Tiago Dores
Está tudo tão inquieto com o alegado pulmão
do mundo e não sobra nem um bocadinho de histeria para o hipotético esfíncter
do planeta, de seu nome China? Curioso.
Assim como Roma teve Nero, o
Brasil tem Bolsonaro. Os dois mais notáveis pirómanos da História. Nero
incendiou Roma e, consta, tocou lira enquanto assistia ao fogo. De Bolsonaro
não há indícios que tenha tocado fogo à Amazônia — para já, mas deixem os ativistas
trabalhar! –, agora a forma como incendiou as relações internacionais à conta
deste tema foi espetacular. E o pódio da piromania internacional não ficaria
completo sem um representante lusitano. Num honroso terceiro lugar fica o bem
português Pirômano Desconhecido, em homenagem à horda de ateadores de incêndios
não identificados que todos os anos provocam os fogos que indignam os
portugueses. Menos, desde 2015, Catarina Martins, que enquanto é toda ela
compreensão para com os fogos nacionais se indigna forte e feio com os fogos
brasileiros num escandaloso assomo de intolerável xenofobia.
De entre os líderes
internacionais irados com Bolsonaro a bicicleta vai para Emmanuel Macron.
Perante a suposta passividade do governo brasileiro face à destruição do “pulmão
do mundo que produz 20% do oxigênio do planeta” o presidente francês não
escondeu a sua indignação. Já o verdadeiro motivo da indignação o estadista
ocultou bem ocultado. E a revolta tem a ver de facto com oxigênio, mas apenas
na medida em que Macron receia que o Brasil de Bolsonaro, tendo mais área para
produzir fruta tropical da bem docinha e podendo exportá-la para a Europa,
sufoque a indústria das desenxabidas peras e maçãs gaulesas. Como sempre, são
as grandes questões geopolítico-hortifrutícolas que definem o destino das
nações. “Sim, pá, mas o Bolsonaro é um grunho!” É, mas as duas questões não são
mutuamente exclusivas.
Além de que mesmo a ser
verdade que a Amazônia produz 20% do oxigênio do planeta — não quero estragar a
surpresa a quem ainda não googlou, mas sim, trata-se de um barrete de todo o
tamanho — e se esse oxigénio desaparecesse todo por culpa do Bolsonaro qual era
o drama? Não só não era um problema como até era bom para a saúde. Por exemplo,
para uma pessoa com uma pulsação de 80 batimentos por minuto bastava treinar um
bocadinho e baixar esse valor em 20% para as 64 pulsações por minuto. E pronto,
gastávamos menos oxigênio, andávamos mais relaxados e ainda corríamos menos
riscos de contrair problemas cardíacos. “Tudo bem, agora o Bolsonaro é uma
besta, pá!” Certo, mas de que forma isso invalida o meu sagaz argumento?
Mas o mais surpreendente neste
achaque internacional com o Brasil do tipo “O ar é de todos”, além do
travozinho a neocolonialismo, é o óbvio preconceito orgânico que ele encerra.
Então está tudo tão preocupado com a qualidade do ar e com a Amazônia, está
tudo tão inquieto com o alegado pulmão do mundo e não sobra nem um bocadinho de
histeria para o hipotético esfíncter do planeta, responsável por 30% do dióxido
de carbono libertado para a atmosfera, de seu nome China? Curioso.
Talvez por ser mais seguro
fazer bullying ao miúdo que ainda é primo afastado do que ao puto desconhecido
que é especialista a passar indivíduos a ferro com um tanque no Grand Theft
Auto Tiananmen e para quem Hong Kong significa Porrada Neles. “Eh pá, mas o que
é inegável é que o Bolsonaro é um bronco!” Sem dúvida, embora isso em nada
desvalorize este importante ponto.
Enfim, saudade para os
governos de Lula da Silva. Com o Lula os fogos na Amazônia eram estupendos
fogos. Eram fogos fecundos que geravam habitats com ainda mais diversidade de
espécies ao permitirem que os nutrientes das plantas voltassem ao solo onde,
graças ao calor gerado pelo lume, germinavam novos tipos de sementes criando assim
condições benéficas para que a vida selvagem prosperasse. “Sim, sim, pá, só que
o Lula é um corrupto de todo o tamanho!” Pois, lá isso é verdade.
