terça-feira, 15 de maio de 2012

O exemplo da Grécia e a iliteracia económica

Jorge Marrão
A sociedade portuguesa defronta-se hoje com a impossibilidade de regressar ao passado, resmunga com o presente e não aceita o futuro que antevê. Agregamos contradições na retórica política, económica e social. Promovemos a iliteracia económica, voluntária ou não, a despeito de tanto se discutir economia, para não aceitar a mudança.
Umas vezes a concorrência é boa; outras é a fonte de destruição de emprego e não permite que as empresas sejam lucrativas. A produtividade que faz enriquecer qualquer País, no âmbito da empresa, é entendida como causadora de desemprego, e raramente como o verdadeiro meio para o crescimento salarial. O capital externo que tanto necessitamos, e não dívida externa, é rejeitado porque é uma afronta à soberania nacional, e jamais como instrumento de reorientação e saudável capitalização da economia. As empresas descapitalizadas bramam por mais financiamento, isto é, mais endividamento, mas os seus proprietários rejeitam aumentos de capital para não perderem o controlo. As metas dos défices públicos falhadas, isto é, a concretização de um estímulo fiscal, ainda que involuntário, são apresentadas como clamorosos erros por aqueles que mais tarde sugerem que os estímulos não são suficientes! A argumentação tornou-se conveniente.
Desacreditam-se os políticos porque entre o que fazem e aquilo que deveriam concretizar, invocam a gasta frase "que a política é a arte do possível", para não serem transparentes com as pessoas. Observando os actores mais rebeldes nesta fase, revisitamos o passado que faliu. Os opositores antigovernamentais do costume apelam ao imobilismo e à discordância permanente total, tornando-se reaccionários. Defendem as leis do passado com as quais, no momento próprio, discordaram; os opositores naturais e futuros governantes, vacilam em aliar-se ao descontentamento gerado pela actual dinâmica e aceitar a realidade da dolorosa mudança necessária. Queremos avançar às arrecuas: não optamos por convicção, mas por obrigação.
Se juntarmos o pavor que os políticos hoje têm da força mediática, percebemos que o ímpeto reformista se esvai no primeiro embate entre o futuro que se quer construir e a realidade que se quer modificar. Escondemos porque não queremos enfrentar a exigência democrática, que realmente se tornou básica, interesseira e superdemagógica.
A Grécia pode ser o nosso farol nesta crise: tudo o que lhes aconteceu tem-se repetido com um desvio temporal em Portugal, ainda que a intensidade e magnitude sejam distintas. A Espanha segue-nos. Mas, não nos devemos esquecer que a irresponsabilidade política dos governos e das oposições lançaram o povo grego para um sofrimento atroz, que é já irreversível para os próximos anos. Há quem queira aproveitar isso como lição, não reconhecendo a fatalidade da mesma. Resta-lhes a esperança que a solidariedade europeia os salve da miséria que colectivamente construíram.
Reconheço que para um desempregado grego, um funcionário público e um qualquer reformado perante o desespero da situação concreta, qualquer solução lhe parece melhor que a proporcionada pelo enquadramento político e internacional vigente. Este a seu tempo foi incapaz de perceber o espírito grego, aplicando uma cartilha, provavelmente certa para o médio prazo, mas insustentável para o curto prazo, perante o complexo edifício económico e social.
Os gregos que não viram por onde levavam o país antes da crise, são exactamente os mesmos que agora não querem ver que o impasse do divisionismo político os pode levar à sua grande estagnação no séc. XXI. Vai-se lá saber porque é que os homens repetem sempre os mesmos erros. A sociedade uniu-se para lançar um anátema sobre os credores externos. Nós por cá não nos damos conta que as parcas poupanças dos portugueses que estão nos balanços dos nossos bancos, agora a ser ajudados pelo Estado português, e mais tarde pelos nossos impostos, porque a Grécia não tem condições de os pagar, não quer ou não pode, e por isso, atribuímos culpas abstractas aos mercados do qual fazemos parte. Esconde-se a complexidade de toda esta crise, utilizando chavões populistas, e não promovemos uma inteligência colectiva que tem de se afirmar consensual para poder ter resultados.
Oxalá que o povo português mais uma vez mostre a sua sabedoria, apoie as elites que não querem enterrar o país para a próxima década, e não se deixem ludibriar pelos populismos justicialistas e mediáticos, romantismos políticos, e super-homens que irão sempre aproveitar estes frágeis momentos como convenientes para assumir o poder.
Título e Texto: Jorge Marrão, Jornal de Negócios, 15-05-2012

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