segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Hostilidade anticristã alimenta jihadismo

Não basta condenar os ataques anticristãos em países islâmicos porque para acabar com a violência é preciso pensar em termos de igualdade e de cidadania.
Yussel Bazzi
O duplo atentado que matou dezenas de cristãos no Paquistão (22 de setembro) coincidiu com o massacre de dezenas de outros cristãos num centro comercial em Nairobi, perpetrado por um grupo de extremistas muçulmanos que visava deliberadamente alvos não muçulmanos. Pouco antes, casas e igrejas coptas haviam sido queimadas em Delga, no Alto Egito, por grupos islamitas apoiados por populares.

Terror da Nigéria ao Iraque
Estes factos inscrevem-se numa série de ações terroristas, assassínios, raptos e expulsões de cidadãos cristãos de países de maioria muçulmana, da Nigéria ao Paquistão, passando pelo Egito, Síria ou Iraque. Mesmo noutros países em que os cristãos estão mais preservados do terror,  precisam da “proteção do Estado” ou são vítimas de discriminação social e política, sentindo-se cercados, fracos ou sem segurança. A principal consequência da ausência de uma cultura de igualdade de cidadania e de coexistência é a migração de comunidades cristãs, representantes da história antiga e da civilização desses países, correspondendo, por vezes, às elites sociais, políticas e culturais.

É óbvio que a maioria dos muçulmanos condena ataques contra concidadãos não muçulmanos, bem como o terrorismo contra estrangeiros. No entanto, essa maioria pacífica partilha velhos ódios ao Ocidente, a ponto de considerar os cidadãos cristãos seus aliados objetivos por não partilharem fidelidade à umma [nação muçulmana].

A cultura generalizada entre a maioria dos muçulmanos é a da “primazia do direito da maioria” e da “defesa da religião”, dando primazia à identidade religiosa sobre a identidade nacional. Assim, a aplicação da Sharia – nas suas interpretações mais antigas ou modernas – é considerada preferível á lei civil. Isso pode ser constatado nos debates constitucionais atualmente em curso na Tunísia, Egito e Paquistão.

O Islão “moderado”, que condena os ataques contra os cristãos, limita-se a uma rejeição da violência, sem lhe combater as causas ou origens. Hesita, mesmo, em excluir do Islão os autores de atos terroristas que matam pessoas inocentes (muitas vezes maioritariamente muçulmanas), remetendo para textos antigos, não questionados até agora, para justificar as suas ações.

O Islão moderado, ainda que se demarque do terrorismo, não vai à raiz última da violência

Apoia-se numa tradição que não foi reformada nem reinterpretada. Esses grupos apresentam-se como verdadeiros muçulmanos e consideram os demais como menos muçulmanos. E o “Islão oficial” não atua contra eles, incapaz de responder às questões essenciais relativas aos direitos humanos, às leis de sucessão ou ao casamento de menores.

Violência sectária
A crise das sociedades muçulmanas é agravada por conflitos comunitários intermuçulmanos. A violência e o terrorismo não se limitam aos não muçulmanos, mas também a diferenças sectárias e étnicas, como acontece no Paquistão, Afeganistão, Iraque, Síria, Somália, Sudão e mesmo na Nigéria.

Tudo isso ajuda a fechar os Estados e as sociedades, afastando-os da marcha da História e remetendo-os para as trevas da “sedição”. Transforma os países em territórios áridos, onde se espalha a morte, o desespero, a destruição e uma grande pobreza. Desde o fracasso do “Estado talibã” no Afeganistão até ao impasse do khomeinismo no Irão, passando pela derrota do “Estado da Irmandade Muçulmana” e o caos dos fanáticos islamitas suicidas no Iraque, ou pela Somália, o Islão político prossegue na sua via, numa altura em que se coloca a questão histórica crucial: para quando o início de uma profunda reforma religiosa, adiada há séculos?
Título e Texto: Yussel Bazzi, jornal Al-Mustaqbal, Beirute, Líbano
Tradução: Ana Cardoso Pires, Courrier Internacional, dezembro de 2013
Digitação: JP

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