana.
“Caixa portuguesa com
certeza!” O anúncio à CGD que anuncia milhões para capitalizar “as
nossas empresas” remata com esta expressão: “Caixa portuguesa com certeza!”
Pois certamente que só pode ser português (ou venezuelano) um banco que acumula
prejuízos decorrentes de empréstimos políticos que não podemos conhecer. Desde
que a OPA da Sonae sobre a PT, em 2007, foi chumbada porque a PT era a pátria,
porque Portugal não se vendia e outros arrebatamentos similares que acabaram
com Granadeiro a teorizar sobre as empresas “sangue do nosso sangue” que não
tínhamos slogans destes. Nem negócios destes.
Título e Texto: Helena Matos, Observador,
13-3-2017
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