Jonathas Filho
Contava-se naquela aldeia que
certa senhora tinha bom trânsito no Castelo do Rei, e que por diversas vezes
teria ido lá interceder em favor dos aldeões de Pasárgada. Lá, disseram, ela
era amiga do Rei. Boataria? Como tenho tendências a historiar, pesquisei
profundamente, mas isso não ficou comprovado, de fato. Então, não posso aqui afirmar se houve ou não
situações que indicassem tal conhecimento dela com a Máxima Autoridade Real. Intercedeu
no quê e por quê, quando, como, e qual era o problema que afligia os pobres
aldeões?
Alguns fidalgos, à boca
pequena... depois de alguns goles de xerez, confidenciaram-me que foi devido a
uma situação bastante desagradável aos aldeões. Contaram-me que os aldeões de Pasárgada,
tinham construído um grande galpão onde funcionaria uma cooperativa onde todos
os cooperativados guardariam toda a lenha obtida; que seria estocada e que essa
bendita lenha seria usada tão-somente para atender às necessidades dos aldeões
mais idosos durante os rigorosos invernos. Uma espécie de poupança para dias
difíceis. Todos os aldeões tinham a certeza que estariam “protegidos” do frio e
que viveriam seus invernos com o calor merecido. Enganaram-se!!!

Na falta da vigilância e/ou
pelo descaso e negligência da Autoridade delegada que tinha sido encarregada
pela Corte Real, com a tarefa precípua de
guardar e cuidar desse Galpão a fim de evitar possíveis desvios de conduta e/ou
de lenha; aquele Almoxarife piromaníaco
ficou à vontade. “Torrava” a lenha dos pobres aldeões em cada noite de luar, ao
som de uivos de lobos “sedentos” de e$quemas. E a Autoridade que deveria
salvaguardar os direitos dos aldeões fez… vista grossa.
Resumo da fábula bufa: O incendiário e os lobos “queimaram toda a
lenha”!!!
Foi uma “grita” geral que posteriormente virou uma tristeza incomum. Aí
então entra novamente em cena a tão comentada senhora... aquela que tinha bom
trânsito no Castelo e que diziam que era amiga do Rei. Como dito anteriormente,
nada ficou comprovado que existisse esse
nível de conhecimento entre as partes mencionadas, haja vista também que,
se ela de fato intercedeu em favor dos aldeões, nada de bom aconteceu para os
aldeões que continuaram sem a lenha e com um Galpão quase todo destruído.
Passaram os pobres aldeões a
contar somente com meros gravetos e
o tempo começava a dar sinais que a temperatura iria cair, possívemente nevar. Após
esse período, o Rei, por motivos outros, abdicou em favor da Rainha, que,
entronizada, resolveu que iria colocar um ponto final no problema dos aldeões. Irritada,
chamou seu Grão-Vizir e em alto e bom som proclamou: RESOLVA O PROBLEMA DOS
ALDEÕES SENÃO CORTO-LHE A CABEÇA!!!
Daí iniciou-se um ciclo de
negociações. Negociações... perguntei? Que negociações?
“In vino veritas”, diria Gaius Plinius Secundus essa célebre frase
em latim, dentro da cabeça de um outro fidalgo de Pasárgada, já em estado
etílico avançado. Disse ele: Não foi bem uma negociação, foi uma proposição que
levou muito tempo, numa espécie de “figura de linguagem”, gastronômicamente
chamada de “cozinhando o galo.” Depenaram os galos velhos, colocaram em banho-maria e quando todos
os aldeões achavam que tudo estava resolvido... ”eles” diziam que faltou o
tempero ou que o sal acabou, e então todo o rito “gastronômico” tinha de ser
reiniciado.
A situação tornou-se
insuportável e mais uma vez a bondosa senhora, conhecedora das firulas e dos
rodeios, sempre procurando contornar a situação, pedia calma e que aguardassem
mais um pouco pois, tudo estava sinalizando um final satisfatório. O tempo
passou e muitos dos coitados aldeões de Pasárgada, já bem mais velhos, mais fragilizados por doenças, carências e
indigência foram a óbito num número bastante acentuado.Os demais aldeões, também com idade
avançada continuam aguardando essa situação tipo “rosca sem fim” até que o fim
os enrosque.
Nesta fábula de Pasárgada,
várias situações não foram esclarecidas:
Teria, de fato, a tal senhora
o livre trânsito no Castelo?
Se tinha, intercedeu ou não em
favor dos aldeões?
A Rainha, de fato, ORDENOU que
se resolvesse o acordo dos aldeões?
Se sim, por que então não
cumpriram com as suas determinações?
Será que a Rainha tem conhecimento que em nenhum momento nada foi concebido e resolvido?
Afinal, vai ser concebido o ACORDO com os aldeões?
Nota: Essa “fábula” foi concebida na idéia de Manuel Bandeira, considerado o criador do verso livre, onde ele em “Vou me embora para Pasárgada”, diz ser amigo do Rei.
Será que na época vigente, Manuel
Bandeira afirmaria no seu verso
livre:
“Em Pasárgada tem tudo... é outra civilização, tem um processo seguro... de se impedir concepção”!
Acredito que se Manuel Bandeira assim fizesse, daria uma “tremenda bandeira” e ficaria mal com o Rei, com a Rainha, com os Príncipes e Princesas... enfim com toda a corte. Incluam-se também o Grão-Vizir e o Sacerdote Real.
Acredito que se Manuel Bandeira assim fizesse, daria uma “tremenda bandeira” e ficaria mal com o Rei, com a Rainha, com os Príncipes e Princesas... enfim com toda a corte. Incluam-se também o Grão-Vizir e o Sacerdote Real.
Título e Texto: Jonathas Filho, também é um aldeão sem
alguma lenha prá queimar... 02-12-2013
........o........
Manuel Bandeira
Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho foi um poeta,
crítico literário e de arte, professor de literatura e tradutor brasileiro. Wikipédia
Nascimento: 19 de
abril de 1886, Recife, Pernambuco
Falecimento: 13 de
outubro de 1968, Rio de Janeiro, RJ
Significados de Concepção
1 Criação
de algo. 2 Capacidade de compreender. 3 Faculdade de chegar a um entendimento. 4 Imaginar alguma coisa. 5
Resultado de gerar um ser vivo. 6 Fecundação do óvulo pelo espermatozoide. 7
Maneira de interpretar. 8 Elaboração de
um projeto.
Vou-me Embora pra Pasárgada
Manuel Bandeira
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Extraído do livro "Bandeira a Vida Inteira", Editora Alumbramento – Rio de Janeiro, 1986, pág. 90
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Muito bom. Melhor impossível. Jonathas meu amigo vc se superou........Mera coincidencia a tal senhora ou estarei vendo fantasma.................
ResponderExcluirQuando nada mais temos a comemorar, nos chega este belíssimo texto do Jonathas , com a força das metáforas bem escritas e que nos leva a acreditar de que nem tudo está perdido, e nos remete a pensar naquilo que estamos fazendo e se é realmente o que deveríamos estar realizando. Parabéns jonathas mais uma vez você se superou.
ResponderExcluirJosé Manuel
Muito bem colocado!!!
ResponderExcluirJonathas Filho,
ResponderExcluirRealmente a semelhança é profunda e, somente um estudioso com tu és saberia dizer tudo que esta acontecendo conosco, sendo ético e conhecedor da causa que nos somos vitimas.
Parabéns
Nelson Schuler