sexta-feira, 17 de maio de 2024

De referência

Henrique Pereira dos Santos

Por acaso, vi a avaliação dos jornalistas do Observador antes de um debate para as europeias.

O debate era entre Catarina Martins, Francisco Paupério, Fidalgo Marques e Tânger Correia. 

A avaliação dos jornalistas do Observador falava de uma profissional contra três amadores e pode ser resumida por esta frase que o autor, com certeza, considera um achado espirituoso: "exige-se uma comissão de inquérito para perceber como e com que objetivo André Ventura escolheu António Tânger Corrêa. Deve haver uma conspiração qualquer em curso".

Depois vi o debate propriamente dito (saltando partes, evidentemente) e fiquei a saber que para os jornalistas do Observador (e, neste ponto, acho que não corro grandes riscos se generalizar para o conjunto das redações) ter uma picareta falante a negar que existam problemas de segurança relacionadas com a migração e tráfico de pessoas, contraponto que o grande problema de segurança na Europa é a extrema-direita, é estar muitos furos acima de dizer que os desgraçados dos migrantes que enchem a envolvente da igreja dos Anjos de tendas estão ali em piores condições que as pessoas que vivem nos campos de refugiados da Jordânia.

Suponho que estes jornalistas acham que as pessoas comuns são incapazes de descodificar a realidade e de avaliar o grau de adesão dos discursos políticos à realidade (exemplo, o problema da guerra da Ucrânia não é a Rússia ter uma política expansionista que a levou a invadir um país vizinho, é a União Europeia ser eurocínica e não querer trabalhar para a paz porque está ao serviço dos interesses ligados à produção de armamento, diz a picareta falante, com os jornalistas a considerarem um desempenho de campanha profissional e seguro).

Por puro acaso, fizeram-me chegar um texto sobre as valas comuns associadas às escolas cristãs do Canadá que receberam filhos das comunidades indígenas, um assunto que em 2021 levantou tanta confusão que até o papa Francisco fez uma visita penitencial ao Canadá em 2022.

Qual era a questão? Era tudo falso, um investigador resolveu divulgar dados preliminares de um estudo com radar de profundidade, tomaram-se como bons esses resultados e indicadores de procedimentos horrorosos generalizados que foram escondidos durante mais de cem anos, mas os resultados das investigações posteriores, que demonstravam não haver qualquer base factual para o bruaaá entretanto levantado, pura e simplesmente são ignorados pela imprensa de referência.

O editorial do Público de hoje, de uma cobardia inaudita, mostra bem o estado da imprensa, ao tentar explicar como um jornal de referência como o Público anda há vários dias a alimentar uma história mal contada sobre uma criança nepalesa brutalmente agredida pelos colegas, numa escola primária.

O Público tinha uma maneira digna de se ter apresentado como Egas Moniz, com um baraço ao pescoço: "a notícia era muito sumarenta, a Renascença estava a noticiar e como a Lusa fez uma peça qualquer, resolvemos ampliar o boato sem verificar um chavelho dos factos, pedimos desculpa pelo facto de continuarmos a confiar na Lusa, apesar de todos os dias lermos coisas deles que não são bem assim (ainda hoje, por exemplo, todos nós, jornalistas, repetimos sem problemas a história de que Passos Coelho previu a vinda do Diabo, sem que haja uma única confirmação de que realmente as coisas se passaram como fontes anónimas contaram que se tinham passado, está-nos na massa do sangue esta queda para o boato que não precisa de confirmação, quando achamos que se não aconteceu, podia ter acontecido)".

Mas não, o diretor do Público preferiu justificar o injustificável, descrevendo o diz que disse em que se baseou o Público para contar histórias da carochinha como se fossem descrições da realidade, como é habitual fazer.

Depois queixam-se de que as pessoas não compram jornais.

Título e Texto: Henrique Pereira dos Santos, Corta-fitas, 17-5-2024

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