Aparecido Raimundo de Souza
NESTE ANO DE 2018, até ontem, segunda feira, 22 de outubro,
estivemos presentes em vinte e dois velórios de pessoas ricas e famosas.
Figuras inesquecíveis do mundo televisivo, personagens que entravam em nossas
casas, que viviam em nossos lares, comiam conosco em nossas mesas e, com seus
talentos, nos alegravam com seus feitos através dos mais variados programas de
televisão.
Não vamos citar todos, seria evidentemente patético e descabido. Somente os cinco últimos para não nos
tornarmos enfastiados e maçantes aos nossos caros leitores. Pela ordem dos que
nos deram adeus repentino: Guilherme Lamounier, em 7 de agosto, Tito Madi, em
26 de setembro, Angela Maria, em 30 de setembro, Zibia Gasparetto, em 10 de
outubro e, por extremo, o jornalista Gil Gomes [gif abaixo], em 16 de outubro.
Em alguns de meus textos publicados, um amigo que labora para a mesma
revista chegou a comentar como conseguíamos ter inspiração “escrevendo
diretamente de um funeral”. Respondemos
que “não é difícil para alguém falar de amor ou de ódio, ou abordar qualquer
outro tema estando ao lado de um defunto. Principalmente se ele, o morrido, for
famoso. Acho que pelo fato dele ter fama e mídia é que as ideias afluem com
maior intensidade”.
De fato! Convergem, acreditem, brotam do nada, numa competição quase às
raias da rivalidade. Devemos lembrar que nesta vida, nos acostumamos às
pequenas coisas, por mais triviais ou selvagens que possam parecer. Virou
rotina essas insignificâncias dentro do que rotularíamos de uma assuetude
literalmente macabra.
Por conta disto, ficamos como esses infelizes, dependentes de algumas
drogas alucinógenas que precisam ser ministradas em contingentes mais assíduos
para que surtam o efeito desejado. Assim são as nossas visitas incessantes e
ininterruptas às capelas sombrias dos cemitérios deste brazzilzão afora.
Fazemos isto em face de nossos trabalhos jornalísticos assim o exigirem.
“Aparecemos” para cobrirmos as pautas dos editores chefes. O povo quer saber.
Ficar por dentro. Nesse assanhamento, fotografamos os olhares tristes e
pesarosos das pessoas, capturamos as quietudes mansas e pacíficas dos
familiares, arrestamos os introspectivos exagerados das criaturas as mais
diversas em torno dos esquifes cobertos de flores vivas e perfumadas.
No mesmo bote, gravamos alguns depoimentos dos amigos que se fizeram
presentes em horas tão desgastantes e enfadonhas. Acompanhamos os choros
convulsos e conflagrados de pura saudade, registramos os soluços fervorosos e
até as mediocridades panglenicais dos que trouxeram os ares das graças
supérfluas e desnecessárias, maquiadas tão somente para marcarem presença.
Marcar presença, para alguns, é como o ar que respiram.
Em caminho paralelo, gostaríamos de deixar registrado o seguinte:
vivemos numa época de furacões e tempestades, de tsunamis e vendavais, apesar
do brazzil estar situado na América do Sul, um continente abençoado e
totalmente livre dessas catástrofes e infortúnios.
Esses acontecimentos naturais, graças a Deus, não fazem parte dos nossos
cardápios, tanto dos primeiros dejejuns, como dos almoços e jantares. Apesar
destas disjunções, nossos flagelos e cataclismos não estão ligados diretamente
a fenômenos naturais, porém, atrelados a horrores piores. Acreditem senhoras e
senhores, a um agastante e amofinado de assombros inapropriados e
insensatos.
Estas desgraças indômitas parteiam de uma má formação congênita e
sebiescal em vista de um turbilhão de doenças incuráveis abundarem o imenso
penico do mundo, ou a capital desta sequiosa província. Em vista dessas
calamidades decadentes, pagamos altos preços. E pagamos a força, sem a promessa
de revermos nossos mirrados trocadinhos de volta em nossos bolsos.
