domingo, 8 de setembro de 2013

Adivinha quem (não) vem para o jantar estatal em Washington?

O Brasil, que cancelou sua vinda por causa dos vazamentos de informações secretas da NSA...
Taylor Barnes

Foto: Pablo Martinez Monsivais/AP
A presidente brasileira Dilma Rousseff suspendeu as medidas preliminares para a sua “visita de estado” a Washington, marcada para outubro próximo, alegando motivos de espionagem americana em sua correspondência pessoal, o que pode reverter uma tendência que vinha aumentando de tornar as relações entre Brasil e EUA mais positivas.

A Presidente Rousseff cancelou os trabalhos iniciais de sua equipe avançada de logística que preparava o terreno para a única “visita de estado” a ser recebida pela agenda da administração Obama para este ano. Tal visita é uma honraria reservada apenas aos melhores sócios de Washington – incluindo um jantar ‘black-tie’ e uma recepção militar – e o convite feito pela Casa Branca em maio último a Brasília foi visto como um avanço em termos de relações bilaterais entre os dois países.

Mas essas relações azedaram e se tornaram tensas depois que vazamentos ocorridos em julho último de alegadas interceptações de milhões de telefonemas e e-mails enviados por cidadãos pelo Brasil afora, foram em seguida denunciadas nesta semana. Após a edição do último domingo do amplamente assistido programa ‘Fantástico’ da TV Globo, foi ao ar as alegações de que os EUA também espionaram a correspondência pessoal da Presidente Rousseff e de seus assessores, e o seu governo elevou o tom de indignação, enviando claros sinais de que a visita de outubro poderia ser cancelada.

”A indignação de Dilma Rousseff vai além da postura de quem quer ganhar poder de barganha com os EUA”, diz o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília. “Ela é bem genuína, uma vez que ela é uma pessoa de ‘pavio curto’ e destemperada”, complementa o Sr. Fleischer.

Um “jantar estatal” de tal alto escalão de compromisso internacional, sendo cancelado, poderia vir a ser um golpe para o prestígio de Obama; este jornal não encontrou precedentes na história de que tal “visita de estado”, uma vez anunciada, tenha jamais sido cancelada antes.

Evitar o fechamento de portas
Os documentos usados para substanciar as alegações de espionagem nesta semana vieram do ex-contratante da NSA (National Security Agency), Edward Snowden. Eles não mostram mensagens específicas que alegam terem sido interceptadas – como foi o caso do ocorrido com o presidente mexicano Enrique Peña Nieto – entretanto, houve afirmações que sugeriram ter a espionagem realmente ocorrida. Um dos slides dizia, “crescente compreensão de métodos de comunicação”, de Dilma Rousseff e seus assessores, era um “objetivo da agência”, que foi acompanhado por outra referência a certa equipe de dados que “foi capaz de aplicar com sucesso esta técnica contra alvos de alto perfil de eficácia da OPSEC brasileiros e mexicanos”.

O Ministro Paulo Bernardo, das Comunicações, de Dilma Rousseff, tem acusado os EUA de dar falsas explicações ao Brasil desde que a primeira estória de espionagem veio a público. “Tudo que nos foi dito à guisa de explicações desde o início desses episódios foi comprovadamente falso, tanto o que foi dito pelas embaixadas americanas quanto o que a nossa equipe escutou em sua visita aos EUA”, disse Bernardo. “Trata-se de espionagem de caráter comercial e industrial, pois é do interesse dos EUA saber sobre as reservas de petróleo do pré-sial e outros assuntos de peso econômico e comercial”, acrescentou o ministro, destacando que é risível a alegação americana de que a espionagem faz partes das medidas americanas contra o terrorismo.

Rousseff e Obama se encontraram extraoficialmente durante os intervalos da cúpula do G-20 em São Petersburgo, quinta-feira, na Rússia, onde o presidente americano prometeu dar maiores explicações ao governo brasileiro até 11 de setembro próximo. Rousseff disse também que irá propor a criação, na ONU, de um sistema de supervisão contra espionagem internacional.

Rousseff acha que “necessita dar uma resposta política forte aos EUA”, mas está também “cuidadosa em evitar fechar portas a um diálogo melhor”, escreveu Maurício Santoro, um cientista político de direitos humanos, conselheiro da Anistia Internacional, num e-mail. Além da NSA, a proposta do Presidente Barack Obama de um ataque americano à Síria – ao qual o Brasil se opõe – tem também criado tensão entre ambos os países, escreveu Santoro.

Repercussões
A visita de Dilma Rousseff em outubro teria o objetivo de tratar de assuntos importantes para os interesses dos EUA. Dilma Rousseff planejava fechar um acordo pronto com Obama que permitiria que os EUA usassem a base de lançamento de satélites de Alcântara, no Maranhão, uma área que os EUA por muito tempo vêm tentando obter acesso, segundo divulgado pela mídia brasileira. Um acordo assinado pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso, em 2000, foi tão favorável aos EUA – permitindo, por exemplo, acesso exclusivo a partes da base onde os brasileiros estariam proibidos de entrar – que o Congresso brasileiro nunca aprovou o acordo.

As revelações de espionagem por parte da NSA também são esperadas provocar um retrocesso nos esforços americanos de assinar um acordo para vender ao Brasil caças a jato numa transação interestatal no valor de 4 bilhões de dólares. “Não podemos falar dos jatos agora… Não se pode assinar um contrato como esse com um país em que não se pode confiar”, disse uma autoridade brasileira de alto escalão falando sob a condição de anonimato à Reuters.

O embaixador estadunidense no Brasil, Thomas Shannon, pediu demissão nesta semana, alimentando os boatos de que estava sob pressão pelo vazamento das informações da NSA. Embora sua partida tivesse sido planejada, o “timing” de sua demissão causou surpresa.

Apesar de tais desdobramentos, Fleischer disse que não está convencido ainda de que a visita será cancelada. “Apesar da ‘mise-en-scène’ da presidência brasileira, há muita coisa em jogo para ambos os lados que dependem de manterem e melhorarem seu relacionamento”, disse ele.
Título e Texto: Taylor Barnes, Correspondente do “The Christian Science MONITOR” September 6, 2013.
Tradução: Francisco Vianna

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