Luís Rosa
As ameaças do Bloco e do PCP sobre o
Orçamento para 2019 devem ser vistas como aqueles caniches que costumamos
encontrar na rua: ladram muito, mas têm sempre medo de morder.
1. Afinal, parece que Mário Centeno já não é o Ronaldo das Finanças
Públicas — pelo menos, a acreditar no Bloco de Esquerda, PCP e até
no porta-voz do PS. Se Ronaldo marca um pontapé de bicicleta exemplar e
tecnicamente irrepreensível que corre o mundo, Catarina Martins, Jerónimo de
Sousa e João Galamba dispensam “brilharetes orçamentais” equivalentes, como rever em baixa
a meta do défice orçamental de 1,1% para 0,7% em 2018 que reforcem a
credibilidade externa de Portugal.
O que preferem realmente é que
o ministro das Finanças continue a ser um verdadeiro ‘brinca-na-areia’
orçamental que até pode prometer bicicletas, mas é obrigado a seguir o plano.
O que preocupa mesmo a ala
radical da Geringonça é que ‘antros’ neoliberais perigosos como a revista
“The Economist” elogiem a
política de finanças públicas do Governo por estar concentrada “no défice e na
dívida, e não em investimento ou serviços públicos”. Repare, caro leitor, é um elogio,
mas, para os geringonços, pode ser um insulto, até porque “um governo de
centro-direita estaria a fazer mais ou menos a mesma coisa”.
Compreende-se as razões que
levaram Catarina Martins e Jerónimo de Sousa a fazerem de Mário Centeno [foto] um alvo
político, radicalizando o discurso.
Em primeiro lugar, o BE e o PCP não querem ter nada a ver com um ministro das Finanças que já é comparado por Marques Mendes com Vítor Gaspar — o ‘pai’ da ideia do Governo de Passos Coelho para ir além da troika. Essa é uma linha vermelha clara que coloca pode pôr em causa toda a narrativa dos dois partidos que apoiam o Governo.
A segunda questão, sempre
elementar em política, prende-se com a simples sobrevivência. Se olharmos para
o barómetro que a Eurosondagem publica no Expresso desde a formação da
Geringonça (e tal como aquele semanário recordava há 15 dias), o PCP e o Bloco
têm descido de forma sustentada nas sondagens, sendo que os bloquistas são os
que perdem mais: dos 10,1% que alcançaram nas legislativas de 2015, desceram
para 7,7%, enquanto que o PCP desceu de 8,2% para 7,3%. Ora, um Bloco e um PCP
colados a um Governo que quer ir além do que está estipulado no Orçamento só
pode potenciar a sua descida.
2. Com um PS a ter 41,5% na mesma sondagem — muito perto, portanto,
da maioria absoluta –, compreende-se ainda melhor porque razão Catarina e
Jerónimo gritam, esperneiam e ‘carregam nas cores’ dos defeitos do Governo para
mostrarem ao seu eleitorado que nada têm a ver com Mário Centeno e a sua
austeridade inteligente. Deixando, na dúvida, no caso do PCP, se se aprovam a
proposta para o Orçamento de Estado de 2019.
Estas ameaças, contudo, não
valem muito. Aliás, devemos olhar para as mesmas com alguma benevolência.
Todos os partidos da
Geringonça sabem que, quem provocar uma crise política, tomará o mesmo remédio
que o PRD tomou em 1987 quando fez cair o Governo de Cavaco Silva: a irrelevância
política.
Por isso, as ameaças mais ou
menos subliminares, com mais ou menos greves das diferentes profissões que
constituem a administração pública, devem ser vistas como aqueles caniches que
costumamos encontrar na rua: ladram muito, mas têm sempre medo de morder.
3. Ainda sou do tempo em que um Presidente da República oriundo da
esquerda proclamava aos sete ventos que “há mais vida além do orçamento. A economia
não é só finanças públicas”. A frase é de Jorge Sampaio e foi proferida em
2003 para criticar a ‘obsessão’ que o Governo de Durão Barroso então tinha com
o controle do défice orçamental em nome das regras de convergência com a zona
euro.
A frase de Sampaio ilustra bem
o pensamento de uma boa parte da esquerda — e que é hoje seguida pelo BE e pelo
PCP, mas aparentemente repudiada por Mário Centeno.
Reduzir a meta do défice este
ano para 0,7% e atingir eventualmente a meta dos 0,2% em 2019, com superávits
orçamentais nos anos seguintes, é o caminho certo para reforçar a credibilidade
externa de Portugal e reduzir o excesso de peso que a dívida tem. Mas mais do
que isso, a disciplina orçamental permitirá reconquistar e reforçar de forma
mais eficiente a confiança dos investidores externos em Portugal.
4. Se tivermos em conta que o PS obteve 32,5% dos votos nas
legislativas de 2015, e que atualmente tem 41,5% no barómetro Eurosondagem, só
podemos concluir que esse aumento de votos foi conseguido essencialmente à
custa do PSD, de Passos Coelho e de Rui Rio.
As razões para isso são várias,
mas o que interessa aqui é um único ponto: o facto de o Executivo do PS ter um
ministro das Finanças que consegue controlar o défice orçamental é muito
perigosa para Rui Rio.
Precisamente por ser esse o
seu perfil. Desde a Câmara do Porto que o atual líder do PSD cultivou uma
narrativa não só de seriedade, como também uma certa imagem de contabilista,
sempre com contas certas. É esse o seu maior ativo político.
Com António Costa a entrar
nesse campo para conquistar uma ‘medalha’ chamada superávit orçamental, a
posição eleitoral de Rui Rio fica ainda mais fragilizada porque fica sem
narrativa.
Não foi por acaso, aliás, que
passamos a ouvir Rui
Rio e membros da sua direção política a defender que, com o atual crescimento
económico, há folga orçamental para aumentar os funcionários públicos — uma
posição em tudo idêntica ao Bloco de Esquerda e ao PCP. A política odeia o
vazio e ausência de ideias próprias leva os socialdemocratas a seguir os
outros.
O que é, em si mesmo, mais uma
prova de como o PSD anda à deriva em termos de estratégia e de narrativa
política.
Título e Texto: Luís Rosa, Observador,
16-4-2018
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