Rodrigo Constantino
A militância de Jair Bolsonaro [foto] está na defensiva, e mais agressiva, desde que saíram informações na imprensa
sobre seus investimentos imobiliários familiares e outras questões suspeitas,
de uso de verba pública para fins privados ou funcionário fantasma.
Alguns baixaram o nível a
ponto de atacar uma jornalista até “ontem” tida como ícone da direita com
mensagens sobre sua vida privada sexual, e tantos outros estão defendendo tal
postura abjeta. É a escolinha do professor Frota em ação…
O deputado deve explicações,
por óbvio, e atacar a mídia não é defesa legítima para quem pensa. Dito isso, é
claro que os ataques a Bolsonaro são desproporcionais, que a mesma mídia tem
viés de esquerda, que protege Lula, que adota uma seletividade hipócrita etc.
Tudo isso é verdade, e os seguidores do capitão estão certos nesse ponto.
Uma das fãs de Bolsonaro, que
não se importa com a alcunha de “bolsominion”, escreveu um texto como desabafo. Claudia Wild
argumenta que falta senso de proporção aos que atacam Bolsonaro, tendo uma
máfia socialista em ação no país com chances concretas de voltar ao poder. Diz
ela:
Não dá para aceitar que
joguem no mesmo balaio do menoscabo e da repugnância aqueles que por convicção
apoiam o único candidato que não está comprometido com o projeto de poder
marxista na América do Sul. Assim, gradativamente, todos que criticam as condutas
exageradas, maliciosas dos detratores de Jair Bolsonaro – caso abram a boca –
passaram a ser rotulados como “cegos, fanáticos, petistas invertidos “e outros
títulos trapaceiros. Não caiam nesta tentativa barata de intimidação por
atacado.
O maior estrago que a
esquerda fez no Brasil (e, provavelmente, no mundo) foi extirpar –
completamente – das pessoas o senso das proporções para o julgamento da maioria
das situações. Estas pessoas defendem o direito à crítica, desde que não sejam
objeto dela. Estes iluminados defendem uma democracia de um lado só – desde que
lhes convenha emudecer quem não pense como eles. Estes divinos deuses do
entendimento da guerra política recusam-se a dar o direito de defesa ao
candidato Jair Bolsonaro e ao mesmo tempo ampliam as garantias dos ataques de
seus desafetos, dos mentirosos e todos aqueles que por nojo estético – ou
ideologia – não querem e não admitem que outros queiram votar no Capitão. Vivem
pedindo respeito e ignoram que precisam respeitar minimamente as divergências, digamos,
“internas” - ainda que não gostem disso.
Claudia tem um ponto. Mas
gostaria de acrescentar outros para reflexão. O próprio Bolsonaro tem culpa no
cartório sobre essa “falta de senso das proporções”. Afinal, foi ele, com sua
militância, que jogou todos no mesmo saco podre, que misturou “tudo e todos”
como se fossem da mesma laia, que não fez qualquer distinção entre PT e PSDB.
Se não fosse fiel ao
bolsonarismo, então era um “socialista fabiano”, um agente de Soros e do
globalismo, um vendido. Não havia mais 50 tons de cinza, ou mesmo de vermelho:
era tudo a mesma porcaria! Alckmin? É Lula com menos cabelo. Doria? É Lula
mauricinho. Todos, à exceção do próprio Jair, eram do Foro de SP, e os
jornalistas independentes que ousassem fazer críticas ou perguntas incômodas só
podiam ser petistas também!
Ah, eu sei disso pois eu mesmo
fui vítima de ataques dessa natureza! Ao nivelar todos por baixo e colocar
somente Bolsonaro como diferente, como o ícone da moralidade, como a pureza em
pessoa, era questão de tempo até o tiro sair pela culatra. E não foi por falta de aviso!
Agora os “bolsominions” já
saíram da bolha e mudaram o discurso: Bolsonaro não é o único
incorruptível, mas os outros são piores! Se enxergam já o cinza, então é sinal
de amadurecimento. Então podem reconhecer, por exemplo, as melhorias da gestão
Temer, sem ter que rotular os demais que o fazem como “defensores de bandidos”.
Ou alguém tem saudade de Dilma e do PT?
Se já são capazes de ver as
gradações, então podem reconhecer que o PSDB, apesar de todos os seus defeitos
que eu mesmo vivo apontando, não é igual ao PT, e que o Plano Real, a Lei de
Responsabilidade Fiscal e as privatizações foram avanços importantes, sem falar
da essência mais democrática dos tucanos, ao contrário dos petistas, marginais
defensores de Maduro. O PSDB merece muitas críticas, inclusive pela postura
pusilânime frente ao próprio PT, mas não é igual ao PT. O
Brasil não correria o risco de virar uma Venezuela sob o PSDB ou mesmo sob o
PMDB.
Enfim, quando se sai da bolha
da pureza total (e fatal), e se passa a admitir a existência de defeitos, há
amadurecimento, e vamos ponderar quais são os defeitos mais toleráveis na
política, e quais são as virtudes e qualidades mais desejáveis. Mas lidando com
seres humanos imperfeitos, não com “mitos”. Mantendo o ceticismo, não a
idolatria. Entendendo que política é a arte do possível e a escolha do menos
pior, não a busca por um messias salvador da Pátria.
