Aparecido Raimundo de Souza
DIZ UM VELHO AXIOMA, por baixo de sob má capa jaz um excelente pinguço. É o meu jeitão e bem
posto que aos outros deixa na crença de que eu de nada sou. Mas nunca ninguém
nem me não viu trocando as pernas, chamando urubú de meu louro, ou disfarçado
de poste, em alguma rua deserta, fazendo xixi em cachorro. Memos ainda beijando
mulher feia, por mais que eu tivese em antes derramado à impostura por cima de dentro da goela. Mantenho a linha
e as idéias, ainda que o mundo fique girando em ao redor de mim mesmo, como se
eu fora solitário sol de um sistema planetário de cachaça e de batida...
Razão tenho de para ser comedido em nas minhas beberagens. Quem tem rabo
de palha até de vaga-lume sente medo. Por falar em rabo, me recuso
terminantemente a me sentar-me de traseiro em poltrona menor que os glúteos não
me caibam, porque conheço, de antemão, meus favorecimentos naturais. Falar
alguma coisa além do aqui está dito, é igual contrariar a concepção original e
intelectual de que uma onça, embora tenha quatro patas, poderá pegar quatro caminhos diferentes.
Voltando ao foco, num desses aqueles dias doidos, eu saí da linha feiamente.
Todo jacaré tem seu momento de lagartixa, e me apequenei-me em num
pileque brabo de confudir vela com osso, alhos com bugalhos e caçar rolinha com
caçarolinha. Me envergonhei-me do passado vexame. Não sou de catar piolho em
calvície. Buscar agulha em palheiro é querer dar nó em junco. Tenho os meus
quereres e vontades fundamentadas. Vou ao no
que vou. Por uma coisa mantenho ponto-de-vista fechado: não gosto de
bicha. Me explico-me: que por nome de bicha não quero dizer a fila dos
portugueses, mas o aquele que não procura
prazer natural do sexo completamentar, na querida metade.
Por bicha chamo o desnaturado que só se denga meloso a abusar da maçaneta
para um outro de igual sexo e idêntica falta de gosto. Entre mulher velha,
desdentada e medonha, e um traveco bonito e jovem, não careço nenhum, ainda que
se o mundo estivesse para acabar, eu ficaria com a engelhada, ou, no pior dos
castigos, partiria para solitárias manobras arejando a pevide ou afogando o ganso numa bacia de privada de
banheiro de rodoviária. Sozinho vivo até hoje. Em casa de ferreiro, espeto de
amieiro: se muita mulher conheço, no ora-veja me quedo-me na minha própria
privança.
Nos domingos e feriados, tir-te de para lá os estorvos, que D. Juan sou
eu mesmo, sem falsa modéstia. Por mais longo que o verão, não seca a água onde
há agrião. Para a bela oposta faceira e gostosa estou sempre pronto, por menor
que a abstinência. A idade é besteira. Se tenho sessenta e sete anos no
avançado da vida, conto só vinte na ânsia de continuar firme e forte. A idade
dos janeiros e marços vividos é o que um sente, não o que fica aniversariando,
contando velinhas e recebendo “parabens” sem mérito. Reza a lenda dos antigos,
que em fogo velho arde melhor a lenha verde.
Aí foi que num dia de ogano estava eu em num bar, manguaçando as tripas
com os meus amigos, quando ela surge esplendorosa e esfuziante em uma minissaia
que nem nunca tão curta eu vi. E nós todos a brincar perante com ela, a dizer
besteiras de sobre sua visível formosura. Ela calada muito ficou, até que umas
poucas disse, me dando atenção de preferência. Se belo e inimitável me pareceu
o visual, ruim de por tudo era o áudio: uma voz de taquara rachada, de vadia
louca, inconfundível. A boi ruim é que a ele lhe crescem melhor os cornos.
Por que é que em numa tanta elegância havia de fincar-se essa voz de falsete? Sei que vexame às vezes
a gente passa, por enganar-se com coisa pouca. Meus companheiros riram, e até
me aplaudiram quando lasquei um tapa por cima de na bochecha da sem-vergonha.
