Era uma vez um país. Indisciplinado. Com falta de organização. E com um
currículo terrível: sempre que viveu em Democracia, faltou-lhe o juízo para ter
contas públicas em ordem. Primeiro os seus cidadãos pensaram que era do sistema
político. E acabaram com a Monarquia Constitucional. Mas a Democracia manteve
os vícios, particularmente a clientela que vivia do Orçamento. Como essa
Democracia não funcionou, optou pela Ditadura. Aí as coisas melhoraram: o
défice desapareceu e a dívida recuou. Mas foi um equilíbrio falacioso. Resultou
de o governo desse período ter aplicado uma "cinta" ao Estado. De tal
modo que, quando novamente em Democracia, as coisas voltaram a descambar. Ao
ponto de em apenas vinte anos o país ter voltado a perder o controlo das contas
públicas.
Este é o retrato do Portugal
democrático e das suas finanças públicas. "Então o que nos resta? A
Ditadura?", perguntará o leitor. Não. O que nos resta é um confronto com o
nosso Destino: abstrair-nos da conjuntura para pensarmos naquilo que, estruturalmente,
está mal. E que, volta e meia, nos atira para rupturas de pagamentos. Como
aconteceu em 1892 (verdadeira bancarrota) e 1978, 1983 e 2011 (pré-ruptura).
Quando se olha para o problema
com distanciamento, há uma coisa que salta à vista: a nossa governança é
medíocre. Alguma coisa está mal com um sistema que não aprende com os erros. E
já são muitos: em 35 anos foram três momentos de pré-ruptura de pagamentos!
O mínimo que podíamos esperar
é que tivéssemos aprendido alguma coisa com essas quase-bancarrotas. Como se
viu em Março de 2011 não só não aprendemos como temos meia classe política a
defender políticas que, se aplicadas, terminariam numa 4.ª pré-bancarrota.
Como mudar isto? Mudando
mentalidades (é esse o desafio do livro "Saiam da Frente!"): de nada
adiantará fazer sacrifícios brutais, como os que estamos a fazer agora, se,
quando livres do polícia que temos à porta, voltarmos a dar "shots"
na veia. Estou certo que a maioria dos leitores estará agora a perguntar como é
que se faz isso. Porque as tentativas já feitas (criar novos partidos) não
serviram para nada…
É verdade. Mas o caminho tem
de ser outro: mudar os partidos (existentes) por dentro. Essa missão tem de ser
precedida por outra: mudar a mentalidade do cidadão comum (não das elites –
essas são indigentes). Sim, daquele a quem chamamos depreciativamente "Zé
povinho". Enquanto esse cidadão não mudar o "chip" e entrar em
modo de "exigência" (para com a classe política) o país não muda.
É difícil fazer isso? É. Desde
logo porque leva tempo. E porque isso implica, também, perdermos o temor pelos
políticos que fizeram a Democracia, mas não souberam fazer o Desenvolvimento. E
que se continuam a arrastar por aí como se fossem os donos do nosso Destino.
Quais pais com filhos que já entraram nos trinta, mas a quem querem determinar
as escolhas…
Título e Texto: Camilo Lourenço, Jornal de Negócios, 25-12-2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-