sexta-feira, 26 de dezembro de 2025

William Waack afirma que a crise política e institucional do Supremo “passou do ponto de retorno”. Por que só agora?

Leandro Ruschel 

Na verdade, esse ponto de não retorno foi ultrapassado ainda em 2019, quando ministros abriram o inquérito das chamadas “fake news” — iniciativa que a então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, criticou duramente e comparou a um “tribunal de exceção”. 

Os primeiros atos de grande repercussão desse inquérito já indicavam seu caráter extraordinário: a decisão que determinou a suspensão imediata de procedimentos investigatórios instaurados na Receita Federal, que envolviam autoridades do Supremo e pessoas próximas, além da censura imposta a uma revista que publicara o depoimento de Marcelo Odebrecht sobre o “Amigo do Amigo do Meu Pai”. 

A partir daí, o inquérito — cuja condução passou a ser alvo permanente de críticas por sua elasticidade e por concentrar, na prática, funções típicas de investigar, acusar e julgar — tornou-se o eixo de uma escalada de medidas excepcionais. Vieram ordens de remoção de conteúdo, decisões com efeito censor e prisões preventivas de críticos e opositores, frequentemente amparadas em interpretações amplas de conceitos como “ataques às instituições” e “desinformação”. A exceção foi sendo normalizada como método. 

Enquanto isso, uma parcela expressiva dos réus e condenados da Lava Jato — operação que revelou um dos maiores esquemas de corrupção já expostos no país — viu suas condenações serem anuladas ou revertidas, em decisões que alimentaram a percepção pública de impunidade e de reescrita histórica do maior escândalo político-financeiro da história nacional. 

Esse padrão culminou no tratamento judicial dado ao bolsonarismo e ao entorno de Jair Bolsonaro: um processo que, para muitos, assumiu contornos abertamente políticos, no qual a narrativa de “tentativa de golpe” passou a operar como verdade institucional, apesar de sua caracterização ser fortemente contestada. As fragilidades dessa construção vieram à tona no voto do ministro Luiz Fux, que registrou objeções graves sobre tipificação, extensão e garantias do devido processo. No mesmo ciclo, centenas de brasileiros foram presos ou condenados por atos ligados ao 8 de janeiro — muitos sob acusações gravíssimas — em decisões acusadas de impor penas desproporcionais, tratar condutas distintas como equivalentes e relativizar garantias elementares. 

Somente depois de consolidado esse arranjo — e depois de o Supremo ter normalizado uma lógica de excepcionalidade dirigida sobretudo contra a direita — é que parte da imprensa, que antes justificava arbitrariedades e tratava a corte como intocável, passou a expressar desconforto e a questionar seus métodos. 

Agora é tarde. Quero ver colocar esse gênio de volta na garrafa.

Título, Texto e Imagem: Leandro Ruschel, X, 25-12-2025, 16h25 

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