Sóbrio de todo, não sou de agredir ninguém. Mas bebido um pouco eu até que
tinha, e, ainda por cima, não gosto que de bobo me façam. Sê besta! De puta é
distancia que eu quero. Vai que ela recua com a tapona, e, o ver que eu no
masculino a batizara, levanta a minissaia, zangadamente, com uma sem-cerimônia
nenhuma, baixa até os joelhos a rendada
calcinha de muito azul: ali eu vi o que só mulher feminina tem, de muita
sedução e leve penugem.
Acho que nem não havia risco de ninguém não se enganar. Parecia que
legítima, com sem nem tirar nem pôr. No ao que ela se recompõe-se, me
envergonhei-me demais. Meus amigos também sentiram o vitupério do embuste, e
muitos pedidos de por desculpas lhe fizemos ouvir-nos, em nosso ferido orgulho
de conhecedores. Mas que o som de sua boca se igualava como de muita mundana
que ouvi, eu nem não tinha como não achar. E a trouxe-a para até a mesa, com
duzentos dedos, dando-lhe um braço e lhe falando mesuras ao pé do ouvido. O tempo passamos na chupetação
de com muita pinga e cerveja; eu até dos amigos me esquecera-me, e só me fizera
mãos, dedos e olhos para com a majestosa, cuja eu nem queria mais ouvir a
destoante dicção, porque meu tato se escondeu encabulado e surdo.
Figo doce em na rocha má nem pardal faminto não come. Aquele sotaque
estragava tudo. A certa altura, eu nem deixava que a falação dela me cortasse a
gana. Em na primeira sílaba que ela tentava emitir, eu lhe entupia a boca de
com beijos prolongados num entrelaçamento de linguas e salivas para observantes
nenhum botarem uma pontinha de defeito. Altas horas decidimos que o pra-frente nos carinhos não
se fazia possivel mais em dentro de um tão público local. Gosto de ficar
sozinho com uma, sem com esses olhares curiosos para o bem-bom. É na privança
que se faz criança.
No meu apartamento chegamos. Perguntei-lhe a ela se na sala seria bom.
Ela graças a Deus nada não disse. Quem da fala se ausente é que em seu calado
consente. O ambiente preparo, meio trôpego de com tantas surbias misturadas aos vapores do álcool em demasia,
mas na decidida vontade de me tirar-me do jejum: fecho as cortinas, acendo a
meia luz, ligo a suavidade de uma Amália Rodrigues na surdina, e um drinque
preparo, para o total desfazer de inibições, se alguma pudesse haver por da
parte dela. Quem o milho semeia não é feijão que colhe. Que esperar de tanto
líquido a me entupir-me o papo?
Acho que ela, nua estava, no tapete, sem nada a cobrir-lhe os pudores,
estendida, a me esperar-me sorrindo. Há dias onde em que a gente nem de casa
não deve de sair. Só sei que a submissão de não mostrar pra ela visualmente a
vontade que eu tinha, somei um outro de sujá-la toda: no que me preparava para
me aconchegar-me a seu corpo, caí de tudo, como um tronco abatido, a
vomitar-lhe as belezas todas. E em só dia seguinte, sol alto, acordei, com a cabeça doendo, as partes
baixas em frangalhos, a boca amargando, e ainda mais sozinho do que sempre. A
casa revirada mostrava também que eu havia ficado um pouco mais pobre.
Ver, eu vi. Mas não toquei, e com todos os recursos modernos de safadeza
e de sem-descaramentagem, eu, lúcido, agora, nem sei ao certo, se ela era ele,
ou ambos, os dois, se constituiam a mesma pessoa numa só embutida. Que ultraje,
que vitupério! Deus do céu! Furioso, aturdido e colérico, me aplico-me safanões
em meio ao próprio rosto, me autoflagelando-me capiongando e me macambuzeando.
Qual um Darwin em pesquisa na Geena, sobrevoo a minha imbecilidade até a
exaustão, compungido, assaz, por tamanha
ignotia e assombrosa burrice.
Título e Texto: Aparecido
Raimundo de Souza, de Vila
Velha, Espírito Santo, 10-4-2020
Colunas anteriores:
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-