Percival Puggina
“Será que adianta?”, perguntam-me muitos
leitores. É o que adianta. Durante décadas, as manifestações de rua no Brasil
careceram de legitimidade, eram manipuladas a “um sanduba e dez real”, e não
mereciam ser tomadas em conta. Mais do que cidadãos querendo expressar-se,
envolviam pneu queimado, piquete de grevistas e “miguelitos” para impedir a
circulação. Visavam, no velho perfil totalitário, impor à nação inteira as
pautas corporativas e eleitorais da vez.
As atuais mobilizações
envolvem grandes temas, focam legítimos e consistentes anseios de parcela
expressiva da opinião pública: combate à corrupção e à impunidade, segurança
pública, redução do tamanho e peso do Estado. Houvesse sintonia entre a nação e
suas instituições, seriam desnecessárias. Mas o fato é que, como de hábito, a
opinião pública vai para um lado e elas para o outro. Alias, entre os fatos
altamente positivos destes últimos anos sublinho a crescente consciência de que
temos instituições e de que há, nelas, gravíssimos problemas.
Até recentemente, não chegava
a dois dígitos em todo o país, ou seja, contavam-se nos dedos do Lula, os colunistas
que, como eu, identificavam e abordavam tais questões. Hoje, esse número
aumentou. Infelizmente, porém, aumentou incluindo os do contra. Chutando o
balde da Razão, eles cobram reverência popular às instituições nacionais, cuja
existência e conexões acabam de descobrir, afirmando que elas “estão cumprindo
seu papel” e que o povo deve aceitar com submissão a regra que o exclui,
permanecendo em casa, assistindo-os dizer isso na TV.
Não! As instituições não são
confiáveis! Já o revelaram com excesso de evidências. Protegem-se
reciprocamente num círculo de ferro. Estão em flagrante dissintonia com a
sociedade. Nos longos anos de desatenção nacional, à sombra do desinteresse
geral, desenvolveram o talento de entortar boas ideias, contornar o bem, tangenciar
a verdade para, depois, enterrá-la viva, em posição vertical, sob toneladas de
falácias. Exercem, na plenitude, o silencioso poder dos arquivos! A quem julgam
enganar quando dizem aprovar uma lei contra o abuso de autoridade para proteger
o “cidadão comum”?
As redes sociais e o povo na
rua me enganam menos, me respeitam mais e – creiam! – me representam melhor.
Enfim, para ser bem entendido:
os bons congressistas (e eu conheço muitos que correspondem a esse conceito)
precisam dos cidadãos para constituírem maioria e cumprirem o que a história
está a lhes exigir. E o STF precisa saber de nossa total inconformidade com um
colegiado onde não há sequer um conservador, onde não há um único liberal, e
que eles, os onze, são sequelas de uma grave doença que acometeu o país. Só em
países totalitários vamos encontrar supremas cortes tão rompidas com a nação a
que deveriam servir.
Título e Texto: Percival
Puggina (74), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto,
empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo;
Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do
grupo Pensar+. 22-8-2019
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