Qual seria o futuro de um político que se apresentasse ao eleitorado
dizendo que vamos empobrecer, que vivemos numa zona do mundo em declínio e que
o grande desafio que temos pela frente é conseguir gerir este momento sem
perder os valores...
essenciais da nossa cultura,
preservando o que se considera essencial e minorando o sofrimento? Na melhor
das hipóteses seria político por um dia, aquele em que fizera tais afirmações.
Viciámo-nos em promessas e
boas notícias. Já nem temos palavras para a realidade: as dívidas chamam-se
investimento, o vandalismo passou a alegado incidente, deixou de se reprovar,
simplesmente não se transita, a prostituição tornou-se trabalho sexual. Como é
próprio das sociedades decadentes perdemos o sentido de Estado e vamo-nos atomizando
em tribos: temos os "filhos dos bairros" para designar os jovens
nascidos nuns bairros que nos foram anunciados como a solução mágica da vida
dos seus pais e agora são uma espécie de mundo sem regras para quem ali vive;
as comunidades africanas esmagadoramente compostas por pessoas que não nasceram
em África mas a quem não sabemos se se pode chamar negro; as "pessoas
LGBT" como se não fôssemos todos, pessoas.
As palavras tiveram de se
adaptar à susceptibilidade das tribos e por isso o sexo passou a género e os
pais estão a caminho de ser reduzidos a progenitores. Cada acto é mais ou menos
grave consoante a tribo que afecta e por isso o direito transformou-se num sub
produto da etno-sociologia: temos a violência doméstica, violência de género,
crimes de colarinho branco, violência em meio escolar. Na passada semana uns
portugueses foram esfaqueados na Alemanha mas como a agressão não caiu no
âmbito do crime de ódio logo passou ao rol da insignificância.
O Estado que havia de tomar
conta de nós do berço à cova - agora até às cinzas porque os cemitérios são uma
coisa antiga que nos lembra que existe morte - tornou-se num monstro ávido de
dinheiro que esbulha o possível e o impossível a uma população que o seu
intervencionismo reduziu à anomia. Ninguém é responsável por nada mas apenas o
resultado de uma política de apoio ou de um acto de discriminação. A própria
demografia passou a ser confundida com os abonos de família.
Todos os dias mentimos e nos
mentimos para tornarmos aceitável hoje o que ontem condenávamos: uma
intervenção como a que agora foi feita no Chipre era dita impossível na UE,
campeã tão campeã dos direitos que não há semana em que não legisle sobre o
bem-estar das galinhas e dos porcos.
Pois o que era impossível
tornou-se possível e a UE, essa estrutura tão democrática que não pode ser
votada, continuará a impor os seus critérios de democracia às suiniculturas e
às "questões de género" na composição dos conselhos de administração
das empresas, enquanto os seus políticos garantem hoje que não é possível o que
já sabem que vai acontecer amanhã.
Mas se alguém se pensa
apresentar a votos dizendo isto não levará nem os votos da sua família. Se
calhar nem o seu próprio voto. Porque nós somos como os amantes que no tango
suplicam: "Ay/ abrázame esta noche/
aunque no tengas ganas/ prefiero que me mientas".
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