Publicações
contestadas por Marina, que foram removidas por ordem do tribunal, se basearam
em notícias verdadeiras
Ricardo Balthazar
A decisão do Tribunal Superior Eleitoral que mandou remover publicações consideradas ofensivas pela ex-senadora Marina Silva,
pré-candidata da Rede à Presidência da República, expõe as dificuldades que a
Justiça encontrará se quiser conter a proliferação de notícias falsas nas
eleições deste ano.
Em despacho publicado pelo TSE na quinta (7), o ministro Sérgio Banhos mandou tirar do ar cinco publicações feitas no ano passado por
uma página no Facebook,
o Partido Anti-PT. Os administradores da conta se mantêm no anonimato, e a
página tem mais de 1,7 milhão de seguidores.
As publicações associam Marina a pagamentos feitos por empreiteiras
investigadas pela Operação Lava Jato e foram tratadas como mentirosas, mas são
todas baseadas em notícias verídicas publicadas pela Folha e por outros
veículos de comunicação.
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Prédio do Tribunal Superior Eleitoral. em Brasília, foto: Lalo de Almeida,
6 de junho de 2017/Folhapress
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A notícia foi publicada pelo jornal O Globo e confirmada pela Folha.
A empreiteira de fato fez uma contribuição para o partido de Marina, que era
filiada ao PV em 2010. Foram R$ 400 mil para o diretório do Rio, registrados
como a lei exigia e como o ex-deputado Alfredo Sirkis, que presidia o partido,
reconheceu em 2016.
Na época, Marina negou ter recebido doações ilegais e lembrou que sua campanha recebeu
e declarou contribuições de outras empresas sob investigação, como a Andrade
Gutierrez e a Camargo Corrêa. Ou seja, ela disse, a ideia de que tentara
esconder a doação da OAS não fazia sentido.
Sirkis e o empresário Guilherme Leal, um dos donos da Natura e companheiro de chapa de Marina na campanha
de 2010, admitiram que trataram da contribuição com Léo Pinheiro, mas negaram
ter solicitado que fosse feita sem registro na contabilidade oficial.
Como as negociações do empreiteiro com a Lava Jato não foram concluídas
até hoje e sua delação não foi homologada pela Justiça, é impossível esclarecer
as contradições entre ele e os aliados de Marina.
A ex-senadora também conseguiu que fossem removidas publicações sobre
doações que ela recebeu da Odebrecht na campanha de 2014, no valor total de R$
1,2 milhão, todas feitas legalmente. A própria Marina reconheceu o recebimento desse dinheiro há um ano, quando vieram à
tona as delações da Odebrecht.
As publicações contestadas por Marina e agora removidas do Facebook
ofereciam links para notícias em outro site. Embora os títulos das publicações
possam ser considerados enganosos, por tratar doações como propina e Marina
como delatada, o conteúdo das notícias pouco se afasta do que os jornais
publicaram.
No despacho do ministro Banhos, a queixa de Marina é resumida assim:
"Não existem provas de que Marina Silva esteja associada a atos de
corrupção; além disso, não figura como ré ou investigada em nenhum processo
relacionado à Operação Lava Jato".
É verdade. Mas, se seu nome fosse trocado pelo do ex-governador Geraldo
Alckmin, pré-candidato do PSDB, os mesmos argumentos poderiam ser usados para
contestar notícias como as que a Folha publicou recentemente, sobre empresas
que afirmam ter feito doações ilegais para suas campanhas, o que ele nega.
Ao contrário do que fazem sites maliciosos e páginas como a do Partido
Anti-PT, jornais como a Folha procuram tratar esse tipo de informação com
rigor, abrindo espaço para contestação dos acusados e corrigindo eventuais
erros.
Mas isso pode não ser suficiente para torná-los imunes a ações de
políticos contrariados se, a pretexto do combate a notícias falsas,
prevalecerem critérios como os adotados pelo ministro Banhos.
No seu despacho, ele discorre sobre as incertezas do mundo dominado pela
"pós-verdade"
e os "tempos líquidos" do sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman (1925-2017), mas evita examinar de perto o conteúdo das notícias
contestadas por Marina.
Ao descrever a página do Partido Anti-PT, ele critica a publicação de
"notícias inflamatórias e sensacionalistas" e dados de
"veracidade questionável" e aponta características que identifica nas
notícias falsas: "A manchete sensacionalista, a prevalência da primeira
pessoa no texto, erros de gramática e coesão e o uso de palavras de julgamento e
extremismo". Se a régua for essa, será difícil separar verdades e mentiras
na eleição.
Título e Texto: Ricardo Balthazar, Folha de S. Paulo, 9-6-2018
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