Jorge Marrão
A sociedade portuguesa
defronta-se hoje com a impossibilidade de regressar ao passado, resmunga com o
presente e não aceita o futuro que antevê. Agregamos contradições na retórica
política, económica e social. Promovemos a iliteracia económica, voluntária ou
não, a despeito de tanto se discutir economia, para não aceitar a mudança.
Umas vezes a concorrência é
boa; outras é a fonte de destruição de emprego e não permite que as empresas
sejam lucrativas. A produtividade que faz enriquecer qualquer País, no âmbito
da empresa, é entendida como causadora de desemprego, e raramente como o
verdadeiro meio para o crescimento salarial. O capital externo que tanto
necessitamos, e não dívida externa, é rejeitado porque é uma afronta à
soberania nacional, e jamais como instrumento de reorientação e saudável
capitalização da economia. As empresas descapitalizadas bramam por mais
financiamento, isto é, mais endividamento, mas os seus proprietários rejeitam
aumentos de capital para não perderem o controlo. As metas dos défices públicos
falhadas, isto é, a concretização de um estímulo fiscal, ainda que
involuntário, são apresentadas como clamorosos erros por aqueles que mais tarde
sugerem que os estímulos não são suficientes! A argumentação tornou-se
conveniente.
Desacreditam-se os políticos
porque entre o que fazem e aquilo que deveriam concretizar, invocam a gasta
frase "que a política é a arte do possível", para não serem
transparentes com as pessoas. Observando os actores mais rebeldes nesta fase, revisitamos
o passado que faliu. Os opositores antigovernamentais do costume apelam ao
imobilismo e à discordância permanente total, tornando-se reaccionários.
Defendem as leis do passado com as quais, no momento próprio, discordaram; os
opositores naturais e futuros governantes, vacilam em aliar-se ao
descontentamento gerado pela actual dinâmica e aceitar a realidade da dolorosa
mudança necessária. Queremos avançar às arrecuas: não optamos por convicção,
mas por obrigação.
Se juntarmos o pavor que os
políticos hoje têm da força mediática, percebemos que o ímpeto reformista se
esvai no primeiro embate entre o futuro que se quer construir e a realidade que
se quer modificar. Escondemos porque não queremos enfrentar a exigência
democrática, que realmente se tornou básica, interesseira e superdemagógica.
A Grécia pode ser o nosso
farol nesta crise: tudo o que lhes aconteceu tem-se repetido com um desvio
temporal em Portugal, ainda que a intensidade e magnitude sejam distintas. A
Espanha segue-nos. Mas, não nos devemos esquecer que a irresponsabilidade
política dos governos e das oposições lançaram o povo grego para um sofrimento
atroz, que é já irreversível para os próximos anos. Há quem queira aproveitar
isso como lição, não reconhecendo a fatalidade da mesma. Resta-lhes a esperança
que a solidariedade europeia os salve da miséria que colectivamente
construíram.
Reconheço que para um
desempregado grego, um funcionário público e um qualquer reformado perante o
desespero da situação concreta, qualquer solução lhe parece melhor que a
proporcionada pelo enquadramento político e internacional vigente. Este a seu
tempo foi incapaz de perceber o espírito grego, aplicando uma cartilha,
provavelmente certa para o médio prazo, mas insustentável para o curto prazo,
perante o complexo edifício económico e social.
Os gregos que não viram por
onde levavam o país antes da crise, são exactamente os mesmos que agora não
querem ver que o impasse do divisionismo político os pode levar à sua grande
estagnação no séc. XXI. Vai-se lá saber porque é que os homens repetem sempre
os mesmos erros. A sociedade uniu-se para lançar um anátema sobre os credores
externos. Nós por cá não nos damos conta que as parcas poupanças dos
portugueses que estão nos balanços dos nossos bancos, agora a ser ajudados pelo
Estado português, e mais tarde pelos nossos impostos, porque a Grécia não tem
condições de os pagar, não quer ou não pode, e por isso, atribuímos culpas
abstractas aos mercados do qual fazemos parte. Esconde-se a complexidade de
toda esta crise, utilizando chavões populistas, e não promovemos uma
inteligência colectiva que tem de se afirmar consensual para poder ter
resultados.
Oxalá que o povo português
mais uma vez mostre a sua sabedoria, apoie as elites que não querem enterrar o
país para a próxima década, e não se deixem ludibriar pelos populismos
justicialistas e mediáticos, romantismos políticos, e super-homens que irão
sempre aproveitar estes frágeis momentos como convenientes para assumir o
poder.
Título e Texto: Jorge Marrão, Jornal
de Negócios, 15-05-2012
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