Bolsonaro ainda pode ser
considerado a única alternativa real ao esquerdismo em 2018, um remédio amargo,
um grito de desespero, um ato de revolta contra o establishment, contra a
hegemonia esquerdista na cultura, a impunidade dos corruptos. Desde que isso
não se transforme em sinônimo de “vale tudo”, de “redenção”, de “solução
mágica” para nossos problemas, até porque Bolsonaro sequer aprova a reforma
previdenciária tão necessária para o Brasil. Claudia Wild escreve:
Exigem do candidato uma
perfeição imaculada que ninguém tem (nem eles próprios). Chegaram ao esdrúxulo
estado mental de não distinguirem uma dispensável ironia tosca de uma fala
acadêmica. Como já disse e repetirei, o que nos move a apoiar Jair Bolsonaro é
o nosso patriotismo – e mais nada, pois sabemos que, caso a esquerda volte ao
poder, o Brasil será soterrado rapidamente.
Se exigem essa “perfeição
imaculada” é porque ele a alimentou de certa forma. Robespierre também
alimentou sua fama de incorruptível, e ela o ajudou a chegar ao poder por meio
da revolução. Mas sabemos o resultado: o Terror, as guilhotinas, e seu próprio
pescoço rolando depois. Bolsonaro parece já ter seu exército de soldados, e
mesmo que os mais fanáticos sejam uma minoria barulhenta, o fato incômodo é que
não são desautorizados pelo próprio.
Ao contrário: um sujeito como
Alexandre Frota, que queria espancar um cidadão qualquer venezuelano no Brasil
só para retaliar Maduro quando prendeu um brasileiro, merece elogios do
capitão. Bolsonaro se cercou dos mais fiéis e bajuladores, que são também os
menos críticos e inteligentes, os que estão indispostos a conviver com qualquer
contraditório. E criou em torno de si uma aura de instrumento da moralidade
contra um mundo corrupto. Isso poderá ser muito prejudicial à sua campanha,
como prevê Carlos Andreazza:
Com ou sem Lula na urna,
porém, estou entre os que apostam na desidratação de sua candidatura uma vez
iniciada a campanha e posta a moer a máquina eleitoral do establishment.
Ele poderia, no entanto,
dificultar a própria maceração. Mas, apregoando-se como o suprassumo da ética,
montou armadilha fatal contra si, machucado por qualquer esbarrão no mais caro
pilar do tripé que sustenta o conservadorismo familiar que exprime: o da
moralidade.
Bolsonaro “comedor de gente”?
Bolsonaro “comendo gente” com dinheiro público? Aí, a casa começa a ruir.
Bolsonaro com funcionário fantasma? Bolsonaro com assessor parlamentar — pago
com recursos públicos — servindo em Angra dos Reis? Aí, a casa cai.
O deputado ergue sua
mitologia sobre a pedra do político diferente. Para quem estica a corda da
própria integridade assim, qualquer frouxidão no fio gera dissonância sobre a
credibilidade; porque volta contra si a régua da pureza estabelecida para
malhar os demais. Esse, todavia, foi o solo em que se plantou. Talvez — justiça
seja feita — não houvesse alternativa; não para que chegasse aonde chegou. Para
ele, mais que qualquer outro, não basta ser honesto. Tem de parecer; o mais
honesto indivíduo já parido sobre a Terra. Bolsonaro pode perder tudo, até o
auxílio-moradia, e ainda resistir. Mas não a supremacia moral, superfície sobre
a qual o mais mínimo arranhão — ele e os seus sabem — será gangrena.
Esse medo da infecção ficou
evidente a partir do levantamento patrimonial empreendido pela “Folha de
S.Paulo”. Não há, na reportagem, prova de atividade ilícita. É legítimo,
entretanto, estranhar que indivíduos cuja atividade sempre foi pública tenham
podido comprar 13 imóveis. Esse pavor — a noção de que tinham a imagem em risco
— acuou os Bolsonaro e os colocou em inédita posição defensiva.
Em vez de acusar
conspirações onde só há necessária luz sobre a vida de quem quer presidir o
país, Bolsonaro deveria dar satisfações claras ao brasileiro — pai de família,
que não sonega impostos, dono apenas de princípios — que passou a duvidar do
mito.
Em suma: é melhor Jair se
explicando.
E essa mentalidade, a de que
cabe a todo político
ter sua vida devassada pela imprensa, ser transparente e ter que prestar
explicações ao cidadão, ao pagador de impostos, ao eleitor, é uma mentalidade
liberal, e fundamental para o sucesso do país a longo prazo. É quando o
governante deixa de ser investigado e cobrado que vivemos na tirania. Se Bolsonaro
for eleito, seus fãs vão continuar condenando o trabalho investigativo da
imprensa? E essa não é justamente a postura dos petistas com Lula?
Há, reconheço, os liberais
“purinhos” também, aqueles que preferem ficar na confortável Torre de Marfim,
em suas abstrações ideológicas, com suas metralhadoras giratórias contra tudo e
todos no mundo real, sem disposição para sujar minimamente as mãos na guerra
política e cultural, sem qualquer apreço pelo pragmatismo de resultados. Não
sou desse tipo, o leitor sabe.
E estou disposto até a
alimentar o benefício da dúvida de que Bolsonaro possa mesmo ser o instrumento
viável e necessário hoje para conter a esquerda. Mas só se for dentro de certos
limites de ética, decência e decoro. Como na metáfora do time de futebol, há
espaço para várias funções, para zagueiro, atacante, meio-campo, laterais,
torcida, técnico.
Mas se o zagueiro começa a
fazer gol contra, é importante tirá-lo do time. Entre os “bolsominions”, tem
muito zagueiro desse tipo. E pior: falam em nome da direita e acabam
estimulados, ainda que indiretamente, pelo próprio capitão. De um time
desses nenhum liberal pode aceitar fazer parte. Temos que jogar a água
suja do esquerdismo fora, mas sem jogar junto o bebê da democracia liberal…
Título, Imagem e Texto: Rodrigo Constantino, Gazeta do Povo, 16-1-2018
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ResponderExcluirBolsonaro é outro vigarista
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