Temos
um problema: a divisão a que assistimos no país político não é artificial.
Qualquer pessoa que saia de casa com os ouvidos abertos percebe que ela
reflecte fielmente uma enorme divisão na sociedade. Como é que se resolve este
terrível impasse?
Miguel Pinheiro
Pedro Passos Coelho vestiu
finalmente a armadura. Ontem, avisou os seus adversários que se arriscam a
ficar na História como “golpistas” e sugeriu uma solução radical para o actual
impasse político: a realização urgente de uma revisão constitucional
extraordinária que permita a imediata antecipação das eleições. Era a
consequência natural do pântano que o PS criou. Naturalmente, o líder do PSD
não acredita que seja possível mudar a Constituição agora, à velocidade da luz.
O objectivo da sua proposta é apenas o de deixar escrito em pedra que não
aceita a situação em que estamos.
Portugal está a tornar-se numa originalidade política. Muito
em breve, teremos algo que até hoje só se vira em países ocupados por tropas
estrangeiras: existirá um governo legal e um governo no exílio. Tanto António
Costa como Pedro Passos Coelho se apresentarão como primeiros-ministros
legítimos, invocando um a Constituição e o outro a moral. Um estará em São
Bento, o outro estará na São Caetano; um liderará um governo, o outro liderará
um governo-sombra; um tomará decisões, o outro prometerá reverter as decisões
tomadas.
Não é uma situação sustentável. Para chegar ao poder, António
Costa precisou de criar um estado de excepção política; mas, para se manter no
poder, precisa que esse estado de excepção política acabe rapidamente. Por isso
é que disse à “Visão” esperar que “o ressabiamento nervoso da direita passe
daqui a uns meses”. Sucede, porém, que o líder do PS não tem poder para acabar
com ele sozinho e não terá a ajuda de ninguém. A extrema-esquerda precisa da
excepcionalidade para continuar a pressionar o governo a ceder às suas
crescentes exigências e a direita precisa da excepcionalidade para tentar fazer
cair o governo.
Em 1986, quando Diogo
Freitas do Amaral perdeu as eleições para Mário Soares, várias pessoas foram
para a rua com um autocolante na lapela com a frase “O meu presidente é o
outro”. Hoje, a situação é pior.
O grande problema é que esta divisão do país político não é
artificial. Qualquer pessoa que saia de casa com os ouvidos abertos percebe que
ela reflecte fielmente uma enorme divisão na sociedade. Em 1986, quando Diogo
Freitas do Amaral perdeu as eleições para Mário Soares, várias pessoas foram
para a rua com um autocolante na lapela com a frase “O meu presidente é o
outro” – mas esse acto de contestação política durou escassos dias porque, na
verdade, não havia dúvidas sobre quem era o presidente de todos. Hoje, esteja
no governo quem estiver, metade do país anda com um autocolante metafórico a
dizer “O meu primeiro-ministro é o outro” – mas agora essa sensação de
alienação ameaça prolongar-se.
Como é que isto se resolve? Só há duas soluções. Uma: esperar
que o pântano desapareça sozinho. Outra: fazer eleições o mais rapidamente
possível. Em democracia, os pântanos têm tendência para se eternizarem,
enquanto o voto tem o hábito de resolver tudo.
Título e Texto: Miguel
Pinheiro, Ponto 3,
13-11-2015
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