quinta-feira, 19 de setembro de 2013

A tática do morde e assopra para ganhar tempo

Irã diz que está pronto para desmantelar instalações nucleares subterrâneas
O Presidente Rouhani pode aceitar fechar as instalações de FORDO caso o Ocidente suspenda as sanções, segundo a matéria da revistal alemã Der Spiegel, com base em fontes de inteligência. Israel ainda não se manifestou a respeito
Francisco Vianna

Uma imagem de satélite das instalações nucleares de FORDO de enriquecimento de urânio. Foto: AP/Digital Globe
Num dramático desdobramento potencial, o Irã parece, mais uma vez, “disposto” a desativar as instalações de enriquecimento de urânio em FORDO, em troca de um alívio nas sanções do Ocidente via ONU, relatou a revista alemã Der Spiegel na segunda-feira.

A revista alemã, citando uma fonte de inteligência, reportou que o novo presidente iraniano, Hassan Rouhani, pode considerar o fechamento e destivação das instalações nucleares subterrâneas de FORDO, intensamente fortificadas, perto da “cidade sagrada” de Qom, e permitir que os observadores internacionais da AIEA da ONU supervisem de forma irrestrita suas centrífugas de enriquecimento de urânio para a produção de combustível nuclear para fazer funcionar os reatores para produzir energia elétrica e isótopos de uso médico, caso o Ocidente levante as sanções impostas pelo Conselho de Segurança da ONU e que afeta primordialmente a indústria petrolífera do Irã e o Banco Central do país.

Rouhani poderá fazer a oferta no fim deste mês de setembro na Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque, disse a reportagem da revista.
A descrita vontade do Irã em se comprometer foi suscitada logo depois do acordo russo-americano para destruir o arsenal químico da Síria de Bashar al-Assad, assinado em Washington após a movimentação militar americana no Mediterrâneo e com a finalidade de evitar um ataque mesmo que limitado à Síria.

Apesar das autoridades israelenses não terem comentado publicamente a matéria jornalística da ‘Der Spiegel’, comenta-se extraoficialmente que elas não acreditam nessa “abertura iraniana”, com base na tática habitual de Teerã de criar “falsos recuos e falsas expectativas” apenas com o objetivo de ganhar mais tempo na sua corrida para obter enriquecimento crítico capaz de produzir um artefato bélico termonuclear. De fato, uma autoridade israelense de primeiro escalão havia predito, em Jerusalém, na semana passada, que a primeira providência do novo presidente persa seria a de fazer semelhante oferta com o objetivo de aliviar as referidas sanções. A principal exigência israelense, já de longa data, tem sido a parada do Irã de enriquecer urânio e a remoção de todo esse material enriquecido do território iraniano a ser mantido sob custódia da ONU. O material pode já ter produzido uma quantidade considerável de plutônio em FORDO, suficiente para a produção de uma bomba termonuclear.

Recentemente, o Primeiro-ministro de Israel, Netanyahu, disse que “Israel está determinado em insistir com as exigências suas e da comunidade internacional de, primeiro, parar toda a atividade de enriquecimento de urânio; segundo, remover todo o material enriquecido, e, terceiro, fechar e desativar as instalações nucleares ilegais de FORDO em Qom. Acreditamos que agora, mais do que nunca, em face dos progressos iranianos nucleares, é importante não apenas intensificar as sanções econômicas já impostas, como também estabelecer uma clara opção militar destinada ao Irã”.

O atual Ministro das Relações Exteriores, Javad Zarif, está agendado se encontrar com seu par da UE, Catherine Ashton, no próximo domingo em Nova Iorque a quem explicará a oferta de Teerã em maiores detalhes, segundo a revista alemã. A esperada medida de Rouhani poderá por em movimento um processo de negociações que poderá culminar no restabelecimento das relações diplomáticas entre o Irã e os EUA, escreveu a revista.

A possível predisposição de se comprometer em abrir suas atividades nucleares de forma irrestrita à supervisão da AIEA se deve provavelmente à situação catastrófica em que se encontra a economia iraniana, amplamente asfixiada pelas sanções internacionais. Citando as mesmas fontes de inteligência, o articulista da Der Spiegel, Erich Follath, escreveu que o Irã só poderá evitar a falência caso as sanções impostas pela comunidade internacional sejam levantadas e dinheiro novo possa fluir para o país.