Apesar desta lástima incoerente, fazemos questão de mantermos em
evidência e a todo vapor, a degenerescência do ser humano, o abastardamento, a
perversão desenfreada de toda uma sociedade de boçais e indignos que não têm
mais para onde fugir. Em verdade, caminhamos a largos passos para uma crise sem
retorno, sem desvios. Trocado em miúdos, caríssimos amados. Seguimos a largos
passos para uma segunda Venezuela de Nicolás Maduro. Este senhor, apesar de no
ponto de ser comigo e devorado, NÃO CAIU DO PÉ. Talvez nem caia.
Voltando ao foco. É exatamente nestes encontros tétricos da vida e
morte, ambas caminhando juntas, lado a lado, de mãos dadas, que paramos para
meditarmos e refletirmos no que vemos e mais precisamente no que presenciamos.
A conclusão é uma só. Todos querem o PODER. Ponto pacífico. Por ele, as pessoas
mentem, embromam, caloteiam, atraiçoam. Pregam desonras roubam se matam, se
digladiam, se tornam, na maioria das vezes, inimigas mortais.
Tudo, caríssimos amados, por NADA. Por um saco vazio de COISA NENHUMA. A
morte chega de repente e, do mesmo modo, tosa, afasta, e descerra as nossas
ansiedades e sonhos. Seguem com eles, para o mausoléu, as riquezas, os cargos
pomposos, as insígnias, os diplomas de bacharéis com graus de excelências, e,
de roldão, os mais altos e soberbos postos alcançados. Se nossos
presidenciáveis tivessem o mínimo de respeito (não aos idiotas que os cercam,
mas a si mesmos) e parassem para uma introspecção profunda a respeito disto...
Como dois e dois são quatro, num milésimo de segundo as quimeras
irracionais, as ganâncias tirânicas, os desejos extravagantes viram poeira, se
transformam em ciscos e monturos, enfim, num leque de sujidades que ser humano
nenhum consegue abanar. Não riam, por favor. Somos restos de porcarias e imundícies. Vermes detritados se debatendo em meio a
essas chafurdas. Seja a criatura pobre ou rica, bonita ou feia, preta ou
branca, católica, crente, ateia ou atoa, macumbeira, não importa. Não rola a
menor diferença. Vai para o buraco chorando ou sorrindo com banquinho e tudo.
O silêncio sepulcral e cavernoso pintou no pedaço faz com que cesse de
uma vez, num abrir e fechar de olhos, essas inspirações e almejos. Não passamos
de bostas fedorentas e malcheirosas. Daí, talvez, a explicação endêmica de
enterrarmos nossos “de cujus” (numa espécie de urgência essencial) e volvermos
de rabinhos entre as pernas para nossos mundinhos impregnados de merdas.
A vida que vivemos é rápida, malemolente, ligeira, precipitada, esperta,
astuta, acelerada e vivaz. Extremamente tirânica. Sobretudo absolutista e
déspota. Possui em sua concepção, uma brevidade espantosa e fremente. Ao mesmo
tempo em que nos põem sorrindo, no minuto seguinte poderemos (a surto prazer
desta coqueteira) ser flagrados em estado terminal de vérica prostração. Grosso
modo vegetando outros ares, as mãos em atitudes de preces, os pés juntos,
caminhando sem volta pelos insondáveis recônditos dos setes palmos de terra.
Banhados, perfumados, cheirosos e indumentariados na mais cara e
desusada das fatiotas (estas na maioria das ocasiões arrancadas às pressas dos
fundos de velhos baús), seguiremos ao som de harpeiros chatos e violinistas
indigestos tocando músicas destoadas de nossos gostos particulares para vermos
Deus ou o Diabo, ou os dois, nunca se sabe, levando em conta um pormenor
interessante. Até hoje, ninguém voltou desses confins cavernosos para nos
contar passo a passo como, de fato são as coisas por aquelas paragens.
Nesse passo incerto, dependendo de como foram nossas travessuras nos
anos enjaneirados que aqui vivemos emprestados neste louco e abilolado planeta,
lá teremos o “acerto de contas”. Frontaremos com o garboso “juízo Final”. Este
tema austero, todavia tão real da vida a todo vapor, ficou retratado de forma
muito clara na canção “Trem-bala” de Ana Vilela, quando a certa altura a jovem
musicista esclarece:
“Também não é sobre correr contra o tempo pra ter sempre mais” Finaliza
mandando um recado sem ornamentos, um aviso curtinho que todos nós deveríamos
seguir, ao invés de pensarmos no PODER. PODER, PODER, PODER. “Segura teu filho
no colo, sorria e abraça os teus pais enquanto estão aqui... que a vida é
Trem-Bala parceiro e a gente é só passageiro prestes a partir”. Talvez,
caríssimos, nem o tempo de uma passada na padaria mais próxima para o
apreciamento de uma boa torradinha com café feito na hora.
