João Marques de Almeida
Lula deslumbrou-se com a riqueza dos seus
novos amigos empresários e quis ser como eles. Boaventura e Louçã nunca o
poderão reconhecer, pois tal significaria o colapso das ideologias em que
acreditam.
Boaventura Sousa Santos e
Francisco Louçã [foto] não têm qualquer dúvida: a investigação judicial contra Lula é
um processo político. O primeiro define a operação Lava Jato como uma tentativa
de “liquidar, pela via judicial, não só as conquistas sociais da última década
como também as forças políticas que as tornaram possíveis.” Segundo o Professor
Boaventura, as autoridades judiciais brasileiras tornaram-se instrumentos dos
setores conservadores brasileiros e do “imperialismo americano” (não há
delírio de Boaventura sem a inclusão dos imperialistas americanos). Francisco
Louçã é igualmente claro: “O objetivo da condenação é evidente … era necessário
impedir a inscrição da candidatura de Lula no registro eleitoral.”
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Boaventura Santos e Francisco Louçã |
A ligeireza e o tom seguro das
acusações de Boaventura e de Louçã mostram, em primeiro lugar, uma arrogância
dos velhos europeus sobre o Brasil. Como se atrevem, de um modo tão ligeiro, a
questionar o estado de direito no Brasil? Que autoridade têm para o fazer? Só o
fazem porque exploram a imagem do Brasil como um país de terceiro mundo onde é
natural que a justiça seja explorada por interesses políticos. Estão errados.
Desde o início da investigação Lava Jato, as autoridades judiciais brasileiras
têm mostrado um elevado profissionalismo, independência e capacidade para
desmascarar a corrupção política. E a justiça brasileira não investigou apenas
políticos do PT. O PMDB, um partido de “direita” para Boaventura e para Louçã,
tem antigos ministros, antigos governadores e antigos senadores na prisão,
entre eles o tão detestado Eduardo Cunha, que liderou o processo de destituição
de Dilma no Congresso. O antigo candidato presidencial do principal partido de
centro direita e aspirante a candidato nas eleições deste ano, Aécio Neves do
PSDB, está a ser igualmente investigado, o que de resto já o terá afastado das
presidenciais de outubro. A verdade é que a justiça brasileira é um exemplo
para muitos países europeus.
Os delírios de Boaventura e de Louçã também se explicam pelo seu fanatismo ideológico. Por definição, a esquerda — ou pelo menos a esquerda deles – não é corrupta. A corrupção é um exclusivo da direita. Por isso, não se atrevem a discutir de um modo sério os anos de Lula no poder. Desde o mensalão até ao Lava Jato, as investigações mostram que os governos do PT foram os mais corruptos da história do Brasil. O PT usou os recursos da Petrobras e dos bancos públicos para reforçar o seu poder político, comprando até os deputados de outros partidos. Essa é a grande verdade das presidências de Lula. Louçã diz que Lula cometeu um erro ao aliar-se ao PMDB (sim, o tal partido de “direita”), mas não foi um erro. Lula não comete erros desses. A aliança entre o PT e o PMDB foi o elemento central de uma estratégia de poder absoluto dos dois partidos, que partilharam durante mais de 12 anos os recursos do Brasil. Quando se aliou ao PMDB, Lula sabia muito bem o que estava a fazer e conhecia os seus aliados. Lula promoveu uma aliança entre os intelectuais e os sindicatos de São Paulo com os herdeiros mais sinistros dos velhos “Coronéis” do Nordeste Brasileiro (o PMDB) para governar o Brasil. Mas isso não interessa nada a Boaventura, ou é reduzido a um erro por Louçã.
Boaventura e Louçã revelam ainda
uma leitura “romântica” da herança de Lula (o romantismo e o totalitarismo
andaram sempre de mãos dadas). Boaventura sublinha “as conquistas sociais” e
Louçã destaca a luta do PT e de Lula contra a “extorsão do pecúlio público por
elites gananciosas” (descrevendo involuntariamente o que a aliança entre o PT e
o PMDB fez). É verdade que a pobreza diminuiu durante os anos de Lula na
presidência. Mas convém notar que muitas políticas sociais, como a bolsa
família, começaram com Fernando Henrique Cardoso, e não com o PT. Lula e o
Brasil beneficiaram entre 2002 e 2010 do preço elevado do petróleo e da venda
de matérias primas à China.
Boaventura e Louça ignoram,
obviamente, a aliança entre Lula e as elites empresariais brasileiras. Ao
contrário do que dizem, “as elites brasileiras” adaptaram-se muito bem a Lula e
ao PT. Boaventura e Louçã gostam muito de números. Deixo-lhes um desafio. Vejam
o aumento de números de bilionários e de milionários no Brasil durante os anos
de Lula, o crescimento da riqueza das elites e o aumento do fosso entre os mais
ricos e a classe média. Vejam também quem foram os amigos do Presidente Lula,
com quem ele privava e com quem organizava os seus adorados churrascos. Vejam
como eram as festas dos principais dirigentes do PT. Como disse uma jornalista
brasileira, “desde que deixou o Planalto, Lula nunca mais viajou em voo
comercial. Passou a usar apenas aviões privados.“
A história de Lula tem tanto
de simples como de dramático. Um antigo operário, com carisma e talento político,
usou os recursos públicos do seu país para reforçar o poder do seu partido e
dos seus aliados. Pelo caminho, deslumbrou-se com a riqueza dos seus novos
amigos empresários e quis ser como eles. Boaventura e Louçã nunca o poderão
reconhecer, porque isso significaria o colapso das ideologias em que acreditam.
A hegemonia política e a apropriação do Estado e dos recursos públicos acabam
fatalmente na corrupção. No Brasil e na Europa.
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