Entretanto, Follath também descreveu um possível acordo com o Irã como sendo um truque do regime islamofascista de Teerã, uma vez que permanece obscuro quem iria monitorar e desmantelar as instalações de FORDO e se os 185 quilos de urânio já enriquecidos em poder de Teerã passariam para a custódia da ONU para ser usado apenas na geração vigiada de eletricidade por geradores iranianos.
Também permanece a necessidade de se constatar quais as intenções iranianas com relação ao reator instalado em Arak, que o Ocidente desconfia que pode estar a enriquecer plutônio, um passo essencial para a fabricação de uma arma nuclear já em 2014. “Os iranianos, amigos ou inimigos hão de concordar que são mestres em tais manobras táticas para ganhar tempo”, escreveu Follath.

FORDO, um complexo nuclear subterrâneo fortificado, encravado numa área montanhosa ao sul da capital Teerã, foi construído secretamente e apenas revelado ao mundo graças a inteligência e capacidade de observação ocidental em 2009. Presentemente, cientistas iranianos estão a enriquecer urânio lá, com o uso de 696 centrífugas.
No último domingo, o presidente estadunidense Barack Obama advertiu Teerã de que o acordo patrocinado pela Rússia para evitar um ataque militar planejado e limitado à Síria não deveria ser interpretado como uma falta de vontade de Washington em adotar uma solução militar também para o impasse atual da ameaça nuclear iraniana.

O presidente iraniano Hasan Rouhani a falar no Parlamento em Teerã, Irã, em 15 de agosto último. Foto: AP/Ebrahim Noroozi/File
"Acho que os iranianos entendem que a questão nuclear é uma questão muito maior para nós do que a questão das armas químicas na Síria; que a ameaça [...] contra Israel feita abertamente por um ‘Irã nuclear’ faz com que ela seja tratada com muita prioridade em face dos nossos mais centrais interesses", disse Obama numa entrevista para a ABC. Disse ainda que “suspeita que os iranianos, por eventualmente não termos atacado a Síria, entendam que não atacaremos também o Irã, caso a segurança do Oriente Médio e a própria estabilidade mundial esteja iminentemente em risco”.

Obama declarou que trocou correspondência com Rouhani, mas que ambos ainda não se falaram pessoalmente e ao vivo. Explicou ainda, a seguir, que acredita que Rouhani entendeu o potencial de uma solução diplomática para o controverso programa nuclear do seu país, mas que não se pode “torná-lo, assim de repente, uma coisa fácil de ser concretizada; se existe uma ameaça crive de uso da força militar, combinada com um esforço diplomático severo, pode-se chegar a um acordo”. Na segunda-feira última, a Casa Branca negou que Obama encontrar-se-ia com Rouhani em oportunidades paralelas à Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque.

As declarações de Obama sobre o programa nuclear do Irã foram ecoadas por Netanyahu, no domingo após uma reunião com o secretário de Estado dos EUA, John Kerry, em Jerusalém.
"O mundo precisa garantir que regimes radicais não tenham ‘armas de destruição em massa’, porque, como vemos mais uma vez, na Síria, caso regimes desonestos tenham tais armas, eles provavelmente irão usá-las", disse Netanyahu. "A determinação da comunidade internacional exibida no caso da Síria terá um impacto direto sobre patrono do regime sírio, o Irã. O país persa precisa compreender as consequências de seu desafio contínuo à comunidade internacional, por sua busca em direção às armas nucleares... Caso a diplomacia tenha alguma chance de trabalhar, seus esforços devem ser apoiados por uma ameaça militar crível e dissuasiva".

A inteligência e ministro de Assuntos Estratégicos Yuval Steinitz, de Israel, em agosto último previram que Rouhani tentaria conquistar o Ocidente, oferecendo a suspensão e o enriquecimento de urânio em troca de uma redução das sanções.
"Ele dirá ao Ocidente, exatamente como fez em 2003 [quando Rouhani foi o principal negociador nuclear do Irã]: 'Vamos fazer um acordo interino. Vou fazer algumas concessões aqui... Vocês façam algumas concessões aí", disse Steinitz à imprensa. "Só que, depois disso, [Rouhani] vai solicitar reciprocidade... E é extremamente importante que não lhe seja dado tal margem de manobra".
Título e Texto: Francisco Vianna, (da mídia internacional), 19-9-2013

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