Título e Texto: Aparecido
Raimundo de Souza, jornalista. De Santa Rita do Passa Quatro, interior de
São Paulo.
Colunas anteriores:
"Viver em sociedade requer instinto de formiga, dentes de leão e habilidade camaleônica" (Carlos Drummond de Andrade)
ResponderExcluir"Viver em sociedade requer ter instinto de deputado, dentes de senadores e habilidades de presidente. Na falta destes três elementos, melhor ser defunto fresco em qualquer cemitério de periferia". Aparecido Raimundo de Souza, de Santa Cruz do Passa Quatro, interior de São Paulo.
ExcluirMesmo sabendo os que frequentam cemitérios, via de regra, o fazem por dever profissional, ou por medo do que a vida lhes reserva e tentam se acostumar à ideia.
ResponderExcluirAlguns vão reconhecer terreno, tentando descobrir, enquanto isto lhe é permitido, uma forma de evadir-se desta prisão quando chegar a fatídica hora. Eu nem assim eu vou!!
Não entro em cemitérios!
Lá ninguém tem nada para me dizer!
Eu não teria uma plateia muito atenta aos meus discursos, iria viver como?
Mesmo os temporariamente vivos, não dão importância maior ao que digo! Mas os penalizo fazendo-os ouvir-me e ler-me, e isto me dá prazer!
Aos mortos meus argumentos seriam inúteis, estão irremediavelmente em “outro mundo”!
Um dia para meu desgosto, serei levado a contragosto e sob protestos!
Ainda assim, no tempo que me resta pretendo bolar uma forma de frustrar os carregadores do meu inanimado ser.
Talvez caindo do caixão e rolando ladeira abaixo, sob as impressões daqueles que me pretendiam definitivamente submisso e finalmente calado!
Paizote
Concordo com o comentário do Sr.Paizote.
ExcluirSingularmente a vida me ensinou a não ter medo dos mortos, mas sim...dos vivos!
Certa ocasião confessei para um amigo que tenho medo da morte.
ExcluirEle então respondeu para que não nos preocupássemos com a morte, porque tanto ele quanto eu, ou qualquer outra pessoa, não faremos falta alguma neste mundo.
Resposta ao Paizote em comentário de 20:06. Caro amigo. Como disse no texto acima, em face de minha profissão, sou obrigado a frequentar esses lugares. Se dependesse de mim, jamais entraria em cemitério. Fico pê da vida, porque os falecidos a quem precisei visitar, se negaram terminantemente a darem entrevistas, ou se deixaram ser fotografados.
ExcluirEstes cinco derradeiros, por exemplo, se mantiveram o tempo todo alheios, sempre dormindo um sono pesado como se tivessem trabalhado até a exaustão. Sequer imagine caro amigo, sequer tiveram a fineza de agradecer (não a mim em particular) a quem estava à volta, chorando pelo seu fatídico passamento.
Pior nessa história toda. Você procura ser educado, fazer algumas perguntinhas básicas e discretas, mas o cidadão se mantém mudo, calado, estático, como se fosse o rei da cocada preta. Maçante, aperreador e insípido. Aparecido Raimundo de Souza, de Santa Rita do Passa Quatro, interior de São Paulo.
Comentário ao Anônimo das 20:06.
ExcluirEu e a morte estamos quites. Não tenho medo dela, tampouco ela de mim. Comentei isto com uma amiga, a Ligia da Anteninha Verde. Sabe o que ela me respondeu? Nada! Absolutamente nada. Furioso, eu gritei, na verdade, queria lhe dar um susto. "Olha a sua sogra". Para meu espanto, Ligia caiu dura e nunca mais abriu os olhos. Foi enterrada dia seguinte ao lado do pai, que partira coisa de três meses. Aparecido Raimundo de Souza, de Santa Rita do Passa Quatro, interior de São Paulo.
Comentário ao Anônimo de 20:03.
