Helena Matos
António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa aos
pulos são um símbolo do país carrossel mágico a que estamos reduzidos. Mas por
mais que saltem e gritem torni-cotim-torni-cotão a realidade vai apanhá-los.
Os saltitões. Eles saltam.
Saltam com a energia de quem sabe que são essas suas performances que mantêm a
rodar o carrossel mágico em que o país está transformado. Saltar é preciso.
Colar-se ao que estiver a dar é indispensável e, no caso a colagem ao futebol,
é vergonhosa (nenhum destes protagonistas vai voltar a falar de populismo, pois
não?) Quando não for mais possível escamotear a realidade, os novos saltitões
vão ensaiar versões politicamente atualizadas do torni-cotim-torni-cotão. Ou
seja, falar muito da crise internacional, acusar a Itália, o Trump, o BCE, a
instabilidade da Espanha… Mas, por mais que saltem, a realidade vai apanhá-los.
“O Bloco quer” – esta
expressão faz parte das nossas vidas. Afinal, todos os dias o Bloco quer
qualquer coisa. Assim, só nos últimos dias o Bloco fartou-se de querer: a 10 de junho, o Bloco queria um Dia de Portugal que desse conta “da enorme violência da expansão portuguesa, a
nossa história escravagista, a responsabilidade no tráfico transatlântico de
escravos.”
A 11, o Bloco virou-se para terra e queria festejar a
Feira do Livro e, de caminho, “travar o despejo das
livrarias e alfarrabistas devido à pressão imobiliária”. (Esta
proposta do Bloco contribuirá decisivamente para que ninguém na posse das suas
capacidades mentais alugue uma loja para que lá funcione uma livraria ou um
alfarrabista).
A 12 de junho, farto dos livros, o Bloco veio dizer que quer “bolinha vermelha nas touradas na TV”.
E a 13 o “Bloco quer o fim dos vistos Gold e diz que, de
mais de 5 mil, apenas 9 criaram empregos” (como terá feito o Bloco
estas contas?). Digamos que é muito querer! Na verdade, não espanta que o Bloco
queira. O que não se entende é que o seu querer de imediato seja transformado
numa urgência nacional. Num tema que nos querem fazer crer transversal. E muito
particularmente uma causa que não se pode questionar sob o risco de
imediatamente se ser rotulado com os adjetivos da moda: racista e machista
parecem ser aqueles com mais saída nos últimos tempos.
Os caras de parvos. A 15 de
Junho de 2018 sabia-se que “Com a passagem às 35 horas os hospitais vão ter de fechar serviços. Sindicatos e Ordem calculam que seriam precisos em julho mais de cinco mil novos enfermeiros e auxiliares, mas Finanças não autorizam contratação. Conjugação da redução dos horários de milhares e o início das férias vai provocar “o caos”.” É caso para dizer que somos um
país de cara de parvos. Recordo que, há dois anos, só existiam duas versões
possíveis para o impacto da adoção das 35h na função pública: ou não existia
impacto algum ou a avaliação do eventual impacto dependia de uns estudos muito
apurados e demorados. Para que não restassem dúvidas, Mário Centeno afiançou
aos deputados da oposição que a reposição das 35 horas de trabalho semanais na
Função Pública “Não é discussão de natureza orçamental neste momento. Só tem impacto nas vossas caras“. Se dúvidas subsistissem
logo surgiram reportagens dando conta de várias autarquias onde com as quarenta
horas “A produtividade não aumentou e o
descontentamento entre os trabalhadores cresceu.” E não faltaram
declarações de especialistas explicando que as 40h tinham sido aplicadas
“dentro de uma lógica redutora de que aumentando X% o horário de trabalho reduz-se em X% os custos dos serviços”, resume o especialista, que compara esta lógica
a outras “contas de Excel” em que não são ponderadas todas as variáveis.”
(nestas coisas de cortar privilégios às corporações acaba-se sempre acusado de
“lógica redutora”.) Em resumo, as 35 horas além de não terem impacto no
orçamento até iam contribuir para o aumento da produtividade e quiçá da
poupança. Mas tudo isto era em 2016. Em 2018 chegou a demonstração do impacto.
Na nossa cara de parvos, claro. O que são senão uns parvos os contribuintes,
para mais sob eterna suspeita fiscal, que pagam impostos para sustentar
serviços públicos que canalizam para o seu funcionamento os recursos que
deveriam ser investidos nos utentes?
Ao dispor. Em Poiares vai
fechar um colégio que funcionava em regime de contrato de associação. Os pais protestaram mas valha a verdade que o seu protesto é pouco
audível. Está instituído que as famílias portuguesas têm de entender que é seu
dever colocarem os seus filhos ao serviço da escola pública, a tal que os
jornalistas se obstinam em descrever como gratuita embora depois de feitas as
contas se constate que para o contribuinte o custo por aluno numa escola
pública é igual ou superior ao das escolas privadas. A existência de escolas
com contrato de associação é uma areia na engrenagem dos sindicatos: se os pais
puderem livrar os filhos do ciclo infernal de greves e protestos – logo, de
dias sem aulas – os sindicatos perdem força. Já para o ministério que
sonha fazer um homem novo estes colégios são vistos como uma ameaça à ditadura
do pedagógica e socialmente correto. Logo, não interessa se o desempenho das
escolas é bom. Se os alunos aprendem e se os professores ensinam. Esses não são
aliás os primeiros objetivos da escola. A escola está lá para gerir as
carreiras dos docentes e discentes, para incentivar a última causa patrocinada
pelos ativistas do costume. O resto não conta.
Título, Imagens e Texto: Helena
Matos, Observador,
17-6-2018
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