Título e Texto: Tiago Dores,
Observador,
28-8-2019
Relacionados:
A Amazónia em resumo: as fake news e a realidade
ResponderExcluirJosé Mendonça da Cruz
(Como profunda e respeitosa vénia a Charles Moore e Matt Ridley, da revista Spectator do Reino Unido, intensamente citados e copiados)
Cristiano Ronaldo é um perito de florestas português que joga futebol nos tempos livres e publicou online uma fotografia dos fogos na Amazónia que, dada a sua fama científica, se tornou viral. Com a pressa de sair do laboratório para o relvado, não reparou, porém, que a fotografia era de 2013, e não de 2019. E fora tirada no sul do Brasil, a alguns milhares de quilómetros da Amazónia.
Emanuel Macron é um biocientista célebre que nas horas vagas se ocupa da presidência da França. Macron divulgou uma fotografia dos terríveis fogos que devastam a Amazónia. A fotografia datava, porém, de há 20 anos.
Madonna é uma famosa biocientista que por vezes se apresenta a cantar em palcos, e que, também ela, publicou uma fotografia alertando para o desastre da queima da Amazónia. Bateu o recorde dos outros três especialistas: a sua fotografia tinha 30 anos.
«Os pulmões que produzem 20 por cento do oxigénio do planeta estão a arder», disseram peritos florestais como Macron, Sousa Tavares, Marques Mendes, e, em geral, os media da imprensa, rádio e televisão portugueses.
Na realidade, a Amazónia não produz oxigénio. Como qualquer ecossistema, consome mediante a respiração praticamente tanto oxigénio como o produzido por fotossíntese. O governador da Amazónia já tinha explicado isto há bastantes anos, mas os factos não convêm à «narrativa». (E, já agora, os pulmões não produzem oxigénio).
«A Amazónia está a arder» (mas só a de Bolsonaro)
A Amazónia não está a arder. A grande maioria dos 75 000 fogos ocorridos este ano deram-se em em terras de cultivo e áreas já deflorestadas, alguns iniciados por queimadas de que foi perdido o controlo. O número de fogos é muito maior do que no ano passado, mas o mesmo das ocorrências em 2016, e menor do que em 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2010 e 2012. Mas durante a maior parte desses anos o presidente do Brasil era um socialista (e corrupto), pelo que esses fogos não contam. Acresce que sendo o aumento do número de fogos no Brasil de 85% este ano, na Bolívia esse aumento é de 114%; mas, mais uma vez, sendo Morales socialista, os números da Bolívia não valem. O que vale é que pobres ministros de um governo socialista que deixou arder 100 pessoas em fogos ocorridos numa extensão comparativamente ínfima critiquem e ensinem coisas aos brasileiros.
Alguém dizia que nas sociedades modernas há muito quem tenha substituído as religiões pela adoração do homem e da natureza. Esta adoração ignorante da Amazónia, traduzida em ataques ao presidente do Brasil, que relevam da pura intoxicação política, e ataques ao Brasil (que resplandecem de intromissão em assuntos da soberania interna e escondem mal uma apetênica neocolonialista -- «progressista», agora) repetem o mesmo sombrio caminho das velhas disputas sobre a soberania dos Locais Sagrados, que deram origem a tantos aventureirismos políticos e militares em séculos passados.
José Mendonça da Cruz, Corta-fitas, 29-8-2019
FOGO!... quem o apaga?
ResponderExcluirDesde que Bolsonaro foi empossado Presidente a política nacional não é mais a mesma: morna, insossa, sem atrativo. O povo em geral se politizou e participa dos debates ávida e ativamente. Quem justamente incendiou, quem botou fogo no cenário do debate político nacional em curso foi o próprio Presidente pelo seu caráter misto de sanguíneo e colérico. Não se vê nele traços de melancolia ou fleumáticos. (investigue, caro leitor, em que caráter você mesmo se enquadra, se é incendiário também)... Há focos de incêndio em todos os temas políticos em discussão, desde a liberação de armas de fogo, proposituras de reformas incendiárias como a Previdenciária, Política, Econômica e outras mais por vir, fora os incêndios provocados por demissões de ministros e qualquer palavra ferina de improviso que profere no caminho do Palácio do Planalto. A fogueira da Amazônia é a bola da vez, proporcionando um debate feroz em que o fogo salta das narinas de Bolsonaro chamuscando autoridades nacionais e internacionais... A uns Bolsonaro representa a esperança por dias melhores, a outros um anúncio de desastre nacional... Seus eleitores o idolatram e veem nele o messias salvador e qualquer atitude incendiária dele os faz vibrar. O tempo nos dirá se o fogo bolsonarista vai ser benéfico ou necessita de chuva para que não se alastre descontrolado...
Valdemar Habitzreuter