quarta-feira, 2 de maio de 2012

É a mesma língua ou são duas?

Márvio dos Anjos
Volto ao assunto mais surrado dentre todos os que nos unem quando fico sabendo que há editoras que exigem que certos livros portugueses sejam “traduzidos” para o português do Brasil.
Vou direto ao ponto: sabe-se que os brasileiros têm menos consoantes mudas (como diretor, seção) e mais vogais na fala, que consagramos estrangeirismos (turnê em vez de digressão) e também que preferimos o gerúndio quando nos delongamos em alguma ação (como o que estou fazendo neste texto, enquanto tu me estás a ler). Mas isso não significa que um brasileiro não possa ler um livro em europeu (se me permitem o atalho) – afinal, ler um livro é uma decisão. Logo, aceita-se de antemão a linguagem do escritor.
Camões, Pessoa, Saramago, Lobo Antunes, Gonçalo M. Tavares, João Tordo, Manuel de Oliveira, Amália, Mariza, António Zambujo, esses e outros são consumidos aqui nas palavras que escolheram, sem prejuízo, assim como os angolanos e moçambicanos. João Pereira Coutinho, colunista às terças da Folha de S.Paulo, faz-nos poucas concessões em seu texto, e seu discurso na cadência lusitana é sempre um charme a mais. É como se nos tocassem num cravo as obras que nos habituamos a ouvir ao piano - e ainda assim se extraísse um som moderno.
Pode ser que em Portugal essa percepção não seja tão aguçada, uma vez que nossas novelas e canções são frequentes aí. Talvez ainda seja preciso abrir mais portas lusas à literatura contemporânea brasileira. Mas os que gostam do nosso jeito de falar, cantar e escrever normalmente apontam que há frescor, musical, coloquialidade praieira, qualquer coisa de Novo Mundo. Os que detestam detestam e ponto.
O que não quer dizer que uma peça de publicidade escrita em europeu não causaria estranheza, se destinada fosse a brasileiros. Uma bula de remédio, um rótulo de comida, uma capa de jornal diário, ou seja, os itens de uma comunicação de necessidade, por assim dizer, precisam facilitar a compreensão do interlocutor, para que não haja ruídos nem piadas involuntárias. O mais é preciosismo tolo, ou tola mania de subestimar o leitor.
Título e Texto: Márvio dos Anjos, Destak

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