André Azevedo Alves
Sampaio da Nóvoa ama tanto a
liberdade que quer evitar que os jornalistas abusem dela fazendo perguntas
inconvenientes. Tal como nem sequer consegue definir o seu posicionamento face
ao 25 de Novembro
A recentemente lançada
biografia de Sampaio da Nóvoa – apresentada por Vasco Lourenço e Pacheco
Pereira na Associação 25 de Abril – tem por título “Evidentemente, a Liberdade”
mas, infelizmente, a relação do referido candidato presidencial com a liberdade
é tudo menos clara e evidente. Embora – tal como acontece no título da
biografia – a liberdade seja um valor frequentemente invocado pelo candidato,
tanto a prática da candidatura como o passado e o presente político de Sampaio
da Nóvoa deixam muito a desejar dessa perspectiva.
Começando pela candidatura, é
absolutamente lamentável a queixa apresentada por Maria do Rosário Gama –
dirigente da APRe! (associação de Aposentados, pensionistas e reformados) e
mandatária para a “Cidadania Sénior” de Sampaio da Nóvoa – contra o jornalista
José Rodrigues dos Santos. Como a tentativa de intimidação e condicionamento
levada a cabo pela mandatária não foi prontamente desautorizada por Sampaio da
Nóvoa, é legítimo considerar que a mesma se insere na estratégia da
candidatura. É caso para concluir que Sampaio da Nóvoa ama tanto a liberdade
que quer evitar que os jornalistas abusem dela fazendo perguntas
inconvenientes.
A fazer fé nas sondagens
conhecidas até ao momento, existe uma possibilidade real de o candidato Sampaio
da Nóvoa passar à segunda volta nas eleições presidenciais. Faz por isso todo o
sentido escrutinar também o passado político do candidato e tentar ir além das
proclamações grandiloquentes e plenas de chavões mas vazias de conteúdo com que
habitualmente brinda quem o escuta. Infelizmente, essa é uma tarefa difícil já
que, além da sua passagem pela LUAR (Liga de Unidade de Acção Revolucionária) e
da sua constante evocação dos “valores de Abril” e do “anti-fascismo”, pouco é
possível saber.
Relativamente ao passado, é
sintomático também que o candidato Sampaio da Nóvoa nunca tenha renegado
explicitamente os seus tempos de radicalismo revolucionário. Como
pertinentemente assinalou Diogo Freitas do Amaral numa recente entrevista à
TVI24, não é de todo claro o posicionamento de Sampaio da Nóvoa relativamente ao
25 de Novembro de 1975. E isso é grave para um candidato que, presumivelmente,
pretende ir além da extrema-esquerda e cativar também votos da esquerda
democrática.
Para quem preza a liberdade, o
presente político de Sampaio da Nóvoa não é mais animador. As duas principais
forças partidárias que apoiam oficialmente o candidato são ambas de
extrema-esquerda: o PCTP-MRPP (que obteve cerca de 60.000 votos nas últimas
legislativas) e o Livre (que se ficou por pouco mais de 39.000 votos). Não é
possível ignorar, claro, que há uma parte do PS que também apoia Nóvoa mas nem
isso é tranquilizador, já que se trata da facção radical que encara como
positiva a constituição de uma frente governativa com a extrema-esquerda.
Daí que o mais preocupante em
Sampaio da Nóvoa não sejam a quase absoluta falta de experiência politica nem o
confrangedor vazio do discurso, mas o que esse vazio oculta. O candidato que
corporiza a “geringonça” frentista é um produto típico daquela que é porventura
a mais radicalizada micro-cultura do país: as faculdades e departamentos de
ciências sociais e humanidades das universidades estatais.
À semelhança da investigadora Raquel Varela, o ex-Reitor – e depois director da
iniciativa de Políticas Públicas da Universidade de Lisboa – Sampaio da Nóvoa
evidencia uma concepção de “liberdade” própria das elites revolucionárias. Que
em 2016 um candidato assim tenha reais possibilidades de passar à segunda volta
mostra bem o estado a que o país chegou.
Título e Texto: André Azevedo Lopes, Professor do
Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, Observador,
9-1-2016
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