ExcluirA vida me ensinou a não ter medo dos que já se foram, mas dos que ficaram. Estes são as nossas fodas eternas. Insistem em mamar nas tetas do poder. Mas se estão mamando... como estão mortos? Explico. Mortos porque essas desgraças morreram por dentro, morreram na alma, na dignidade e seus comparsas se esqueceram de levar seus restos para os quintos do inferno. Aparecido Raimundo de Souza, de Santa Rita do Passa Quatro, interior de São Paulo.
E POR FALAR EM MORRER...
ResponderExcluirFINALMENTE ACABA DOMINGO A ELEIÇÃO!
PENSEI QUE SUCUMBIRIA A ESTA, QUANDO O MUNDO QUASE ESTACIONA, PARA VOLTAR DEPOIS NO MESMO DE DANTES! TAL QUAL AQUELE OUARTEL...
EITAAAA!
PAIZOTE
Como diria meu saudoso tio, infelizmente já falecido:
Excluir"-Eita mundão velho!"
"Velho, acabado, entristecido e sem porteira". Obrigado pela sua participação. Volte sempre, Anônimo de 23.10 com a participação publicada às 20:08. (Aparecido Raimundo de Souza, de São Paulo, capital).
ExcluirResposta à Paizote no comentário de 23.10, às 19:25. Espero que neste final de ano não morra mais ninguém. 22 velórios chega a ser espantoso. Estive exatamente em 22. Uma coisa interessante notei em todos eles. Sem exceção. Nenhum dos falecidos se levantou para vir falar comigo e agradecer por ter ido prestar as últimas homenagens. Nem Angela cantou a música que mais gosto. Essa galera toda me viu e ficou quieta. Em conclusão: defunto tem cada mania! Espero que no quartel de Abrantes... tudo fique como dantes... (Aparecido Raimundo de Souza, de São Paulo, Capital).
ExcluirSensacional Mestre Aparecido/jorn.
ResponderExcluirVc. e bom demais!
Melhor ficar mais e bem mais entre nós.
Esse negócio de morrer não dá não. Rs
De fato, caríssimo Unknown. Esse negócio de morrer, não rola. Deixa a gente sem vida. Obrigado pela sua participação.
Excluir(Aparecido Raimundo de Souza, de São Paulo, Capital).
ResponderExcluirVs Rocha
23 de outubro de 2012 ·
Hoje quero falar sobre perdão e morte.
Morrer não é um castigo, morrer é uma necessidade da natureza Em 1950 tínhamos 1 bilhão de habitantes, hoje somos 7 bilhões, se ninguém tivesse morrido, hoje seríamos canibais. Acho que não preciso explicar porque, visto que os alimentos crescem aritmeticamente e os humanos geometricamente.
Sem falar em religião, desde há muito os cientistas sabem que cada humano degrada 1 hectare de terra em cada 70 anos de vida, sendo assim importante dizer que a população ideal do planeta terra seria de 1,4 bilhões de humanos.
Outra importante nota é que se leva outros 50 anos para que as terras degradadas, voltem a produzir como antes.
Devemos reproduzir o teorema de Lavoisier:
- Nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.
Animais desaparecem, porque a população humana, a agricultura, os animais domésticos, e a pecuária destroem os habitats naturais destes, é a lei de Lavoisier sendo administrada pela própria natureza.
Morrer é preciso, para que outros possam crescer.
Então a morte é merecida a qualquer um, não acredito em fatalidades, destino, mas em erros humanos. Minha concepção de vida, não admite lembrar que os que morrem somente fizeram o bem, fizeram maldades em prol de suas benesses, e mesmo lembrando dessas ironias do destino, todo mundo as esquecem de propósito, ou por benevolência, como se nós tivéssemos que nos arrepender pelos falecidos.
Perdoar é um ato de deuses, aos humanos é proibido.
É proibido perdoar aqueles que se intrometem nas leis naturais, ou aqueles que passam por cima dos outros para locupletarem suas vidas.
É crime matar, prevaricar, abusar do poder, e podem me criticar, mas crime não se pode valorar.
Fica sempre a pergunta objetiva e simples:
- Pode a natureza nos perdoar?
bom dia...
Boa noite caro amigo Vanderlei Rocha. Bela explanaçao. Faço minhas as suas palavras publicadas em 24 de outubro. Obrigado por ter participado e desculpe a demora da resposta. Volte sempre. (Aparecido Raimundo de Souza, de São Paulo, Capital).
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